Filmes retratam temas em pauta
17/11/2017 15:03
Marcelo Antonio Ferreira

Documentário Dedo na Ferida e longa-metragem Aos Teus Olhos recebem prêmios. Obras de professores são aplaudidas no Festival do Rio

Em Dedo na Ferida, Silvio Tendler explica a dinâmica do sistema financeiro mundial e suas consequências. Foto: Nina Cardoso


A desmistificação do sistema financeiro mundial, assédio e linchamento virtual foram assuntos que garantiram prêmios importantes a dois professores do Curso de Cinema da Universidade na última edição do Festival do Rio. O documentário Dedo na Ferida, de Silvio Tendler, e o longa-metragem Aos Teus Olhos, escrito por Lucas Paraizo, ganharam, respectivamente, os prêmios de Melhor Longa Documentário, por júri popular, e Melhor Roteiro.

Tendler é professor da disciplina eletiva História do Documentário e é o diretor por trás de algumas das maiores bilheterias desse gênero no país, como Glauber o Filme – Labirinto do Brasil e Milton Santos – pensador do Brasil. Na nova obra, Dedo na Ferida, o cineasta busca desmitificar e explicar o sistema financeiro brasileiro e mundial. E, de acordo, com ele, o desejo de retratar este assunto era antigo. O filme, como o título mostra, busca expor pontos claros da sociedade.

– Há muito tempo eu queria discutir porque o mercado de documentário brasileiro, o cinema, em geral, não falava do óbvio. E o óbvio tem duas questões fundamentais: mídia e a especulação do sistema financeiro. Então, ao fazer Dedo na Ferida, eu queria tocar nessas duas vertentes principais. O sistema bancário brasileiro, que só beneficia os grandes investidores e acionistas, conta com uma grande cumplicidade, que é o silêncio da mídia.

A produção do documentário durou cerca de um ano e traz uma compilação de depoimentos de diversos personagens, desde líderes religiosos a especialistas em economia. Todos em tom de denúncia contra o capitalismo. O longa foi eleito pelo público como melhor documentário, e Tendler diz que a boa aceitação das pessoas à fita é um fator essencial à resistência da sociedade contra a alienação.

– Cito uma fala do Papa Francisco no filme, que diz: quem paga o preço desse sistema são os mais pobres. O Papa é o nosso principal aliado na luta contra a dominação do capitalismo. A maneira de reagir é fazendo filmes, conferências, debates, matérias colocadas na imprensa, não deixando o assunto morrer. Fico muito feliz de ter ganho esse prêmio. De ter sido reconhecido com um prêmio conferido público. Neste momento, agora, o cinema é mais necessário que nunca. O cinema é uma arma de luta e resistência.

Lucas Paraizo escreveu Aos Teus Olhos a partir de uma peça catalã


Roteirizado por Paraizo, o longa Aos Teus Olhos também foi um caso de bom desempenho no Festival. Além de Melhor Roteiro, o filme recebeu mais outros três prêmios - Melhor Ator, Melhor Ator Coadjuvante e Melhor Direção. A trama, que chega ao grande público em dezembro, narra a história de um professor de natação acusado de assediar um aluno. Antes de qualquer tipo de prova, o personagem sofre um maçante julgamento precipitado. É uma adaptação livre da peça de teatro catalã O Princípio de Arquimedes. Professor da disciplina de Argumento e Roteiro, Paraizo revela que o desenvolvimento foi particularmente rápido para uma produção nacional.

– Foi um processo que durou, aproximadamente, oito meses. Foi muito rápido. O filme tem uma contemporaneidade, fala muito sobre esse linchamento virtual. O pouco cuidado que as pessoas têm ao fazer uma acusação virtual. O anteparo que elas têm por causa da internet. Elas não têm medo de falar o que pensam, pois, a sensação que dá é que o que é dito e feito na internet não tem consequência. O filme tem uma coisa muito legal que é procurar mais fazer perguntas do que oferecer respostas.

Paraizo também teve, recentemente, outros dois projetos de destaque. A minissérie Justiça, onde foi colaborador, e a séria Sob Pressão, na qual desempenha o papel de redator final, foram indicadas, respectivamente, ao Emmy Internacional e ao Festival de Toronto. Ambas são da Rede Globo. Ele defende, apesar da não obrigatoriedade, a importância de uma formação formal teórica e prática na área do audiovisual.

– Uma grande porcentagem do meu trabalho vai para o cinema independente. Costumo dizer que na televisão eu já cumpro uma cota de fazer um audiovisual que contemple um grau de popularidade muito grande. Então, quando vou fazer cinema, tento procurar projetos mais autorais e achar diretores que me desafiam como roteirista. Para mim, o importante no cinema é não ter segurança do que vou fazer. Ao meu ver, a formação só acrescenta. Pode se fazer cinema sem ter estudado cinema, mas se há chance de estudar, por que não? Não conheço ninguém que estudou e desaprendeu, só conheço quem estudou e melhorou.

Mais Recentes
Uma locadora em tempos de streaming
Com mais de 25 mil filmes e atendimento único, estabelecimento em Copacabana é um pedacinho da memória da cultura audiovisual do Rio de Janeiro
Valorização do cinema universitário na pandemia
Alunos da PUC-Rio participam da Mostra Outro Rio, uma exposição de curtas-metragens produzidos no Rio de Janeiro
Dez anos sem ele
Durante a vida, José Saramago criou um estilo próprio de escrita, de inovação na sintática e na pontuação