O Curso de Artes Cênicas apresenta, entre os meses de maio e julho, o Projeto Repertório, composto por três peças teatrais que ocorrem em diferentes ambientes do campus. O projeto foi idealizado, assim como todos os espetáculos são dirigidos, pela coordenadora do curso, professora Ana Kfouri, e são remontagens de textos que ela criou com os alunos em períodos anteriores. Toda a produção é de responsabilidade dos estudantes envolvidos, que também assinam a dramaturgia.
A primeira, Obsessões, ocorre no Laboratório de Artes Cênicas (LAC) e adapta textos de Nelson Rodrigues. Já ANÁNKÊ é ambientada na área externa do LAC e traz textos de diversos autores como Clarice Lispector, João Cabral de Melo Neto e Fernanda Young. Os textos da dramaturga Hilda Hilst serviram de inspiração para a montagem de Boca de Miséria, cuja Vila dos Diretórios serve como cenário.
A criação do projeto ocorreu quando Ana percebeu que já havia trabalhos significativos desenvolvidos com os alunos nos semestres anteriores. Ela considerou que seria uma excelente oportunidade, durante a graduação, de os estudantes vivenciarem a experiência de três espetáculos em cartaz durante dois meses.
– No segundo semestre de 2015, meu primeiro semestre aqui, lecionei a disciplina atuação. Minha pesquisa é em torno da relação palavra e corpo, palavra e espaço e, principalmente, a palavra entendida como campo de forças, potência e não como mensagem. Escolhi Nelson Rodrigues, pois ele aborda muito mais o sentido trágico, o campo intensivo e não intencional, aspecto necessário para meu trabalho. E, devido a entrega deles, surgiu o Obsessões.
A presença dos alunos é integral. O projeto começa bem antes de eles entrarem em cena. Toda a iluminação, customização e burocracia relativa ao uso dos espaços são de responsabilidade dos estudantes. E, de acordo com Ana, a coletividade foi um fator imprescindível para a realização.
– Eles estão sempre envolvidos. Há alunos que têm mais aptidão para produção, iluminação, design. O projeto estimula muito um senso do coletivo. As pessoas que estão produzindo, gostam de produzir. Elas têm o prazer da realização, do fazer diário, e aprendem, desde já, a lidar com as diferenças. O fazer diário estimula a atuação deles em vários setores das artes cênicas. Todos assinam a dramaturgia. Eles leem, selecionam trechos, estudam, e, aos poucos, constroem o roteiro dramatúrgico como um todo, com a minha supervisão, mas isto é um avanço muito grande.
As escolhas de como cada um viria a se envolver veio de maneira gradativa. Os grupos não se limitam a só uma peça, mas se envolvem com o projeto inteiro. Abílio Sanz é aluno do 6º período do curso e ator em Obsessões e Boca de Miséria. Ele conta que todos criaram uma relação profissional com a proposta.
– O Repertório está trazendo para a gente uma construção de teatro mesmo. Como grupo, construímos e caminhamos juntos, como um coletivo, o que influencia no resultado final. Mostra para gente o quanto isso está em falta lá fora, do teatro como coletivo. Todos estão completamente inteirados no processo. Seja na atuação, na iluminação ou na ambientação.
Jean Alves Albuquerque e Ana Paula Rolón são alunos do 3º e 5º período, respectivamente, e atuam, não só no palco, mas também nos bastidores. Além de atores, ambos são assistentes de iluminação e de produção. Ana Paula observa que conhecer um pouco de cada processo é enriquecedor para o ator, pois, ao entrar em cena, ele tem mais noção do que deve fazer no palco. Albuquerque conta que, atrás das cortinas, eles desenvolvem diferentes aptidões.
– É muito importante participar não só da cena. A gente aprende a produzir e a se produzir. Foi bem espontâneo. Com o projeto, a gente ganha não só como atores, mas como pessoas e artistas. E os atores também participam da iluminação, pois nem todas as luzes estão conectadas à mesa de luz. É um trabalho totalmente coletivo, um depende do outro.