Cartas entre Mário e Alceu
11/04/2019 18:00
Gabriela Azevedo e Núbia Trajano

Livro mostra como escritores pensavam a formação do Brasil moderno

Debate no lançamento do livro de Leando Garcia. Foto: Bia Côrtes

Principal meio de comunicação por vários séculos, cartas compõem o livro Correspondência: Mário de Andrade & Alceu Amoroso Lima. O projeto tem como ponto de partida mensagens trocadas entre o intelectual católico Alceu Amoroso Lima e o escritor Mário de Andrade, de 1925 a dezembro de 1944, dois meses antes da morte de Mário. O livro é a primeira publicação da Editora PUC-Rio em parceria com a Edusp. E para marcar o lançamento, uma mesa-redonda foi realizada na Universidade, no dia 8.


São textos que trazem como temática o “problema de Deus” e o “problema da Igreja”, mas também a crítica literária no período modernista. Nas correspondências, os dois amigos discutem temas como o nacionalismo e tecem comentários sobre outras figuras do cenário brasileiro como o escritor Oswald de Andrade.


Correspondência: Mário de Andrade & Alceu Amoroso Lima é o sétimo livro de Leandro Garcia Rodrigues, fruto do primeiro pós-doutorado, e mostra como ocorreu o movimento modernista, católico e conservador, na cidade do Rio de Janeiro. Por meio da obra, Rodrigues afirma que é possível produzir conhecimento e uma revisão dos cânones, além de historiografia e vida literária.

Livro Correspondência: Mário de Andrade & Alceu Amoroso Lima. Foto: Bia Côrtes


Durante o debate, o organizador da obra disse ter despertado o interesse pela literatura na escola onde estudou, Colégio Estadual Barão do Rio Branco. Após esse período, a formação como pesquisador e intelectual foi feita pela PUC-Rio, onde fez mestrado, doutorado e pós-doutorado. Garcia lembrou que chegou às cartas depois de uma conversa com o filho de Alceu.


- Inicialmente, o meu projeto de pesquisa era sobre Cazuza e não tinha nada a ver com o que é hoje. Após decidir mudar o tema, tive contato com o filho de Alceu e ali eu virei do avesso. Fiquei totalmente abismado com a capacidade intelectual desse homem, que publicou 136 livros e recebeu, ao longo da vida, 32.454 cartas. Com isso, surgiu minha tese de doutorado sobre a crítica literária. Muito da minha tese saiu de arquivo, por conta das pouquíssimas informações e documentos sobre o assunto.


O Decano CTCH PUC-Rio, professor Júlio Diniz, afirmou que o debate é fundamental para discussões construtivas, pois o decanato é uma via de diálogo entre os diferentes departamentos da Universidade. Após falar sobre a importância da educação, que ele qualificou como um bem comum a todos, Diniz abordou a importância de Correspondência: Mário de Andrade & Alceu Amoroso Lima no momento atual do país e, também, para a Universidade.


-  O livro tem o momento dele, em que a discussão entre Mário e Alceu, se dá no campo da religiosidade e também questões institucionais. Não é só uma discussão sobre fé, conversão, é também sobre a instituição Igreja Católica. A necessidade, segundo Alceu, dessa instituição estar na proa das transformações civilizatórias do país.


A professora Marília Rothier, do Departamento de Letras, também participante do debate, falou sobre a mediação feita por Leandro Garcia na abordagem do livro. E ressaltou a importância da publicação da obra para compreender o período de modernização da sociedade brasileira. Para ela, a obra responde a muitas indagações feitas sobre esse período.


- As cartas de Alceu e Mario disponham avaliar, lado a lado, as informações que predominam não só no saber católico dos meados do século XX, como também sobre os paralelos e distanciamentos entre a história da literatura brasileira e da Igreja Católica no país. A divulgação da correspondência de qualquer dupla de artistas é esclarecedora. Ali se pode rastrear as tendências circulantes, relações sociais e profissionais entre os integrantes do espaço artístico, e vislumbrar as tensões obscuras que permeiam a prática das artes.

Público atento ao debate. Foto: Bia Côrtes


A professora Maria Clara Bingemer, do Departamento de Teologia, fez parte da mesa redonda e elogiou a abordagem que Rodrigues fez na obra publicada. Maria Clara, que participou da banca do doutorado de Rodrigues, também comentou o fato de Mário de Andrade antecipar alguns debates presentes nos dias atuais. Ela ainda ressaltou que o diálogo entre o escritor e Alceu abriu  caminho para uma atividade intelectual no meio religioso.


- Eu não esperava encontrar coisas que interessassem tanto à teologia. Acho que esse volume, por exemplo, não é para ficar só na área de letras e literatura, mas a teologia deveria também estudá-lo, porque a história da Igreja recente no Brasil está aqui contemplada e exposta. Por exemplo, começo por aquilo que você põe entre as páginas 20 e 21 do livro, que é o apelo de Dom Leme aos católicos. É muito significativo para a época. É bem o retrato de como se entende e deve ser a presença católica na sociedade, no maior país católico do mundo, como é o Brasil.


Outro integrante do debate, o professor Eduardo Jardim, do Departamento de Filosofia, lembrou que as histórias de vida de Alceu e de Mário tinham alguns pontos em comum, como, por exemplo, o mesmo ano de nascimento -1893. Segundo Jardim, os dois cultivavam ideias parecidas, mas as defendiam de maneiras distintas. E, apontou, eram pessoas combativas. Ele ainda destacou a discussão presente nas correspondências sobre o catolicismo e a formação do Brasil.


- Da apreciação desse assunto, dependeria uma orientação para se intervir na vida do país. Para Alceu Amoroso Lima, o Brasil é um país católico, reconhecendo que o espírito da catolicidade estava adormecido, mas é urgente despertá-lo. A Igreja precisava assumir um papel de liderança na condução da vida nacional. Já Mario de Andrade se baseava em suas pesquisas sobre cultura popular para firmar uma posição oposta. Para ele, a adesão ao catolicismo entre os brasileiros, bem como as demais religiões, era superficial e tosca no país. Ele afirmava que não se devia contar com elas para formular um projeto de nação.

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