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05/08/2021 09:50
Victória Reis

Há 55 anos, os Beatles lançavam o revolucionário Revolver

Foto: Wikimedia Commons

Na língua portuguesa, o ato de revolver consiste em voltar-se para trás, revirar-se, retorcer-se. Para os Beatles, há 55 anos, no famoso estúdio Abbey Road, o nome foi escolhido para intitular o álbum não por conta da arma de fogo, mas,sim, no sentido de revolucionar a música e o movimento de rotação do LP na vitrola. O diferencial de Revolver se estendeu para a capa, feita pelo alemão Klaus Voormann, que criou ilustrações dos integrantes da banda e de colagens de fotos do fotógrafo Robert Whitaker, o que rendeu um Grammy de melhor capa de álbum.

As 14 faixas são consideradas uma transição da primeira para a segunda fase do grupo, e têm como marca a originalidade, que foi conquistada com a ajuda do produtor George Martin e do engenheiro de som Geoff Emerick. O sétimo trabalho dos ingleses está na lista de 200 melhores álbuns elaborada pelo Rock and Roll of Fame. O álbum revolucionário entrou nas paradas do Reino Unido logo em primeiro lugar.

O Bloco Sargento Pimenta, que arrasta multidões ao som dos Beatles nos carnavais do Rio de Janeiro, guarda no repertório músicas especiais de Revolver, como Eleanor Rigby e Yellow Submarine. Sócio-diretor e vocalista do Bloco Sargento Pimenta, Leandro Donner considera que o maior destaque do álbum são as experimentações sonoras. Além disso, a ousadia a qual o grupo provocou novos recursos de estúdio como delays inversos e técnicas orquestrais.

- Eles esteticamente chegaram a um outro patamar em relação aos álbuns anteriores. Algo que eles já vinham esboçando desde Rubber Soul e que no Sgt. Pepper´s Lonely Hearts Club Band ganhou a sua expressão máxima. O destaque pessoal para mim, deste álbum, é o octeto de Eleanor Rigby, muito marcante, já que foi a primeira vez que as cordas vieram deste jeito tão penetrante, um arranjo quase que cinematográfico.

Bloco arrasta multidões no Aterro do Flamengo

No mesmo ano do lançamento de Revolver, em 1966, os Beatles encerraram a última turnê do grupo em Candlestick Park, São Francisco, Estados Unidos. De acordo com diretor do Departamento de Engenharia Química e Materiais, professor Eduardo Albuquerque Brocchi, a decisão de não se apresentarem mais ao vivo potencializou a presença deles no estúdio e ajudou na incorporação de elementos completamente diferentes dos outros álbuns. Brocchi enfatiza que o primeiro disco foi gravado em poucas horas, o segundo em um dia e o terceiro em dois dias, e assim sucessivamente, o que demonstra o amadurecimento musical.

- Eles podiam se dar o luxo de usar o estúdio porque eles davam retorno e vendiam muito. No álbum anterior, Rubber Soul, eles acenam já para coisa nova, porque saem daquela mesmice que já teve o seu lugar como She Loves You e I Wanna Hold Your Hand. Em 1966, não são só letras, mas também arranjos novos, e facilidades técnicas de laboratórios e de influências que eles tinham como a banda The Lovin' Spoonful e The Beach Boys que estavam fazendo sucesso na época.

Esta nova fase dos Beatles teve a ajuda de uma figura importante no cenário musical mundial. Segundo o professor Paulo César de Araújo, do Departamento de Comunicação, Bob Dylan quando conheceu o quarteto de Liverpool, sugeriu que ele adotasse letras mais profundas.

- A participação de Bob Dylan foi importante, porque ele aderiu à guitarra elétrica em 1965. E Revolver é o álbum que mostra que eles não são mais uma banda de guitarra, baixo e bateria, cantando aquelas músicas que falam “eu te amo” e “você me deixou”, mas sim, diversas outras experiências.

Ao mesmo tempo em que o grupo passou a se reunir com frequência nos estúdios, a individualidade foi mais acentuada no álbum. Araújo ressalta que a banda adolescente que fazia tudo junto, assim como as composições, abre espaço para trabalhos e experiências únicas.

- Temos o George Harrison com as viagens espirituais, som indiano e universo místico, Paul com a sua sonoridade baladeira, Lennon com as viagens alucinógenas e o Ringo com a sua faixa Yellow Submarine. O George foi brigando por um espaço maior e consegue em Revolver abrir o disco pela primeira vez e ter três faixas. Ou seja, a banda já está mais consistente e não depende mais só de John Lennon ou Paul McCartney, mas o George Harrison ganha um espaço maior.

