Processo de marginalização de cidades
26/08/2019 17:10
Ana Carolina Moraes

Em palestra, professor italiano apresenta pesquisa sobre arquitetura e gentrificação

Giovanni Fiamminghi é pesquisador da ONG alemã Tesserae. Foto: Amanda Dutra

O professor Giovanni Fiamminghi, da Università Iuav di Venezia, esteve no campus no dia 16 de agosto para falar sobre as formas de usar a arquitetura como um instrumento de guerra. O pesquisador desenvolveu o projeto (W)Architecture - Architectures as war machines no Rio de Janeiro como tese de doutorado, no período anterior à Olimpíada de 2016. O objetivo do trabalho era observar como os megaeventos que ocorreram na cidade resultaram em um processo de gentrificação.

Professor em planejamento urbano e políticas públicas, Fiamminghi está na segunda visita ao Brasil, financiada pela União Europeia. Ele faz parte do programa de pesquisa e inovação Horizon 2020, que busca entender o processo de marginalização em diferentes cidades da América Latina e da União Europeia. O pesquisador é integrante da ONG alemã Tesserae, uma das coordenadoras do projeto, ao lado da PUC-Rio.

Na primeira visita, o pesquisador se surpreendeu com a diferença entre a realidade da vida na Itália e no Brasil. Um dos vídeos apresentados pelo professor foi gravado na Cadeia Pública de Porto Alegre. Fiamminghi comentou que foi o único pesquisador que se interessou pela visita ao local. Ele percebeu que precisava se destacar do estudo original para compreender como funciona, na prática, o conceito de segurança no Brasil e começou a realizar pesquisas de campo.

- O conceito de segurança é muito diferente no Brasil do que é na Itália. Eu já queria estudar a relação entre infraestrutura e controle. Percebi que aqui no Brasil não há sentido em falar de infraestrutura e segurança sem falar de violência, e especialmente sem falar de quem será vítima neste sistema.

O professor contou que o termo Warchitecture foi usado pela primeira vez para analisar a destruição da arquitetura de Sarajevo, causada pelos bombardeios na Guerra dos Bálcãs. Em seguida, Fiamminghi explicou que, na pesquisa dele, o termo foi aplicado para se referir a construções que reproduzem a violência antes mesmo de haver uma guerra proclamada.

 

Estudantes de Ciências Sociais assistem a palestra. Foto: Amanda Dutra

O Teleférico da Providência, que fica no Morro da Providência, Centro do Rio de Janeiro, é o tema de outro vídeo que foi apresentado pelo pesquisador. Inaugurada em 2014, a construção parou de funcionar em dezembro de 2016 e agora serve como base de observação para policiais da Unidade de Polícia Pacificadora.

- O redirecionamento do uso de algumas das arquiteturas construídas para os megaeventos ficou muito claro na minha pesquisa. Na relação entre a polícia e estruturas como o Teleférico do Alemão, o Mirante da Paz e o Teleférico da Providência fica evidente a instrumentalização das edificações como um pretexto, um mecanismo de gentrificação.

Em uma tentativa de combater as ações da Secretaria Municipal de Habitação e Cidadania, conhecida na Providência como Secretaria de Remoção, os moradores se organizaram em uma comissão. Um dos líderes do movimento é Cosme Felippsen, guia turístico que vive na Providência desde que nasceu e participou da palestra. Segundo Felippsen, as obras foram realizadas para agradar um público que não é original da região, os empresários. O guia turístico contou que os governantes tentavam de tudo para enfraquecer o movimento de resistência.

- Na maioria das vezes, a prefeitura e a Secretaria Municipal de Habitação chegavam avisando que se a pessoa não saísse de casa, a demolidora ia passar. Em alguns casos, eles tentavam convencer lideranças para poder calar a luta na região. Depois de uma reunião, o ex-prefeito Eduardo Paes me ofereceu dois apartamentos para que eu saísse da casa onde eu moro.

A remoção também ocorreu nas obras do Mirante da Paz, no Cantagalo. Neste caso, Fiamminghi explicou que muitas famílias que moravam na base do morro foram deslocadas para o topo. Agora, elas são as que mais sofrem com o não funcionamento dos dois elevadores da estrutura, parados desde o final de 2018. O professor revelou ainda que o orçamento dedicado a essas obras tinha o objetivo de realizar o que ele qualifica de architecture washing, quando há um processo de gentrificação acelerado pelo investimento do governo na arquitetura de um lugar.

- Eu não consegui fazer uma pesquisa quantitativa, mas podemos considerar o enorme gasto do dinheiro do poder público como um dos maiores impactos. Agora que algumas estruturas não funcionam mais, é pior para quem mora no lugar, porque o dinheiro que poderia ter sido investido em outras áreas como cultura, educação e saúde já foi gasto. O Estado vai dizer que não tem mais recursos para esses itens. Há um impacto social direto e outro indireto que comprometem o futuro desses lugares.

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