Professores discutem o papel das universidades na democracia
26/06/2017 18:27
Camila Gouvea

Educador Paulo Carrano e filósofo Edgar Lyra debateram a função social da universidade, dos professores e dos estudantes universitários no Fórum Ensino Superior e Ciências Humanas, e destacaram cidadania como prática central na educação.

A responsabilidade das universidades face aos atuais desafios da democracia brasileira é maior à medida que a sociedade se diversifica, e implica em formar pessoas críticas, capazes de raciocinar sobre o funcionamento econômico, político e social do país. Esta foi a tônica do Fórum Ensino Superior e Ciências Humanas, com o debate A universidade no Brasil de hoje, algo a dizer?, de que participaram os professores Edgar Lyra, coordenador de Graduação do Departamento de Filosofia da PUC-Rio; e Paulo Carrano, da Faculdade de Educação UFF.

Professor Paulo Carrano (Foto: Lucas Simões)

Carrano afirmou que a universidade deve estar atenta às agendas da democratização da sociedade e ao mesmo tempo trazer para si uma compreensão de que o mundo está cada vez mais complexo e que exige da universidade uma renovação permanente:

– A universidade faz parte do tecido da sociedade e precisa andar junto, as tarefas são coletivas, pertencem a toda a sociedade brasileira. Há uma especificidade universitária que é formar novas gerações de profissionais da educação básica, profissionais da pesquisa.

Lyra acrescentou que cabe às universidades um olhar de estranhamento diante do cotidiano, fugindo de simplificações. E propôs que a universidade possa devolver à sociedade as suas questões com uma elaboração que permita dialogar e sair de impasses e tensões:

– Dados os acontecimentos recentes, como todos esses escândalos na política, os jovens estão tendo péssimos exemplos, ética e politicamente falando. Cabe à própria universidade despertar, no sentido de fazer novamente a pergunta autocrítica, no sentido de se redescobrir como lugar de debate, lugar da absorção do conhecimento, da formulação de boas sínteses que possam viabilizar um debate mais inteligente, mais à altura desses problemas.

A cidadania foi tratada por Lyra como principal tarefa da educação:

– Acho que a principal tarefa da educação é conseguir que os jovens cedam seus lugares nos ônibus e metrôs para os idosos, por exemplo. São muitos exemplos negativos, exemplos que tornam extremamente difícil para a educação formal fazer o seu trabalho – declarou.

Carrano também levantou que ser cidadão significa ter efetiva participação na vida pública e lutar por cidadania é lutar por uma inclusão formal. O professor acusou também que o desinteresse e a desconfiança na política têm a ver com a ausência de participação e a perda do sentido de cidadania.

– Para ser participação cidadã tem que ser ativa, e para ser ativa tem que influenciar nas decisões. Nós somos cheios de processos participativos que não influenciam nas decisões. “Ligue para tal número para mandar fulano para o paredão”. Essas participações não mudam nada na dinâmica da vida social. Essa desconfiança na política e a não participação, é política. É uma manifestação. O desejo de não participar, o afastamento dos processos sociais convocados pelas institucionalidades dá sinais que às vezes não são lidos de maneira adequada – realçou.

Professor Edgar Lyra. Foto: Lucas Simões

A importância do reconhecimento do aumento da pluralidade do público universitário também foi apontada. Para Lyra, a diversidade, a organização de coletivos, possibilidade de circulação de ideias pelas redes sociais cobram da universidade, dos professores e dos alunos uma revisão das ideias de convivência, de construção de futuro e das diferenças.

Carrano lembrou que as universidades no Brasil nasceram de forma elitizada e restrita, mas que nos últimos anos a sociedade vem se democratizando, mas ainda mostra desafios:

– Ainda que haja nichos de cursos que são elitizados, majoritariamente compostos por alunos brancos, ou masculinos, essa universidade está mudando, ela está mais negra, mais popular. Esses públicos ainda são pouco conhecidos pela universidade. Muitas vezes chegam e encontram uma representação dominante de outro sujeito e acabam sendo expelidos, rejeitados ou vivendo processos de sofrimento difíceis que geram dificuldade de aprendizado. O desafio hoje do acesso à universidade é muito forte, mas também o desafio da permanência qualificada na universidade é grande também. Então essa universidade tem que ser mais atenta e mais sensível à pluralidade de sujeitos que estão chegando nela.

Se a universidade é um local de educação, os professores não podem ficar fora disso. Para Carrano, os professores precisam se reeducar:

– Estar aprendendo permanentemente é tarefa permanente de quem é profissional da educação. Especialmente quem trabalha com jovens, deve aprender permanentemente a ser jovem, as relações mudam e condição de ser jovem muda também. Nesse sentido, o processo de reaprendizagem dentro da universidade é um processo de atenção. Então junto com a intenção pedagógica daqueles conteúdos, dos conhecimentos que o professor e a instituição sabem que são importantes, deve haver também uma atenção aos sujeitos que estão dentro da sala de aula. Ou seja, combinar a intenção com a atenção, e essa atenção passa por um aprofundamento dos níveis de conhecimento que nós temos em relação aos nossos alunos.

O professor da UFF ainda reconhece que a forma de transmissão de conhecimento mudou, e um novo desafio dos educadores é lidar dentro da sala de aula com alunos hiperconectados, que têm acesso a um conhecimento que não necessariamente vai ser entregue pelo professor:

– O professor tem que se colocar numa posição de mediação de saberes, então acho que essa é uma dinâmica que muitas vezes afeta um tipo de professor que foi formado com relação de transmissão de conhecimento. Hoje a complexidade do mundo exige uma agenda compartilhada entre universidade e sociedade e ao mesmo tempo um professor que compreenda que ele tem dentro de si um sujeito com uma história, com capacidade de acessar conhecimentos que deve ser trazido para a sala de aula e desenvolvido cada vez mais em projetos colaborativos, que não tenham apenas um centro no professor, do ponto de vista tradicional, mas uma perspectiva de trabalho em rede onde os conhecimentos são permanentemente atualizados por agendas coletivas estabelecidas entre alunos e professores.

O caminho, apontaram, passa também pelos alunos não ocuparem apenas o papel de ouvintes: “Tudo começa com a adesão das pautas dos alunos como pautas relevantes na vida universitária, e daí seguindo para a necessidade de criar espaços em que esse diálogo seja possível e que possam levar para outros caminhos”, afirmou Lyra.

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