Foto: Wikimedia Commons

Coordenador geral do curso Beatles, História, Arte e Legado, da Coordenação Central de Extensão (CCE), Brocchi pontua que o disco carrega uma dose da experiência do grupo com drogas. A música Tomorrow Never Knows seria uma síntese inspirada em uma das figuras que incentivou o uso de LSD nos Estados Unidos, o professor de Psicologia na Universidade de Harvard, Timothy Leary, que trouxe o debate para o espaço acadêmico e foi expulso da instituição americana.

- Algumas das músicas, particularmente, a última do disco, tem a presença da experiência com alucinógenos, bem marcante e nítida, algo que foi negado em alguns momentos como em Lucy In the Sky With Diamonds. O pessoal queria associar com LSD, e John Lennon sempre deixou claro que foi uma inspiração baseada em um desenho do filho. Neste álbum, há Yellow Submarine que algumas pessoas queriam fazer link com drogas, e o Paul McCartney disse que era uma canção destinada às crianças. Mas existem outras que não negam, que tentavam transmitir uma síntese daquilo que eles sentiam em forma de som, o que eles passavam.

Brocchi afirma que, meio século depois do lançamento, o álbum Revolver continua atual. O engenheiro observa que mesmo aqueles que não são músicos com certeza podem identificar influências das composições do álbum em canções de hoje.

- Os Beatles não se esgotam. Aquele que é apaixonado e acompanha, está permanentemente sabendo de coisas novas. Imagina aqueles que não são fanáticos e têm um conhecimento básico de quem são eles. Para estes, é só ouvir um disco do grupo, como Revolver, com cuidado, e vão ouvir coisas novas.

Revolver e música brasileira

Mestre em memória social, Araújo comenta que, em 1964, o surgimento da beatlemania dividiu opiniões. A crítica na época tratava com descaso os três acordes básicos, e o rock era pouco prestigiado. No Brasil, a MPB e a Jovem Guarda tinham conceitos diferentes com relação à banda inglesa.

- Pensando na música brasileira, cantores da Jovem Guarda, como Renato e seus Blue Caps e outros cantores e bandas, ouviam e faziam as suas versões das músicas. Já a MPB está olhando de nariz empinado, mas isto começa a mudar com Revolver, que é um disco de mudança e abre uma nova fase e expande as experiências sonoras.

A influência do álbum no pop e rock modifica a avaliação negativa de artistas e jornalistas como Nelson Motta e Caetano Veloso, que fala que começou a prestar atenção nos Beatles a partir de Revolver. Ao mesmo tempo, outros bandas param de regravar as músicas pela sofisticação e dificuldade de reprodução do álbum.

- Até o álbum anterior, Rubber Soul, eles fizeram as versões, mas quando chegou Revolver com músicas como Doctor Robert, Tomorrow Never Knows e Eleanor Rigby, eles pararam. Alguns artistas chegaram a fazer as regravações, mas nenhuma gerou repercussão. Em compensação, essa fase dos Beatles é da Tropicália e do Clube da Esquina, que vai ser ouvido e admirado por este segmento da MPB. Caetano gravou Eleanor Rigby, Milton também gravou uma música do álbum.

Eletiva

Em março de 1966, no início da produção do álbum Revolver, John Lennon afirmou em entrevista ao jornal britânico London Evening Standard, que os Beatles “eram mais populares que Jesus Cristo”. A frase, fora de contexto, gerou uma enorme repercussão negativa e foi repudiada até mesmo pela Ku Klux Klan. Logo após a polêmica, o grupo se apresentaria nos Estados Unidos, mas diversas ameaças terroristas contra eles os impediram de realizar os shows. Isto, aliado ao desgaste das viagens, levou FabFour a não organizar mais turnês e apresentações ao vivo.  

 Histórias e curiosidades como esta serão reveladas nas aulas do curso Beatles, cultura de fãs e consumo, ministrado pelo professor Rafael Rusak, do Departamento de Comunicação. A eletiva terá também uma série de palestras, com Lizzie Bravo, a única brasileira a cantar com os ingleses, o pesquisador Nélio Rodrigues e o escritor Ricardo Puglialli. Nas aulas, Rafael vai mostrar como foi a trajetória da banda que começou a se apresentar em pequenos bares da sua cidade natal e conquistou o mundo com as novas cores que imprimiram no rock n’roll.

- Na parte teórica do curso, vou abordar a questão do fã. Já tenho um planejamento para falar desde o início, de quem os Beatles eram fãs e, depois, dos seus fãs. Também vou lembrar da primeira fase da beatlemania de histeria total, quando eles saem de Liverpool, vão para Londres fazer o show para a Rainha e ganham a Inglaterra. A partir disto, eles passam a fazer as excursões pelo Reino Unido e Europa, até chegarem às Américas. 

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