Anchieta, a Companhia de Jesus e o Brasil
10/06/2014 16:48
Padre Carlos Palácio - Provincial do Brasil

Referência indispensável e constitutiva para a história do Brasil

Ninguém poderia negar que José de Anchieta é uma referência indispensável e constitutiva para a história do Brasil. Junto com seus primeiros companheiros, ele é o elo que une a missão da Companhia de Jesus à gênese da identidade social e cultural do nosso país. Esse vínculo constitui um título de honra, mas também um desafio para a missão atual da Companhia no Brasil.

A canonização de Anchieta é, antes de tudo, um acontecimento eclesial. Por meio dele, a fé cristã reconhece o valor evangélico da vida e da missão deste grande jesuíta e sua atualidade inspiradora. Não só para a Igreja ou para a Companhia de Jesus, mas também para todos aqueles e aquelas que anseiam e estão comprometidos na construção de um Brasil melhor.

Para nós jesuítas, essa canonização tem lugar no momento preciso em que a Companhia de Jesus organiza sua missão no Brasil como uma unidade, tanto de estrutura quanto de horizonte, a ‘Província do Brasil’. Após quase cinco séculos, estamos, hoje, portanto, muito próximos da realidade de Anchieta e seus companheiros, para os quais a missão era o Brasil, como uma totalidade em construção.

Um dos traços característicos da figura de Anchieta foi sempre a busca incessante da ‘união dos diversos’. Traço este que aparece de forma paradigmática na missão de São Paulo. O núcleo do que viria a ser a grande metrópole foi construído com persistência, num diálogo nem sempre pacífico entre os diversos atores: um ‘Colégio diferente’, com ensino do latim e as outras línguas, constituído por alunos portugueses, mamelucos e índios, com uma Igreja restaurada, afluxo crescente de colonos portugueses e catequese itinerante dos índios. Essa ‘união de diversos’ continua a ser o grande desafio e a enorme potencialidade para a construção social e eclesial do Brasil.

Em sintonia com essa inspiração, também nós, como jesuítas, experimentamos e estamos convencidos que a missão de anunciar a ‘boa nova’ do evangelho hoje, no Brasil, passa pelo encontro com o outro, pela acolhida do diferente, pelo respeito da alteridade. No trabalho de construção da nova ‘Província do Brasil’, descobrimos e aprendemos a conviver e dialogar com as diversidades regionais e culturais; a não fechar os olhos para novas fronteiras – humanas, culturais, e sociais – que desafiam nossa capacidade de abrir-nos para o desconhecido; a experimentar a riqueza dessa diversidade para a missão. Passados mais de quatro séculos, essa diversidade representa ainda a grande riqueza e continua a ser o grande desafio do nosso país. O Brasil não pode ser compreendido sem um olhar atento a esta diversidade (regional, de culturas, de raças e etnias; social, religiosa, etc.) que constitui a fonte da sua riqueza humana e da criatividade cultural e social que lhe é reconhecida. Para a Companhia de Jesus é um compromisso inadiável comprometer-se com a construção de um “projeto Brasil” que integre, de fato, essa diversidade, de modo que ela encontre, finalmente, seu lugar e seja reconhecida na construção comum do futuro.

Que São José de Anchieta nos ajude a transformar nossas fragilidades, pessoais e sociais, em força de comunhão que brota do conjunto das diferenças;

Que ele nos ensine a arte de acolher, respeitar e integrar as diferenças numa unidade maior;

Que ele abra nossos olhos para a realidade polivalente das nossas raízes culturais. Só tendo a coragem de entrar pelo caminho da convivência plural poderemos contribuir para a integração. É na convivência da pluralidade reconhecida que aprenderemos a recriar consensos. E, dessa forma, poderemos reinventar um futuro mais rico e mais justo, porque mais original e originário.

Mais Recentes
Entre a ação e a cooperação: a Associação dos Funcionários da PUC-Rio
Antônio Albuquerque e Eduardo Gonçalves, do Núcleo de Memória da PUC-Rio, abordam as mudanças na forma de organização dos funcionários das instituições de ensino superior após a Reforma Universitária, e refletem sobre a criação da AFPUC
A História é mestra da vida
O Conselheiro da Associação dos Antigos Alunos da PUC-Rio, Paulo Eugênio de Niemeyer, aborda a influência do passado na vida humana e os novos comportamentos nos ambientes sociais
Educar para a Justiça: um olhar sobre a Pedagogia Inaciana
A pedagogia inaciana é tema de artigo da professora Alessandra Cruz, do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio