País em alerta para a epidemia de sífilis
30/05/2017 16:31
Marcelo Antonio Ferreira

Aumento no índice de casos de doenças sexualmente transmissíveis (DST) alerta para falta de prevenção sexual. Cresce o número de crianças e gestantes contaminadas 

Arte: Diogo Maduell

Considerado um dos maiores artilheiros da história do Botafogo, Heleno de Freitas morreu aos 39 anos sozinho, internado em um hospício, vítima de uma doença sobre a qual pouco se fala: a sífilis. Sexualmente transmissível, a sífilis é considerada, hoje, em situação de surto. Em outubro de 2016, o Ministro da Saúde, Ricardo Barros, declarou que o Brasil enfrenta uma epidemia. De acordo com as estimativas do Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde, em 2015, 65.878 pessoas a adquiriram.

O paciente adquire essa patologia pela bactéria treponema pallidum. São três fases: primária, secundária e terciária. Uma das principais causas da epidemia é que, tanto em homens quanto em mulheres, nas duas primeiras fases, ela é pouco sintomática. Na primeira fase, os sinais costumam ser um machucado pouco doloroso nas genitálias, que também pode aparecer na boca e na garganta; na segunda, manchas pelo corpo, e, em ambas fases, os indícios somem sem tratamento médico, o que não significa cura.

Na fase terciária, que pode aparecer em um espaço de tempo que pode variar, em média, entre dois a 15 anos, os sintomas são mais intensos. Surgem lesões destrutivas da pele, problemas cardiológicos e neurológicos que podem levar à demência e, consequentemente, à morte, como foi o caso de Heleno de Freitas.
O tratamento da doença é simples. Na maioria das vezes, é feito com penicilina injetável e, depois de debelada, a bactéria não volta a aparecer. O médico infectologista Alberto Chebabo explica que o principal fator no aumento de incidência de casos é a falta de prevenção sexual e que o aumento de casos não se restringe ao Brasil.

– As pessoas não utilizam preservativo, apesar da recomendação. E não é só a sífilis, todas as DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis), inclusive o HIV, têm aumentado nos últimos anos. Principalmente na população mais jovem e muito na comunidade de homens que fazem sexo com homens. Mas, de uma forma geral, a sífilis é uma doença de altíssima infectividade. A facilidade de transmissão é muito grande. E acontece no mundo inteiro. Há relatos de aumento de sífilis em vários locais. E pelos mesmos motivos que o Brasil, muito pelo fato de as pessoas não se precaverem

Os índices do Boletim Epidemiológico indicam que, na Região Sudeste do país, 37.056 pessoas adquiriram a doença por vias sexuais, e 3.325 casos foram registrados no Rio de Janeiro. Chebabo conta que um dos agravantes nessa epidemia pode ser a falta de divulgação.

– A sífilis é uma doença muito fácil de ser diagnosticada. O exame de diagnóstico é simples, barato e fácil de se fazer, tanto nos laboratórios privados quanto públicos. Temos tido poucas campanhas de orientação e divulgação dos riscos. Há uma questão de conscientização importante.
De acordo com o interlocutor de DST do Programa Estadual de DST/AIDS da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, infectologista Valdir Monteiro, o fato de, hoje, as pessoas notificarem a existência da doença, e os números serem elevados, aponta para um cenário preocupante: a falta de cautela.

– A prática de sexo desprotegido (sem uso de preservativo) é um grande fator para a transmissão da infecção. Aqui no Brasil, o aumento do número de casos de sífilis pode ser explicado também pela maior oferta de exames diagnósticos, inclusive com uso de testes rápidos, bem como melhoria da notificação de casos pelos profissionais de saúde. A sífilis adquirida é de notificação compulsória no país desde 2010, e, cada vez mais, profissionais têm notado o aumento da doença.

Os casos de crianças que já nascem com a doença, a sífilis congênita, também aumentaram. Em 2000, foram 3.674 registrados; em 2015, o número subiu para 19.235. A infecção ocorre durante a gestação ou pela amamentação. O professor e obstetra Jorge Rezende Filho, da Escola Médica da PUC-Rio, observa que qualquer infecção na gravidez é um risco, e as consequências são das mais distintas.

– Dependendo da fase que o feto tem contato com o agente da infecção, a repercussão varia. Muito no início, isso acarreta até um abortamento, porque o embrião para de se desenvolver. Isso nas primeiras oito semanas, geralmente. No primeiro trimestre, isso resulta nas malformações, pois essa é a fase chamada de embriogenia, quando os órgãos e estruturas estão sendo desenvolvidos. E o contato com vírus e bactérias pode acarretar alterações de desenvolvimentos de diversos sistemas, e em especial na sífilis, alterações neurológicas.

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