Lugar de fala significa a busca pelo fim da mediação, ou seja, é a procura por ser protagonista do próprio discurso. O 2º debate do Ciclo de Encontros entre Arte e Política ocorreu no dia 30 e abordou o tema Lugares de Fala Hoje. A escritora Conceição Evaristo, o professor Wanderson Flor do Nascimento, da Universidade Federal de Brasília (UNB), foram convidados para debater sobre o assunto ao lado da ialorixá Wanda d’Omolu, que foi a mediadora da discussão.
O Decano do Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH), Júlio Diniz, e a coordenadora do Instituto de Estudos Avançados em Humanidades da PUC-Rio (IEAHu), professora Luisa Buarque de Holanda, afirmaram que esse ciclo de encontros é organizado para promover provocações e não somente um debate.
Conceição Evaristo afirmou que o lugar de fala é conquistado e legitimado por quem busca, e que, ao pensar no assunto, é necessário se questionar para quem se fala. A escritora ressaltou para o fato que as experiências influenciam nas criações, por isso, sua imposição como escritora é feita através do gênero e da raça. Para ela, essa imposição faz com que os jovens negros entendam que a leitura, a escrita e o acesso à cultura em geral é um direito de todo cidadão e pensem esses lugares como lugar de direito.
A escritora disse, ainda, que a luta por lugar de fala se torna um processo natural pelo fato de os negros enfrentarem o racismo todos os dias. Para ela, a busca “é cansativa e dolorosa”, mas está incorporada ao ideal de vida, e todos devem saber que, mesmo de forma lenta, os resultados chegam.
— O fato de enfrentarmos um racismo todo dia, nos dá uma competência de enfrentamento e, ao mesmo tempo, nos dá a certeza que temos que agir dessa forma, temos que enfrentar sempre. Fazemos isso porque sabemos que temos que fazer mesmo. E, aos pouquinhos, vamos experimentando os resultados. Hoje, quando vemos como há uma presença maior de estudantes homens e mulheres negros nas universidades, isso nos dá um alento muito grande, porque nós lutamos pelas ações afirmativas, então vemos esse processo, mesmo que lentamente, produzir efeitos.
A escritora, que concorreu para a vaga da cadeira 7 da Academia Brasileira de Letras (ABL), cujo eleito foi o cineasta Cacá Diegues, observou que ter conseguido um voto foi algo que ela considerou significativo.
— O interessante disso foi o processo, e o fato de ter sido um processo coletivo. Acho que isso me contempla naquilo que sou. E preparem vocês, porque enquanto estiver viva vou continuar me candidatando. E acho que nós, como coletivo, fizemos um grande feito que foi questionar a Academia Brasileira de Letras, que é questionar todo um processo de representação dentro da Academia.
O professor Wanderson Flor do Nascimento, da UNB, provocou ao afirmar que existe uma hegemonia da narrativa, ou seja, a história é contada pelos vencedores. Nascimento disse que as pessoas precisam se solidarizar com o outro e falar com ele e não por ele. Segundo o professor, o discurso é uma ferramenta do poder que define como tudo é feito, e o que atribui sentido a isso é a verdade e não as experiências. Por isso, ele afirmou que reivindicar o lugar de fala é lutar pelo discurso. Mas, lembrou, é essencial também ter escuta.
— Lugar de fala tem a ver com reconhecer que nenhuma história, nenhum discurso é contado de maneira objetiva, todo mundo está contando a história a partir de uma perspectiva, a partir de um lugar. Isso é absolutamente fundamental, porque quando eu conto uma história é diferente de quando alguém conta uma história sobre mim. Encontrar nosso lugar na história é uma maneira de retomar o nosso protagonismo na história.