Colegas lembram Guilherme Marques, jovem que casava empenho e bom humor
19/12/2016 08:30

Ex-repórter do Portal PUC-Rio, na TV Globo desde 2009, jornalista de 28 anos está entre os 75 mortos no acidente do voo que levava a delegação da Chapecoense e jornalistas até a capital colombiana 

Guilherme Marques, em 2009, na TV do Portal PUC-Rio digital. Foto: Arquivo

Equipe do Portal PUC-Rio digital em 2009. Foto: Arquivo

O Brasil acordou nesta terça-feira abatido pela queda do avião que levava a delegação da Chapecoense até a Colômbia, onde disputaria, na quarta, a primeira partida da final da Copa Sul-Americana, contra o Atlético Nacional (cancelada pela Conmebol, a federação sul-americana). Proveniente da Bolívia, o voo da empresa Lamia levava nove tripulantes e 72 passageiros, inclusive 22 jornalistas. Autoridades colombianas estimam que, em princípio, só seis sobreviveram ao acidente próximo à cidade de La Unión, a 50 quilômetros da capital Medellín. Um dos 76 mortos confirmados é o jovem repórter da TV Globo Guilherme Marques, cujos primeiros passos profissionais foram dados na PUC-Rio.

Leticia foi sua primeira editora no Portal PUC-Rio Digital

Aos 28 anos, comemorados na sexta passada, Guilherme integrava o time da cobertura esportiva da Globo havia aproximadamente sete anos. A trajetória profissional ascendente, abreviada pela fatalidade, começou no Portal PUC-Rio Digital (hoje integrado ao Comunicar), onde estagiou como repórter de TV em 2008. Logo depois, trabalhou na TV Brasil e, em seguida, ingressou na Globo. Engrenaria na emissora a carreira de repórter esportivo. Mergulhou na cobertura dos clubes cariocas e nas transmissões de jogos futebol, como a decisão que Chapecoense e Nacional disputariam nesta quarta. A professora Letícia Hees, que orientou as incursões iniciais de Guilherme no telejornalismo, recorda:

– Sentia um orgulho enorme cada vez que ele aparecia na televisão. Guilherme fez parte da primeira turma de repórteres da TV do Portal. Era daqueles estagiários de que a gente não esquece nunca. Ficávamos horas em frente ao computador burilando os textos que ele produzia, até chegarmos à melhor forma. Guilherme tinha sede de aprender e disposição para alcançar os melhores resultados. Sempre vou me lembrar dele como um menino ativo, alegre, que gostava de esportes e se dava bem com toda a equipe. Ficamos arrasados com essa tragédia que encerrou tão precocemente a carreira brilhante do nosso querido Guilherme Marques – emociona-se Letícia. 

 

Com uma habitual irreverência, Guilherme colecionava admiração entre os colegas de aula, de estágio e de profissão. A produtora da GloboNews Viviana da Costa, contemporânea de Guilherme no Portal PUC-Rio, ressalta a cumplicidade conservada acima dos rumos profissionais distintos:

 

– Guilherme foi meu parceiro em umas das primeiras reportagens que eu fiz para o Portal, assim que entramos. Não nos conhecíamos ainda, e aquela foi uma excelente oportunidade para nos aproximarmos e dividirmos todas as ideias e dúvidas que surgiam pelo caminho. Como foi divertido! E foi divertido sempre. Com a gente, outros amigos entraram no Portal na mesma leva. Somos amigos até hoje, acompanhamos a trajetória uns dos outros e estamos sempre na torcida pelo sucesso profissional, ainda dividindo as ideias e dúvidas que não deixam de surgir. Quando penso no Gui, agora, me lembro do talento e de como era natural vê-lo crescer e crescer profissionalmente. Sempre pareceu que ele nasceu para fazer o que fazia. Lembro também do sorrisão que ele abria quando a gente se esbarrava nos corredores do trabalho. 

O casamento entre o bom humor, irrigado pelo sorriso fácil, e a responsabilidade não menos característica, fazia do jovem uma unanimidade também entre os professores do curso de Comunicação Social.

– Foi meu aluno em Técnicas de Reportagem, disciplina do 4º período do curso de Jornalismo. Como dizem por aí, era o filho que toda mãe e pai quer ter: educado, simpático, bem-humorado, responsável, bom aluno. Tinha uma vontade muito grande de crescer na profissão. Por isso, em sala participava muito das aulas, gostava sempre de tirar as dúvidas. Durante a correção dos trabalhos, procurava saber cada detalhe da revisão feita no texto. Sempre que conseguia, acompanhava a sua atuação na TV, primeiro como repórter da TV Brasil, depois na TV Globo. E toda vez que via a boa desenvoltura e segurança na telinha, eu pensava: o Guilherme é o filho que todo pai e mãe quer ter – reforça a também jornalista e professora da PUC-Rio Adriana Ferreira.

Já a professora de Comunicação e Expressão Margareth Amoroso de Mesquita enfatiza a doçura com que Guilherme tocava a vida acadêmica. Uma virtude estendida à carreira:

– Gabriela Gomes, João Mauro Senise, Guilherme Marques fizeram parte de uma turma muito querida e divertida, em 2007.1, quando faziam o primeiro período de Comunicação na PUC-Rio. É difícil acreditar. Todos que o conheceram têm muito orgulho do Guilherme: jornalista ótimo, simpático, inteligente! Tão doce como pessoa quanto na vida acadêmica e profissional. Antes de ele viajar (para cobrir a decisão da Sul-Americana, na Colômica), li um post em que dizia algo como ir contar a história do jogo. Gabriel García Márquez dizia que o bom de ser jornalista era o fato de poder ser um contador de histórias: um narrador. Em outro texto, Garcia Márquez escreveu que tudo quanto cercava a narrativa era o mais próximo que podíamos chegar da levitação. O Guilherme narrava muito bem. Levitava e nos fazia levitar. Tão bom que foi chegando perto do Céu. Ele não caiu. Levitou de vez. É difícil acreditar, é muito triste mesmo; mas um menino como ele, bom e autêntico, deve estar sorrindo agora. Nunca vamos esquecer o Guilherme. Sempre que estivermos levitando, ele estará, de alguma forma, segurando as nossas mãos.

A Missa de 7º dia de Guilherme Marques foi presidida pelo reitor da Igreja Sagrado Coração de Jesus, o padre Alexandre Paciolli

Comoção se estende de Chapecó a gigantes do futebol mundial

Entre os mais de 70 mortos no acidente, estavam jogadores e integrantes da delegação do time catarisense e jornalistas de emissoras de rádio e TV (Fox, Globo, RBS). Sobreviveram à queda da aeronave os jogadores Allan Ruschel, Marcos Padilha e Jackson Follmann, o narrador Rafael Henzel, da rádio Oeste Capital, e o comissário de bordo Ximena Suarez. O goleiro Danilo havia sido resgatado com vida, mas morreu durante cirurgia.

De acordo com a gerência do aeroporto José Maria Cordova, a aeronave proveniente de Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, rumo a Medellín alertou para problemas técnicos por volta de uma da madrugada (horário de Brasília), e não se comunicou mais com os controladores do voo. Suspeitas iniciais convergem para pane elétrica, mas só a perícia poderá precisar a causa do acidente.

A Agência Nacional de Avião Civil havia negado pedido dos dirigentes da Chapecoense para viajar diretamente do Brasil à Colômbia em voo fretado da empresa boliviana Lamia. Segundo a Anac, o trajeto só pode ser operado por companhia aérea brasileira ou colombiana. Assim, a delegação colombiana embarcou em voo comercial regular até a Bolívia, onde pegaram o avião fretado da Lamia, rumo a Medellín. Cairia quando já se aproximava do destino. Estava a aproxidamente 50 quilômetros da capital colombiana.

As primeiras notícias da tragégia, nas primeiras horas desta terça-feira, desencadearam uma comoção nacional e até internacional. Autoridades esportivas, jogadores, treiunadores e outros profissionais do setor publicaram mensagens solidárias nas mídias sociais. O time do Barcelona, por exemplo, homenageou as vítimas do desastre com um minuto de silêncio antes do treino.

O presidente Michel Temer decretou luto de três dias, e a CBF reservou um voo para levar familiares das vítimas até a Colômbia. A cidade catarinense de pouco mais de 200 mil habitantes, epicentro da consternação, migrou em pucas horas da euforia à tristeza. O orgulho e a vibração com a fase dourada do time, que chegara pela primeira vez à final de um torneio continental, deram lugar à dor imposta abruptamente pelo imponderável.  

A quarta-feira ainda começava quando centenas de torcedores começaram a concentrar na Arena Condá, a casa da Chapecoense. Dividem-se entre a perplexidade, as orações, os abraços que aproximam a multidão de uma família unida pelo apoio a um time que pôs o nome da cidade catarinense no mapa do futebol brasileiro e, recentemente, sul-americano. Em cinco anos, a equipe de Chapecó, apoiada por empresários da indústria da carne, saltou da Série D para a elite brasileira, na qual se mantém desde 2014. Em nono no Brasileiro e na final da Sul-Americana, cultiva boas chances de chegar à Copa Libertadores do próximo ano. Um sonho, naturalmente, abalado pela tragédia.

 

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