Samba no pé, no sangue e no coração
12/05/2010 15:30
João Lima / Fotos: Maria de La Gala/Arquivo Pessoal

O professor de Educação Física Júlio César da Conceição Nascimento se divide entre a função de Coordenador Técnico na Vila Olímpica Clara Nunes, da qual a PUC é parceira, e o posto de primeiro mestre-sala da escola de samba Unidos de Vila Isabel. Nascido numa família de sambistas, Júlio César tem mais de 20 anos de carreira.

A imagem de São Jorge estampada na camisa já mostra, de cara, que Júlio César da Conceição Nascimento é um homem de fé – Jorge Henrique, seu único filho com a esposa Cláudia, nasceu no dia do santo. De família católica, Júlio César se formou em Educação Física pela Uerj e hoje trabalha como Coordenador Técnico na Vila Olímpica Clara Nunes, em Acari, uma parceria entre a Secretaria Municipal de Esportes e Lazer e o Departamento de Serviço Social da PUC-Rio.

 

Mas Julinho, como é carinhosamente chamado pelas pessoas mais próximas, é também um homem do carnaval. Ninguém diria que o dono de um corpo alto e magro poderia produzir os passos ágeis e cadenciados de um mestre-sala. No entanto, foi graças ao cortejo do pavilhão da escola de samba Unidos de Vila Isabel que Júlio César conquistou os mais importantes prêmios nos quase 25 anos dedicados ao maior espetáculo do planeta. Há três anos como primeiro mestre-sala da Vila, Júlio César conseguiu a façanha de ganhar dois Estandartes de Ouro seguidos, em 2009 e 2010.

 

A paixão pelo carnaval vem de berço. Fora o fato de ter nascido e crescido em Ramos, onde se encontram a sede do bloco carnavalesco Cacique de Ramos e a escola de samba Imperatriz Leopoldinense, a árvore genealógica da família de Júlio César tem as raízes no samba. “Parte da minha Família é da Imperatriz e a outra parte é da Portela”, conta.

 

Talento precoce, Júlio César
desfila desde os 11anos
O pai, Eusébio Nascimento, conhecido como “Velha da Portela”, foi presidente da ala de compositores da escola de Madureira e um dos autores de O mundo melhor de Pixinguinha, samba-enredo vice-campeão do carnaval de 1974. A mãe, Edelzuíta da Conceição Nascimento, a Dona Delza, participou da primeira comissão de frente formada por mulheres, em 1961. O tio, Nilton de Souza, o Niltinho Tristeza, é compositor da Imperatriz e um dos autores do samba campeão de 1989, Liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós!, e do conhecido refrão Tristeza, por favor vá embora..., com Haroldo Lobo.

 

E não para por aí. Júlio César não esconde a admiração que guarda por sua madrinha de batismo Vilma Nascimento, para ele uma das maiores porta-bandeiras do carnaval. Foi com Vilma que ele estreou como primeiro mestre-sala de uma “escola de grande parte”, a Tradição, em 1990, com apenas 16 anos.

 

Mas seu primeiro desfile foi em 1985, como mestre-sala mirim da Corações Unidos do Ciep, escola nascida no ano interior a partir do envolvimento dos alunos do Ciep Avenida dos Desfiles, situado dentro da Marquês de Sapucaí. Depois de quinze anos na Tradição, Júlio César representou a Viradouro em 2006 e 2007. Em 2008, ele foi para a Vila Isabel.

 

Desde menino, ele foi ensinado pelo pai a dançar o miudinho, passo característico do samba de partido alto. “Meu pai era um sambista nato”, orgulha-se. Em 1983, Eusébio Nascimento se tornou Cidadão Samba, título dado somente ao “sambista completo”, ou seja, “aquele que canta, toca com maestria os instrumentos e samba no pé como ninguém”. Mas, aos poucos, Júlio César foi se rendendo à figura do mestre-sala e da porta-bandeira. A primeira referência foi, claro, a madrinha Vilma. “Quando eu garoto ia na casa dela, via, num quadro, ela e o seu mestre-sala. Levei aquilo comigo”.

 

Júlio César e Rute Alves na Marquês de Sapucaí,
no Carnaval de 2008:amizade e companheirismo
 O mestre-sala se emociona quando fala de Rute Alves, sua parceira na Vila Isabel. Em 2010, a alegria de ter ganhado um Estandarte de Ouro foi dobrada. E não por ser seu segundo prêmio em dois anos, mas por ver sua porta-bandeira também laureada. Rute desbancou a favorita Selminha Sorriso, da Beija-Flor. “A dança do casal de mestre-sala e porta-bandeira é de um para o outro”, afirma.

 

Quando perguntado sobre sua permanência na Vila Isabel, Júlio César muda de tom e semblante. “Para mim, fé, família e trabalho se complementam”, diz, enquanto mostra, no seu notebook, fotos com o filho e a esposa. A felicidade de se tornar pai pela primeira vez coincidiu com o momento em que foi convidado a desfilar pela escola. Por isso, ele relaciona a boa fase profissional ao bom momento da vida afetiva, e vice-versa.

 

Ao se lembrar de como foi bem recebido pela comunidade de Vila Isabel, com a qual criou laços desde os dias de universitário, Júlio César explica o simbolismo de seu status: “O pavilhão é a maior representação da escola, é o motivo pelo qual todas as pessoas entram no desfile cantando daquela forma.”

 

Ele fala de um “gigantismo do carnaval” ao se referir à profissionalização do espetáculo do samba, que, segundo ele, ofusca o antigo sentimento de paixão pela escola e o apego à comunidade. Ao declarar que não pensa em sair da Vila Isabel, confessa: “Eu ainda sou um romântico do samba”.

 

Edição 228

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