Controlar os altos e baixos da epilepsia
05/04/2017 17:29
Ertick Foti

Portadores de doença neurológica debatem sobre falta de informação e como lidar com o assunto naturalmente

Autor do blog Falando de Epilepsia, Gustavo Leão tem o distúrbio e utiliza a ferramenta para mostrar que é possivel ter uma vida ativa e normal / Foto: Dóris Duque

O que os escritores Fiódor Dostoievski e Machado de Assis e o pintor Vicent van Gogh têm em comum? Três gênios e uma doença: a epilepsia. Para compreender melhor este distúrbio, março foi escolhido o mês para trazer à tona uma série de discussões sobre o assunto. Pessoas de todo o mundo se reúnem, em diversos locais, para falar sobre a origem deste tipo de transtorno, procedimentos, tratamentos, dentre outros tópicos relacionados à epilepsia. A ideia é desmistificar a doença, pouco abordada na sociedade. Apesar dos avanços da ciência, alguns preconceitos causados pela desinformação ainda atormentam quem sofre com o distúrbio.

Ao contrário do que muitos pensam, a epilepsia é caracterizada por uma sucessão de crises convulsivas. Qualquer pessoa pode sofrer uma crise e não necessariamente ter a doença. Essa manifestação esporádica pode acontecer por diversas causas, como por excesso de bebida alcoólica, traumas na cabeça, estresse ou AVCs.

Segundo a coordenadora do curso de pós-graduação de Neurologia da Escola Médica de Pós-Graduação da PUC-Rio, professora Maria Lúcia Pimentel, uma crise epilética ocorre quando os neurônios do córtex cerebral deixam de realizar as descargas elétricas como mecanismo fisiológico normal e descarregam todos ao mesmo tempo.

A epilepsia pode ter origem em diversas áreas do cérebro e, com isso, causar alterações sensoriais. As crises podem ser caracterizadas como parciais, quando as descargas simultâneas atingem apenas uma parte do cérebro, ou generalizadas, quando todo o encéfalo é afetado.

A professora explica que, apesar de ser popularmente relacionada a convulsões, a epilepsia pode causar uma série de diferentes sintomas, que variam de acordo com a área de origem das crises no cérebro.

– Existem crises que todo mundo reconhece, como a tônico-crônico generalizada, que causam convulsões e são fáceis de diagnosticar, mas, às vezes, os pacientes têm ausências ou outras manifestações que podem passar despercebidas por muito tempo.

Os tratamentos relacionados à doença resumem-se a remédios com o objetivo de controlar as crises, já que não há uma cura definitiva. Segundo Maria Lúcia, procedimentos cirúrgicos podem ser adotados, desde que a patologia tenha alguma causa aparente, como um tumor, e a operação não ofereça riscos ao paciente.

Cerca de 1% da população mundial é portadora do distúrbio. Inclusive, personalidades, como os escritores Dostoievski e Machado de Assis, e o pintor Van Gogh sofriam de epilepsia e nunca tiveram a genialidade afetada por isso. Tal distúrbio não é incapacitante e existem inúmeras histórias de controle e superação das dificuldades causadas por ele. Portador de epilepsia e dono do blog Falando de Epilepsia, o comerciante Gustavo Leão, 35 anos, convive com os distúrbios epiléticos desde a infância e passou por uma trajetória conturbada até a estabilização.

Ao longo do amadurecimento pessoal, Leão conviveu com altos e baixos das crises e teve dificuldades para terminar os estudos e se relacionar socialmente.

– Quando eu era garoto, ficava triste porque sempre que ia na casa dos meus colegas acabava dormindo. Isso acontecia porque os neurologistas me davam remédios fortes, que atrapalhavam o meu cotidiano, para evitar as crises. Com isso, eu ficava um pouco devagar.

Depois de começar a se tratar com a neurologista Elza Márcia Yacubian, o comerciante evoluiu gradativamente e conseguiu uma melhor qualidade de vida. Ele se apaixonou pelo esporte e começou a praticar corridas. Em março de 2016, recebeu um convitepara participar da meia-maratona de Nova Iorque. Quando retornou, a irmã dele resolveu fazer um blog infantil e o inspirou a escrever o Falando de Epilepsia. Desde então, ele usa essa ferramenta para falar sobre o tema e passar autoestima para outros portadores, mostrando que o distúrbio não o impossibilitou de praticar as atividades diárias e ter uma vida ativa.

– Eu quero que as pessoas saibam o que é a epilepsia e falem sobre isso de uma forma natural, como se fala com uma pessoa que tem qualquer outro distúrbio. Quero que outros portadores olhem para mim e pensem que também podem se estabilizar. Para muitas pessoas, quem sofre da doença é considerado incapaz. Isso não quer dizer que a sociedade é preconceituosa, apenas acho que não se tem a informação correta.

Mais Recentes
Beleza a favor do ecossistema
Mercado de cosméticos veganos conquista consumidores que lutam contra a exploração animal
A voz que não pode ser calada
A liberdade de imprensa é considerada um direito social conquistado pelos profissionais da comunicação
Diplomacia na escola
Alunos da PUC participam da sexta edição MICC