A Aula Inaugural do curso de pós-graduação MBE Energia, no dia 2 de setembro, promoveu uma discussão sobre as perspectivas do setor energético mundial e brasileiro. Pontos como as transformações no mercado, energia renovável e o uso do hidrogênio foram abordados pelo diretor geral da GM Siemens Brasil, André Clark, pela presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás, Clarissa Lins, pelo diretor-presidente da Cosan, Luiz Henrique Guimarães, e pelo presidente ENGIE Brasil Maurício Bähr, que participaram da webinar O mundo pós-pandemia e os caminhos para o setor de energia no Brasil.
O primeiro tópico que foi levantado foi o estado de transição da matriz energética mundial, que reduz o uso de produtos de óleo & gás para aderir a fontes renováveis de energia. O investimento global em energias renováveis atingiu US$ 288,9 bilhões em 2018, superando o valor do apoio financeiro à geração de energia a partir de combustíveis fósseis no mesmo ano.
Um dos coordenadores do Instituto de Energia da PUC-Rio (IEPUC), o professor David Zylbersztajn foi um dos mediadores do debate e assinalou como as mudanças de matriz têm transformado empresas radicalmente há anos, a exemplo da montadora de carros elétricos Tesla que também investe pesado no ramo de energia. A companhia de Elon Musk alcançou o valor recorde de US$209,47 bilhões, mais alto que o preço de mercado de Volkswagen, Honda, Mercedes Benz e Ferrari combinadas. A estatística é mais destoante se comparado o número de carros produzidos: 10,8 milhões de automóveis do Grupo Volkswagen, contra 365 mil da Tesla.
- Eu hoje presido o conselho de administração da Light e uma das minhas grandes preocupações, em termos de futuro, é não saber se uma empresa de distribuição de energia do jeito que ela é hoje, é capaz de sobreviver (às mudanças do mercado) – assinalou Zylbersztajn, que mediou o encontro com o com outro coordenador da pós, professor Eloi Fernández Y Fernández.
Com a ampliação dos mercados e o surgimento de novas companhias, as empresas tradicionais expandem para melhor reagir a transformações drásticas. Pensando nisso, a multinacional alemã Siemens vai lançar no dia 1º de outubro um outro braço corporativo: A Siemens Energy. O diretor geral, André Clark, comentou que a nova companhia terá ações na bolsa negociadas em breve e já vai enfrentar alguns desafios pela frente.
- É uma empresa que nasce com a seguinte questão: A demanda do mundo para energia elétrica vai crescer 50% até 2040, no entanto, existem 850 milhões de pessoas sem energia elétrica. Como é que estas pessoas vão consumir energia? E a grande questão: qual qualidade de energia?
O fenômeno de eletrificação – amplificação da infraestrutura da energia elétrica em locais que ainda não têm este tipo de sistema - já ocorre em algumas áreas, mas, apontam os profissionais da área, aumentará simultaneamente com a energia eólica, hidrelétrica, solar e a biomassa. Para Clark, por mais que estas matrizes tenham acumulado US$2,5 trilhões na última década, é uma nova e ainda desconhecida commodity que será responsável por uma mudança ainda mais profunda: O hidrogênio.
- Hidrogênio verde é basicamente o hidrogênio gerado por energias renováveis, transformado em energia e pode ser retransformado em qualquer tipo de molécula transportável. A principal matéria-prima? Água e energia-elétrica. Isto o Brasil tem de sobra.
O hidrogênio é o elemento químico mais comum do universo e, de acordo com Clark, dentre todos os países o Brasil é o com maior potencial para ser o principal participante no mercado mundial.
- Nunca se pensou a possibilidade de exportação de energia nessa escala e deste tipo no mundo, está nascendo, há muito debate ainda. A agência mundial de energia renovável está discutindo e já fez um pré-estudo sobre isso em termos de competitividade, e o Brasil está no topo da lista nesta área. Talvez tenhamos que debater bem isso, porque pode ser a próxima política pública brasileira, como forma de exportar energia limpa de alta qualidade para terceiros países, e o próprio Brasil.
Clarissa Lins indicou uma expansão da matriz hidrogênio dentro do fenômeno da eletrificação, influenciada pela grande indústria do óleo e gás que tem como principal produto os combustíveis fósseis, que são grande fonte de hidrocarbonetos.
- A eletrificação é uma tendência inexorável, na medida em que precisamos descarbonizar também. Mas temos que encontrar esse novo papel e a contribuição para a indústria de óleo e gás, que permanece como indústria completamente relevante, sobretudo para aqueles setores em que a eletrificação é mais desafiadora do ponto de vista tecnológico. E aí surge o hidrogênio como uma ponte, que, no mínimo, aguça a nossa curiosidade.
Potência renovável já consolidada
Apesar de o Brasil ter a possibilidade de tornar-se a maior potência em produção de energia a partir do hidrogênio, o país já é protagonista nas energias renováveis há algumas décadas. Somente em 2015, o Brasil investiu mais de US$ 7 bilhões (R$ 27 bilhões) em renováveis não convencionais e R$ 226 bilhões em energias renováveis. O diretor-presidente da Cosan, Luiz Henrique Guimarães, destacou que, apesar dos problemas, o Brasil precisa mostrar o que tem de melhor.
- Nós temos muitos problemas como o desmatamento na Amazônia, mas não é só isso que o Brasil é. O Brasil tem muito mais do que os problemas que ele tem, e nós temos, como brasileiros, defender essa agenda (contra o desmatamento). Fazemos coisas erradas, e tenho certeza que como sociedade vamos corrigir, mas deve-se mostrar tudo de bom que nós temos, a enorme pujança da nossa indústria com 45% de (matrizes) renováveis enquanto a média mundial é 15%.
O presidente da ENGIE Brasil, Maurício Bähr ressaltou também um quadro favorável de legislações e políticas públicas no país para o setor de energia. Segundo ele, no cenário da pandemia, em que as incertezas são muitas, o setor de energia manteve-se resoluto.
- As políticas públicas hoje em andamento no país são muito interessantes e são muito confiáveis, estamos passando por um momento de pandemia e em nenhum momento vimos algum tipo de desabastecimento. A logística do país continua funcionando maravilhosamente bem, energia elétrica abundante disponível.