As narrativas de Primo Levi
05/04/2019 15:58
Juan Pablo Rey

Em palestra, professor Renato Lessa mostra a literatura peculiar do químico e escritor, conhecido pela narrativa sobre o Holocausto

O professor Renato Lessa ministrou a aula aberta. Foto: Amanda Dutra

No ano que marca o centenário do nascimento de Primo Levi, o Departamento de Letras promoveu na quinta-feira, 28, uma aula aberta intitulada Os Mundos de Primo Levi. O encontro, da disciplina de pós-graduação A escrita da História e Memória, foi proferido pelo professor Renato Lessa, do Departamento de Direito.

Nascido em 1919, coincidentemente ano da primeira reunião fascista, o judeu Primo Levi foi prisioneiro do campo de concentração de Auschwitz por 11 meses. Formado em química, é conhecido principalmente pela literatura peculiar sobre o Holocausto. As obras de Levi retratam o período vivido no campo de concentração sob o ponto de vista da experiência humana.

- O campo é uma espécie de oportunidade de observação. É um testemunho, mas há o interesse teórico filosófico e antropológico. Não é só uma denúncia do que Levi sofreu, tem pouco de crueldade no sentido cinematográfico. A intenção é entender qual a natureza daquele experimento. É uma teoria da natureza humana. – explicou Lessa.

O fascismo teve início em 1922, regime que o químico conviveu e repudiou desde criança. Ele comentava que escolheu a profissão porque os fascistas nada podiam fazer contra a química. Em 1943, Primo Levi foi capturado pela milícia fascista e enviado para um campo de passagem, perto de Modena, na Itália, onde ficou por três meses. Em fevereiro de 1944, embarcou em um comboio alemão em direção a Auschwitz, na Polônia.

- No trem em que ele foi para o campo de concentração, de 650 pessoas apenas 30 retornaram vivas. Em seu vagão, de 45 tripulantes apenas três voltaram. Levi fica em Auschwitz até a libertação dos prisioneiros pelo Exército Vermelho, em 27 de janeiro de 1945.

Público atento à palestra. Foto: Amanda Dutra

Após chegar em Turim, Primo Levi começou a trabalhar como químico e escrever o primeiro livro, É Isso um Homem?. A princípio, o livro foi rejeitado pela Einaudi, principal editora de Turim, e publicado pela primeira vez em 1947, com apenas 2.000 cópias para venda. Apesar de ganhar elogios de Ítalo Calvino, importante nome da literatura italiana do século XX, a obra foi pouco comercializada e vendeu apenas 1. 500 edições.

- O livro tem pouca circulação, mas ganha destaque em um certo ambiente judaico, progressista e de esquerda. Inicialmente, o livro é encarado como um livro de testemunho mas, rapidamente, a crítica começa a perceber que ali há literatura. O primeiro a dizer isso foi Ítalo Calvino, reconhecimento importante na Itália. Sendo literatura, a ideia que temos é que a dimensão da forma é fundamental. Não se trata de um texto sem forma, como a maior parte dos testemunhos, que interessam apenas pelo conteúdo – afirmou Lessa.

O livro voltou a ser publicado em 1958, agora pela editora Einaudi, em uma edição definitiva que fez sucesso e ganhou vários prêmios. Cinco anos depois, em 1963, Primo Levi terminou a segunda obra, intitulada A Trégua, que narra a saída do campo de concentração e a volta à Turim. O livro é marcado pela frase “Se Auschwitz existe, Deus não existe”.

Renato Lessa considera Primo Levi como um dos maiores pensadores do século XX, e salientou que as traduções da obra do escritor em português não fazem jus à escrita original do italiano.  O professor também observou que os livros do químico têm uma narrativa completamente diferente de outros relatos do Holocausto.

- O acréscimo de fatos na narrativa dele não vem ao ponto, enquanto a maioria esmagadora dos testemunhos atuais sobre o Holocausto focam na capacidade de denunciar, mostrar e falar por quem não está presente. Levi tem uma economia factual a serviço da apresentação de espécies de natureza mais geral, sem deixar de ser um relato historicamente referenciado e com interesse mundial. A causa material do texto de Primo Levi é a experiência de Auschwitz, mas a causa formal é o tratamento literário. E os fatos estão a serviço dessa grande construção para qual os recursos da literatura são fundamentais.

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