Busca por protagonismo político
26/08/2015 18:08
Francenilson Klava / Ilustração: Diogo Maduell

Embora já tenha sido capital do país, o Rio não tem como tradição lançar candidatos fortes no cenário nacional

O PMDB terá candidato próprio em 2018, e o nome mais cotado é o de um político bem conhecido entre os cariocas, o prefeito Eduardo Paes. O anúncio por si só já é atípico no jogo político – a sigla não tinha um candidato próprio desde 1994, com Orestes Quércia. Mas a possibilidade de um político carioca concorrer à Presidência pelo partido com a maior bancada da Câmara dos Deputados e do Senado Federal torna o cenário ainda mais inusitado.

As últimas tentativas de governantes com base no Rio de Janeiro de chegar ao Palácio do Planalto foram decepcionantes. Quem esteve mais próximo de ir ao segundo turno foi Leonel Brizola – que nem carioca era –, em 1989. Anthony Garotinho até tentou mais tarde, em 2002, mas também não conseguiu passar da terceira colocação.


Hoje, o Congresso Nacional tem pelo menos dois políticos locais em posições de liderança – Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, e Leonardo Picciani, líder da maior bancada da Casa. O último político fluminense a ocupar o cargo que hoje é de Cunha foi Célio Borja, do Arena, ainda durante o período da ditatura militar, entre 1975 e 1977. O atual momento não reflete em nada as décadas de ostracismo e de falta de influência do Rio de Janeiro na política nacional.

Para o ex-governador do Rio de Janeiro Wellington Moreira Franco, a transferência da capital federal para Brasília foi o primeiro anúncio da difícil realidade política que estava por vir para o Rio de Janeiro.

– A força da cidade do Rio de Janeiro era o fato de ser capital. Quando essa transferência se faz de maneira muito abrupta e, diria, até precipitada, causa danos econômicos enormes, que sustentam a fragilidade política durante muito tempo – afirma Moreira Franco.

O então Estado da Guanabara tinha que se adaptar, o jogo político era outro. Os investimentos não viriam mais tão automaticamente por ser capital federal. A partir daquele momento, seria necessária uma integração maior com o governo federal para que os recursos pudessem chegar. O estado, que até então exportava o modelo político da polarização entre UDN e PTB, teria que aprender outra forma de jogar. Mas não houve nem tempo. Quatro anos depois da transferência, vem o segundo golpe: a ditadura militar.

Influentes políticos da época, como os governadores de Minas Gerais, José de Magalhães Pinto, de São Paulo, Ademar de Barros, e até mesmo do Rio de Janeiro, Carlos Lacerda, apoiaram a intervenção, que, dizia- se, seria provisória. Não foi o que ocorreu. Carlos Lacerda viu a ambição presidencial mais uma vez adiada e passou à oposição, o que, segundo o cientista político Octavio Amorim, endureceu ainda mais o regime.

– O regime ficou desesperado e bateu duríssimo nas lideranças do estado – analisa Amorim.


Durante a ditadura, o Rio de Janeiro foi palco de forte oposição ao regime imposto pelos militares. O PTB, partido do então presidente, João Goulart, manteve influência sobre a bancada do MDB local. O movimento estudantil representou outra ameaça aos militares. Segundo o ex-presidente do PSB Roberto Amaral, esse posicionamento era tradicional do Rio de Janeiro.

– Havia uma forte tendência do eleitorado carioca à oposição, mais à esquerda. A única vitória que a direita havia tido era a de Lacerda – lembra Amaral.

Por ser um importante polo de oposição e, portanto, uma ameaça ao regime imposto, o Rio de Janeiro teve uma presença política no governo muito restrita ao longo do período militar. Durante os governos dos presidentes Emílio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel, não houve sequer um ministro fluminense. Foi também na gestão de Geisel que ocorreu a fusão entre o então Estado do Rio de Janeiro e o Estado da Guanabara.

– Na época, aquilo significou uma clara tentativa do governo Geisel para conter a forte oposição exercida pelo Rio de Janeiro – diz Amorim.

Segundo Amaral, a fusão inaugurou uma nova política, em que os votos do interior do velho Estado do Rio de Janeiro foram controlados pela máquina do governador Antônio Chagas Freitas, que apesar de ser do MDB, apoiava o regime militar. A nova dinâmica inaugurou o enfraquecimento da bancada do estado no Congresso Nacional.

– Com a fusão, passaram a ter os grotões, os deputados federais eram eleitos lá, numa espécie de voto distrital. A partir desse momento, nós passamos a ter uma bancada de deputados anônimos – comenta Amaral.

Já Moreira Franco viu na fusão uma forma que o governo militar encontrou para cercear o poder de outro estado.

– Geisel achou que era necessário criar um novo polo para competir com São Paulo e juntou o Estado da Guanabara e o Estado do Rio, o que foi péssimo – afirma Moreira Franco.

