Com olhar voltado para a América do Sul, o segundo painel da IV Conferência sobre Relações Exteriores abordou o panorama das perspectivas políticas, econômicas e sociais. As ações para redistribuição de renda foram pontos abordados pelos debatedores. Uma das preocupações levantadas foi a influência da crise econômica nos programas sociais, em especial no Brasil.
A professora da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) Gisele Ricobom discutiu sobre a relação entre desigualdade, pobreza e democracia. Ela relatou as mudanças no modelo econômico e na política dos países sulamericanos e a influência dessas alterações para a exclusão e a desigualdade social. A professora defendeu uma relação direta entra a desigualdade e a densidade democrática, especialmente nos últimos 10 anos.
Gisele dividiu o conceito de democracia em hegemônica e não-hegemônica. A primeira diz respeito a uma categoria representativa e formal, limitada a eleições governamentais e, geralmente, atreladas às elites políticas e econômicas de cada país. Já a segunda, de acordo com ela, se refere a uma política que valoriza a democracia participativa, que promove a inclusão dos movimentos sociais e se baseia em uma visão direta entre Estado e sociedade. Ela acredita ainda que a democracia não-hegemônica tem dois caminhos: de reforma e de ruptura.
- Os dois caminhos possíveis nesse tipo de democracia é o de reforma, com regimes mais social-democratas e ênfase na igualdade de oportunidades com reformas tributárias, programas de desenvolvimento social e sem grandes mudanças na estrutura do capital. Brasil, Argentina, Chile e Uruguai são exemplos de governos reformadores. Ou de ruptura, com a refundação da estrutura de Estado, com forte intervenção na economia e igualdade de resultados como meta. Além da redistribuição de riqueza, para atingir a chamada concentração de renda, característicos no Equador, Bolívia e Venezuela.
Gisele Ricobom ressaltou a pesquisa feita pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), de 2014, que demonstrou queda no número de pobres e indigentes na região. Lembrou ainda do Mapa da Fome, divulgado em 2015, que apresentou a diferença entre os dados da década de 1990 e de 2015. As informações ajudam a ressaltar os resultados das políticas sociais que reduziram a desigualdade social nos últimos 10 anos, segundo a professora. Ela se preocupa com os efeitos da crise nesse tipo de políticas públicas.
- No estudo da CEPAL, de 1999, havia 43,8% de pobres e 18% de indigentes. Em 2014, o número cai, respectivamente, para 28% e 12%. Especialmente na América do Sul, o Brasil se destacou com a redução da soma total de 47% para 23%. A fome é o reflexo maior da pobreza, mas passamos de 13% para menos de 5% na América Latina. Há alertas dos organismos multilaterais para a desaceleração nesse tipo de políticas sociais. Me preocupo que estas conquistas sejam retrocedidas rapidamente devido à crise econômica.
O embaixador Clemente Baena Soares, subsecretário-geral interino da América do Sul, Central e do Caribe e Diretor do Departamento da América do Sul II do Ministério das Relações Exteriores, falou sobre o relacionamento do Brasil com os países da região. Ele destacou o pouco tempo de interação dos países da América do Sul. A primeira reunião de todos os presidentes ocorreu em 2000, ou seja, há apenas 15 anos. Soares lembrou ainda que, nesse mesmo ano, houve modificações importantes na região a partir de um cenário promissor que impulsionou o crescimento econômico.
- O início dos anos 2000 trouxe mudanças significativas no panorama político da América do Sul, com a chegada ao poder, em quase todo o continente, de importantes líderes progressistas. Alinhada a essa nova realidade, a alta dos preços dos commodities, devido à demanda chinesa, e a queda da taxa de juros nos Estados Unidos, entre outros fatores, criaram uma conjuntura externa favorável e os países sul-americanos tiveram crescimento significativo de suas economias e os governos da região investiram fortemente em políticas sociais de transferência e redistribuição de renda.
Também participaram os professores Thiago Rodrigues, da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rafael Duarte Villa, da Universidade de São Paulo (USP), Haroldo Ramanzini Júnior, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), e Vágner Camilo Allves, da UFF, que foi o moderador do debate.