Duas peças com muita história
30/05/2017 16:32
Thaís Silveira

Exposição Yes! Nós Temos Biquíni, no CCBB, apresenta a evolução do biquíni desde o século XIX 

A primeira sala da exposição apresenta uma linha do tempo com fotos icônicas da trajetória do biquíni. Foto: Matheus Aguiar


Em 1946, uma bomba atômica explode no Atol de Bikini, no Oceano Pacífico – a primeira de uma série realizada ao longo de 12 anos de testes dos Estados Unidos. No mesmo ano, uma invenção inspirada no nome da ilha revolucionaria o comportamento da mulher. Criado na França pelo estilista Louis Réard, o biquíni foi uma mudança do traje de banho que revelou algo sempre muito escondido: o umbigo. Em comemoração dos 70 anos da peça, o Centro Cultural Banco do Brasil apresenta a mostra Yes! Nós Temos Biquíni, que vai até o dia 10 de julho. Com 120 obras e curadoria da jornalista Lilian Pacce, a exposição passa pelos diferentes modelos de biquínis ao longo das décadas, além de apresentar obras de artistas e fotógrafos como Beatriz Milhazes, Bob Wolfenson e Vavá Ribeiro sobre as duas peças polêmicas do vestuário.

Logo na primeira sala, o visitante se depara com as primeiras roupas de banho do fim do século XIX, de acervos que representam a evolução do biquíni. As roupas de lã dão lugar a uma espécie de maiô, mais esportivo, até chegar ao modelo duas peças, que ainda cobria o umbigo. Com o passar dos anos, surge a tanga, com a calcinha de cintura baixa, o asa-delta, cavado e de cintura alta, o fio-dental, entre outros. A sala seguinte é dedicada às criações dos indígenas na construção do biquíni no Brasil, com as tangas de cerâmica, que datam do período pré-colombiano. É bom lembrar que o banho de mar já era comum para eles muito antes dos europeus adotarem a prática. A professora de História da Moda Silvia Helena Soares, do Departamento de Artes & Design, comenta que o boom do biquíni no país envolveu novos hábitos dos brasileiros.

– Nada acontecia na praia. Depois, ela começou a ser frequentada por uma questão de saúde. E, aos poucos, conforme fomos descobrindo a identidade brasileira e as peculiaridades da cidade, a praia passa a ser um lugar de entretenimento. A roupa de banho acompanha isso.

Manequins mostram as transformações que o traje de banho e o biquíni sofreram ao longo das décadas. Foto:Matheus Aguiar


Ao longo da mostra, a liberação feminina e a imposição de padrões são colocadas em questão. Em uma das salas, artistas como Marcela Tiboni e Elen Braga exploram a ideia do “corpo de praia”, que é comumente associado a um corpo magro. Silvia observa que a ditadura da beleza está associada ao biquíni.

– Há um discurso de que só pode usar a peça quem estiver no padrão. Mas existe um feminino empoderado que busca outros discursos. Há uma contramão.

O interesse pelo comportamento da mulher atraiu uma senhora, que se identificou apenas como Maria Helena. Ela relembrou a revolução do biquíni há 50 anos.

– Eu coloquei o biquíni na mala da minha lua-de-mel, em 1967, para o meu marido se habituar à peça. Ele se assustou. Depois, com a ascensão da liberdade da mulher, se tornou cafona não usar biquíni.

Apesar de a peça ter surgido na Europa, a professora Silvia observa que o Brasil é internacionalmente conhecido pela moda praia. Em uma sala da mostra, manequins expõem biquínis de marcas como Lenny Niemeyer, Salinas e Triya. Ao fundo, cenas de modelos desfilando nas passarelas. Imagens icônicas de fotógrafos ajudam a criar a identidade desse produto de exportação brasileiro, desde os #365Nus de Fernando Schlaepfer, que mostram a marquinha de biquíni, aos registros de Cartiê Bressão, personagem do artista Pedro Garcia de Moura que retrata o Rio de Janeiro.

Manequins exibem modelos da moda praia, que refletem a liberdade conquistada pela mulher. Foto: Matheus Aguiar


A exposição também aborda a relação entre arte e moda. Uma peça da coleção da Blue Man, inspirada na produção de Beatriz Milhazes, é exibida ao lado de uma obra da pintora. A marca de moda praia fez o mesmo com uma criação de Jorge Fonseca, e a estilista Adriana Degreas criou um maiô de látex inspirado em trabalho de Maria Martins. No centro da sala, o artista Nelson Leirner atualizou a obra Stripencores, de 1967. São quatro manequins: o primeiro com um vestido longo e os outros três com a peça cada vez menor, até chegar a um vestido curto. Leirner criou o quinto elemento para a exposição: um biquíni formado por zíperes.

O fim da Yes! Nós Temos Biquíni é uma sala que recria uma experiência de praia. Antes da entrada, a pergunta Qual é a Sua Praia? antecipa o que será mostrado. A frase, que pode ter múltiplos significados, chamou a atenção do guia turístico Edson Ferreira da Silva.

– Vim conhecer a evolução do biquíni. Acho que a proposta é essa. A pergunta vai muito além de gostar da praia da Barra ou da Zona Sul.

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