Independentemente do objetivo, o período militar foi bastante prejudicial para a participação política fluminense a nível na cional. Mesmo com o fim da ditadura, o número de ministérios ocupados por políticos locais continuou a cair.


Na política estadual, o grupo de Brizola governou por quase duas décadas. O líder pedetista conseguiu se aproveitar da crise econômica mundial da década de 80, provocada pela crise do petróleo, para se eleger em 1982, vencendo o representante do chaguismo e então candidato da situação, Miro Teixeira. Apesar da liderança no estado, o PDT não tinha a mesma força nacional. A fraqueza da bancada pedetista no Congresso, a pequena participação de políticos fluminenses nos partidos de maior bancada na Câmara e no Senado – PMDB, PT e PSDB –, além da oposição ferrenha de Brizola ao governo federal ajudam a explicar a falta de protagonismo do Rio de Janeiro no jogo político nacional.

– O modo aguerrido de Brizola agir com o governo federal e com os outros partidos acabou isolando o Rio de Janeiro – aponta Amorim.

O Rio de Janeiro só veio a se alinhar ao governo federal em 2007, com a eleição de Sérgio Cabral para governador. Para retomar os investimentos e a participação política em nível nacional, os políticos fluminenses tiveram que aprender a se adaptar ao modelo nacional de aliança entre PT e PMDB, que vinha desde 2002. Os peemedebistas encontraram no vácuo deixado pela fragmentação do brizolismo – em menos de dez anos, Cesar Maia, Marcello Alencar e Anthony Garotinho deixaram o PDT – a possibilidade de liderar a política fluminense. Desde então, o PMDB está no poder, da prefeitura ao governo do estado.

– O apoio do Sérgio Cabral ao Lula, no segundo turno de 2007, criou uma situação muito favorável e solidária. Dos três maiores colégios eleitorais do Brasil – São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro –, dois eram do PSDB. Então, Lula precisava de uma base de sustentação em um estado importante. Nenhum presidente investiu tanto no estado quanto o Lula, o Rio de Janeiro se aproveitou do momento bom da economia, depois de anos na tentativa de reorganização econômica – observa Moreira Franco.

Hoje, o Rio de Janeiro tem o maior número de deputados federais dentro do PMDB. Mas a Operação Lava-Jato já mostrou que pode ser uma dor de cabeça para a bancada local, tanto em nível econômico – o Rio é altamente dependente do petróleo – quanto político – Eduardo Cunha é investigado. Ele foi denunciado pelo Ministério Público, com base na delação de Julio Camargo, por ter pedido US$ 5 milhões dentro esquema de corrupção da Petrobras.

– Essa situação atual, com a investigação da Petrobras, vai criar problemas muito sérios para o governo do estado e o investimento dele, se não houver um jeito para a Petrobras rápido. O Rio de Janeiro é muito dependente do petróleo. A saúde econômica do estado é a Petrobras – lembra Moreira Franco.

O sopro final para o castelo de cartas que é a aliança entre PT e PMDB promete ser 2018, quando os peemedebistas vão tentar emplacar um presidente, com ou sem o PT. O partido liderado por Michel Temer deve começar a caminhada presidencial nas eleições do ano que vem, com um bom número de prefeitos eleitos em capitais e nas cidades com mais de 200 mil habitantes. Tudo para conseguir, pela primeira vez, sucesso nas urnas em uma corrida rumo ao Palácio do Planalto.


– O nome que eu identifico com os melhores predicados, mais pronto para disputar uma eleição presidencial seria do prefeito Eduardo Paes. Ele vai chegar em 2018 com uma belíssima vitrine, até por conta dos Jogos Olímpicos. É um nome que agrada a bancada – revela o deputado federal Leonardo Picciani.

A tentativa é vista por Amorim como prematura e até mesmo arriscada demais. Segundo o cientista político, uma derrota nas urnas pode significar a volta do Rio à oposição e, consequentemente, um retrocesso do protagnismo no jogo político.

– O futuro do Rio de Janeiro dependerá da capacidade das nossas principais lideranças de se entenderem bem com o governo federal – afirma Amorim.

Para o professor Antonio Carlos Alkmim, do Departamento de Ciências Sociais da PUC-Rio e autor do e-book De Brizola a Cabral. De Collor a Dilma, o momento é incerto não só para a política fluminense como também para toda a política nacional.

– Os grandes eventos no Rio acabam no ano que vem com as Olimpíadas. Hoje, temos a crise política e econômica, e o PMDB está muito dividido, o que pode fazer com que o alinhamento se desfaça. Tudo vai depender da capacidade dos atores políticos de entenderem que uma articulação vertical entre União, estado e município é fundamental para o protagonismo – analisa Alkmim.

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