A Doença e o Tempo - Aids, Uma História de Todos Nós é o novo livro do filósofo e ex-professor do Departamento de Filosofia, Eduardo Jardim. Após ter escrito a obra Tudo em Volta está Deserto, que retrata os anos 1960 e 1970, o autor volta a recuperar a história e aborda um dos fatos mais marcantes dos anos 1980, a AIDS. O lançamento da obra, na PUC-Rio, ocorreu no dia 22 de agosto, onde o autor contou sobre o processo de criação e debateu sobre as reflexões de A Doença e o Tempo com o Decano do CTCH, professor Julio Diniz, a Diretora do Departamento de História, professora Maria Elisa de Sá, e o Diretor do Departamento de Filosofia, professor Luiz Camillo Osorio.
Eduardo Jardim foi professor da Universidade por 40 anos, onde lecionou até 2012. Ele explicou que a obra tem como ponto de partida as coisas que, não só ele, mas a geração do início dos anos 1980 viveu. Jardim destacou que, ao contrário da visão da época, a AIDS é uma história de todos, visto que, não escolhe sexo, cor, nacionalidade e origem social. Para ele, o vírus envolve uma questão que diz respeito a todos os humanos, a precariedade, finitude e mortalidade.
- Quando a AIDS começou não havia remédio. Seu diagnóstico era uma sentença de morte. Essa consciência nos levou a transformar a nossa vivência do tempo e a pensar o valor das nossas vidas. Quando coloquei o título A doença e o tempo, eu poderia ter falado A doença e o tempo presente, mas no sentido de um momento do tempo, uma presença e uma modificação, ou uma capacidade que temos, nessas experiências, de acessar uma dimensão do tempo mais própria.
Jardim dividiu o livro em três sessões: a trajetória da doença, a discussão sobre a ideia de grupo de risco e a análise de produções literárias relativas ao HIV. No primeiro fragmento o escritor traça a história do vírus, desde do surgimento na África até o Brasil, que passa também pelos Estados Unidos e Haiti. Para reconstruir o cenário em que Síndrome da Imunodeficiência Adquirida começou, ele recorreu a estudos científicos sobre a colonização belga na bacia do Congo. Já no Brasil, destacou como as instituições governamentais e a população lidaram com o ocorrido e apontou que o Estado foi o protagonista durante o processo de enfrentar a enfermidade. A professora Maria Elisa de Sá, conhecida como Maisa, ressaltou a admiração acadêmica e intelectual pelo professor e o impacto que a leitura da obra gerou nela.
- Eduardo fala desde o início do livro que toda experiência para ter acabamento precisa ser narrada. Tanto em A Doença e o Tempo, quanto em Tudo em Volta está Deserto,percebo um movimento de olhar o passado para reviver o que vivemos. Nesse sentido, a narrativa é fundamental. A leitura da obra é envolvente, fui acometida de muita emoção.
O conceito de grupo de risco é questionado na segunda parte, do ponto de vista da saúde pública e da criação de uma outra forma de epidemia relacionada ao sofrimento pela discriminação de pessoas que faziam parte dos quatro “hs” - homossexuais, hemofílicos, haitianos e usuários de heroína. O professor Julio Diniz destacou que a AIDS é um dispositivo narrativo, e, no livro, o autor funciona como um mediador entre a doença o lugar que ela ocupa na sociedade. O decano comentou também que o filósofo se tornou um ensaísta do presente, que utiliza textos que tratam, no caso brasileiro especificamente, de temas dolorosos: o tempo da ditadura e questão do vírus do HIV.
- Ele retoma questões muito importantes que são não só comportamentais, mas geracionais e relações de macropolítica ligadas à doença dentro do regime capitalista, à indústria farmacêutica e medidas governamentais. O livro é sobre a AIDS, mas também ilumina questões que nos emparedam hoje. Essa definição de grupo de risco voltou a ser utilizada no Brasil, mas de maneira diferente. No entanto, a discriminação e exclusão de certos grupos mostram a ligação clara com o lugar que as pessoas contaminadas com o vírus ocupavam.
Na última parte da obra, o escritor dividiu a investigação das produções literárias relativas à síndrome em três domínios. No primeiro momento, ele considerou a produção ensaística e destaca o livro AIDS e suas Metáforas, de Susan Sontag. Em seguida, abordou a busca sociológica sobre a doença e frisou a importância da obra Os Homossexuais e a AIDS, de Michael Pollack. Eduardo Jardim expôs depoimentos pessoais que inspiraram obras ficcionais, entre eles Para o amigo que não me salvou a vida, de Herve Giubert. Luiz Camillo Osorio definiu o livro como afirmativo e triste. Ele lembrou da militância da época, como o grupo Act Up (Aids Coalition to Unleash Power), e mostrou algumas das artes produzidas pelo movimento.
- A leitura de A Doença e o Tempo me suscitou a relação entre amor, morte e vida, mas também, entre a imagem e o tempo. Jardim começa o livro com a viagem, roteiro espacial, depois a questão do preconceito e, por fim, a discussão do tempo. Uma coisa muito interessante quando ele discute essa passagem para o tempo é a caracterização entre o HIV e a AIDS, o período entre a presença do vírus e o desenvolvimento da síndrome. Essa mudança de fase da especificidade a AIDS.