Escritor da Rocinha destaca acento comunitário das novas mídias
08/06/2017 16:40
Helena Carmona

Em palestra na PUC-Rio, o também colunista do Jornal do Brasil ressalta a prestação de serviço impulsionada pelo avanço de informações descentralizadas, principalmente para dar visibilidade a denúncias e produções culturais da comunidade.

Morador da Rocinha, Davison Coutinho montou o livro Um olhar sobre a produção cultural na Rocinha como projeto final da graduação em Desenho Industrial na PUC-Rio. Com uma tiragem de pouco mais de centenas de exemplares, a publicação sobre 12 produções artísticas e o dia a dia da comunidade renbdeu ao autor um convite do Jornal do Brasil Online para escrever a coluna semanal Comunidade em pauta. Ele aceitou a proposta imediatamente, mesmo sem a intenção de se formar jornalista.

— Escrevo sobre a Rocinha, porque, toda vez que eu falo, consigo fazer o que a grande mídia não faz: mostro as pessoas, a cultura, e não a violência. Em qualquer pesquisa feita na internet sobre uma comunidade, os primeiros resultados se associam a violência e criminalidade. São 200 mil moradores, é claro que não são todos envolvidos no crime — ressaltou o escritor, aos estudantes reunidos na palestra do projeto Proximidades e possibilidades – Diálogos sobre mídia local, organizado pela jornalista Lilian Saback, professora do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio.

Davison se preocupa em mostrar ao mundo uma "outra face da comunidade: o lado humano". No JB, ele afirma ter muita liberdade e prioriza, na coluna, a divulgação de produções culturais e a denúncia dos problemas que afetam os moradores. Ele ressalta, ainda, o compromisso com a prestação de serviço:

— A vida das pessoas na comunidade é muito corrida, elas trabalham muito. Às vezes, o morador fica à margem das notícias formais, da política por exemplo. As mídias locais são mais acessíveis, são um compartilhamento de informações horizontal promovido pelos próprios moradores, coletivos e organizações sociais locais.

Além da coluna no JB, Davison escreveu para a página online Rocinha em Foco por cerca de um ano. Ele destaca a eficiência do formato digital num nível local:

— A mídia comunitária já existia. Mas os jornais comunitários eram muito limitados em termos de tiragem e circulação. Os recursos financeiros são limitados. Com a internet, há a possibilidade de dar voz as pessoas, aos moradores da comunidade. Assim é possível evitar a manipulação da grande mídia, e construir uma memória da comunidade a partir da visão de quem realmente experimenta aquilo tudo — argumenta.

Outra contribuição das mídias independentes locais, para o colunista, refere-se à participação dos moradores "na denúncia e solução de problemas". Ele lembra, por exemplo, o caso Amarildo, quando o desaparecimento do ajudante de pedreiro, depois de ser detido por policiais militares em julho de 2013, na Rocinha, deflagrou diversas manifestações na comunidade, organizadas sobretudo na plataforma digital.

Davison ressalva, contudo, que o jornalismo nas comunidades ainda enfrenta obstáculos como carência de recursos e patrocínios. Outra dificuldade é a "interpretação equivocada" feita por alguns moradores de que o trabalho jornalístico se aproxime da fofoca, como se "os jornalistas fossem X9”:

— Às vezes, as pessoas te interpretam como um X9, um fofoqueiro, que está falando demais. É complicado, porque você e a família ficam sujeitos a alguma ameaça. Agora, se for publicada uma notícia mal apurada, isso pode prejudicar alguém da comunidade, algum morador pode ser acusado injustamente.

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