A preferência pelos menos favorecidos
30/09/2016 17:45
Gabriel Franco / fotos: Divulgação

Coletânea de ensaios analisa a vida e obra de Dorothy Day

Ativista, Dorothy Day influenciou a Teologia da Libertação na América

A jornalista e ativista Dorothy Day foi uma das personagens mais importantes para o pensamento católico no século XX. Com uma história de conversão tardia ao catolicismo e de preferência pelos pobres, Dorothy fundou com o ativista Peter Maurin, em 1933, o Catholic Worker Movement (CWM), que inspirou, posteriormente, a Teologia da Libertação na América Latina. A figura da ativista é o tema do livro Fé, Justiça e paz: o testemunho de Dorothy Day, organizado pelos professores Maria Clara Bingemer e Paulo Fernando Carneiro, do Departamento de Teologia da PUC-Rio.

Segundo o professor Paulo Fernando, a ideia da publicação veio de uma coletânea de ensaios organizados a partir de um seminário que ocorre na PUC-Rio anualmente em parceria com a universidade De- Paul, em Chicago.

– A cada edição, nós escolhemos uma personalidade americana para ser estudada aqui no Rio e uma personalidade brasileira para ser discutida na universidade DePaul. Em 2013, o trabalho de Dorothy Day foi abordado e, a partir disso, reunimos os ensaios para criar o livro.

A coletânea de sete textos é um diálogo entre pensadores do Norte e do Sul. São encontrados artigos que mostram as diversas faces da ativista ao longo da trajetória dela, desde o interesse na juventude pelo anarquismo até a conversão já em idade adulta.

As bases do CWM se deram no encontro de Dorothy Day com o pensamento marxista. Apesar das palavras de Karl Marx “A religião é o ópio do povo”, foi nos estudos do pensador socialista que Dorothy encontrou justificativas para adotar um catolicismo - de preferência - pelos menos favorecidos. Vale lembrar que a data de fundação do movimento é contemporânea à grande depressão econômica americana, época de desemprego e pobreza. O CWM foi fiel à solidariedade com os marginalizados, com as greves e lutas trabalhistas.

A intuição de Dorothy Day antecipa em décadas a Teologia da Libertação, que floresceu na América Latina no final dos anos 1960. Neste movimento, o Deus judaico-cristão aparece como um “pai terno e amoroso”, que dá preferência aos pobres pelo fato de serem mais necessitados.

– O CWM é, nos Estados Unidos, o equivalente à Teologia da Libertação na America Latina. A diferença é que se dirige mais à classe média, enquanto aqui, é uma teologia
 feita para as pessoas que iriam trabalhar diretamente com os pobres – explica professora Maria Clara. 



A conversão da jornalista ao catolicismo foi tardia também pelo fato de os Estados Unidos serem um país majoritariamente protestante. Ela vivia uma relação estável com o biólogo Forster Batterham e pensava que não poderia engravidar porque havia tido um aborto anos antes. Porém, a ativista ficou grávida em 1925, ao mesmo tempo em que Batterham, um agnóstico, abandonou a relação, por não compreender o interesse de Dorothy com o catolicismo, negando casar-se com ela na Igreja por divergências de pensamentos. Em março de 1926, nasceu a filha Tamar Teresa, que foi batizada na Igreja Católica ao mesmo tempo que a mãe.

Para a professora Maria Clara, Dorothy Day é uma figura pouco conhecida no Brasil, por isso, a obra deve ser resgatada e a publicação pode ser usada também didaticamente no curso de Teologia da Universidade.

– É um pensamento muito atual, de uma mulher leiga, ativista e muito sintonizada com os problemas de uma época que não são muito diferentes dos nossos. Por isso, ela pode trazer respostas para aqueles que hoje buscam Deus por caminhos alternativos que não os da Igreja institucional.

Existe, ainda, um projeto de canonização de Dorothy Day. O Papa Francisco citou que a ativista soube incorporar os valores para a construção de um futuro melhor nos Estados Unidos. Em abril de 2016, O arcebispo de Nova York, Cardeal Timothy Michael Dolan, abriu um inquérito para apurar a vida e obra de Dorothy Day e determinar as virtudes necessárias para que o processo entre em curso.

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