Desafios para um Brasil menos desigual
03/07/2018 18:04
Pedro Madeira

Armínio Fraga analisa a economia brasileira em ano de eleição e traça perspectivas da crise enfrentada pelo país

Armínio Fraga disse que, quanto mais o Brasil esperar para tomar providências contra os problemas enfrentados, mais duras serão as medidas. Foto: Amanda Dutra

Ao participar do encontro “Diálogos”, promovido pela Associação dos Antigos Alunos em parceria com o IAG, o economista Armínio Fraga afirmou que não há soluções econômicas para o Brasil sem que se enfrente a crise política instalada no país, definido por ele como um “quadro paralisante”. Ex-aluno do Departamento de Economia da Universidade, o ex-presidente do Banco Central se disse curioso para ver o resultado das eleições deste ano e comentou com a plateia que o eleitor não deve cair na antiga armadilha da retórica populista. A palestra foi na última quinta-feira, 28, e o tema foi Economia em Ano Eleitoral.

Sócio-fundador da gestora de recursos Gávea Investimentos Armínio Fraga começou o encontro com tom nostálgico. Lembrou ter conhecido a mulher na sala de aula, quando estudava na graduação, e agradeceu pelo conhecimento adquirido na Universidade, onde aprendeu a dar destaque aos grandes desafios na construção de um Brasil melhor. Depois, o economista passou para a análise do atual contexto brasileiro e, de acordo com Fraga, o brasileiro, nos últimos 40 anos, não chegou perto dos padrões mais avançados de renda per capita como, por exemplo, o do norte-americano. Hoje, segundo o economista, o Brasil vive uma recessão econômica que reduziu em 10% a renda per capita média do país - algo que ele qualificou como um número muito alto. Armínio foi categórico ao dizer que esta crise não é apenas econômica, mas conectada aos desafios políticos. 

- As nossas instituições políticas têm sido incapazes, ou pouco capazes, tirando sucessos aqui e ali, no geral, de lidar com os grandes desafios do desenvolvimento. Nós temos sido vítimas frequentes e históricas de corporativismo, do populismo. Um ambiente fértil para corrupção. As instituições políticas funcionam, tudo bem, nós estamos dentro de uma democracia, mas uma democracia entregue. Nós temos um sistema político fragmentado. Vinte e tantos partidos representados no Congresso.

O economista comentou que o Brasil precisa de uma agenda de reformas realmente progressistas. Foto: Fernanda Dutra 

Dentro deste cenário desfavorável da situação atual do país, Armínio Fraga consegue ver alguns esforços do governo. Ele lembra da PEC 282/16, de autoria da deputada federal Sheridan Frias (PSDB-RO). Promulgada em novembro de 2017, a emenda prevê a vedação das coligações partidárias em eleições para vereador e deputado, a partir de 2020, e os partidos deverão cumprir cláusulas de desempenho se quiserem tempo de rádio e TV em época de campanha. Fraga também elogiou a equipe econômica do presidente Michel Temer, mas ele observou que, infelizmente a equipe enfrentou restrições políticas muito fortes, como por exemplo, na proposta de reforma da previdência. Na visão dele, ela atende só a 50% da reforma que é necessária para o país. O economista chama atenção para urgência de uma reforma da previdência completa e mais “caprichada” do que a proposta pela equipe do presidente Michel Temer.

O fundador da Gávea Investimentos assinalou que existe um problema de produtividade do próprio estado. De acordo com Fraga, as incertezas de ordem interna se manifestam em uma baixíssima taxa de investimento. Ele afirmou que o estado precisa atuar como investidor na saúde e na educação, pelo menos no básico. O economista disse não ser defensor do estado mínimo, pois, se um país que precisa caminhar rumo à um cenário de igualdade de oportunidades, segundo ele, se não lançar mão do estado, as mudanças ficam inviáveis. Já houve, de acordo com o ex-presidente do Banco Central, uma melhora em alguns setores, como o elétrico e o de petróleo.

- Nós vamos ter que passar por uma reorganização bem radical das finanças públicas, inclusive para poder ter mais investimento. Em vários setores, eu acho que o setor privado tem que investir. No setor de petróleo, a privatização da Petrobras seria uma solução razoável, mas teria que haver uma revisão geral do setor, para ter concorrência. Não adianta nada privatizar e virar um monopólio.

Armínio Fraga se mostrou otimista com a equipe econômica do presidente Michel Temer. Foto: Fernanda Dutra

Outro fator relevante para a deflagração da crise, ressaltou Fraga, é o pano de fundo global. De acordo com o ex-presidente do Banco Central, o ambiente após a grande crise de 2008 foi um ambiente econômico perfeito para as economias emergentes. Ele lembrou que as taxas de juros vinham em índices baixos, mas esse período passou e o Brasil, na sua avaliação, aproveitou pouco as oportunidades.

- Foi um período de imensas oportunidades. O mundo vinha se abrindo, em maior ou menor grau, dependendo de cada região. Agora, essa abertura está ameaçada e a ameaça mais visível é o presidente dos Estados Unidos, que está assustando a todos. Isso, de certa maneira, é um vento contra.

Perto das eleições, Fraga considera que as propostas do pré-candidato à Presidência da República pelo PSDB, Geraldo Alckmin, são de qualidade e comentou que ele está assessorado por uma boa equipe econômica. Ele, no entanto, observou que está analisando a forma como a pré-candidata à presidência pelo REDE, Marina Silva, vai conduzir o seu processo eleitoral. Mas, apesar do cenário de incertezas, o economista terminou sua participação com uma fala otimista e fez recomendações ao futuro presidente. O ex-presidente do Banco Central disse esperar que o debate eleitoral no Brasil seja feito com propostas, sem, de acordo com o economista, descambar para demagogia e mentiras.

- É importante isso não acontecer (um debate com mentiras e demagogias), se não nós estamos perdidos, porque quem se eleger vai ter que tomar providências importantes. O estado precisa passar por uma reforma. Mas, bem ou mal, as coisas vêm funcionando dentro de um estado democrático, no qual os problemas vêm sendo processados. Eu penso que o alicerce fundamental disso é a liberdade de imprensa e da palavra. Isso é uma grande vantagem que o Brasil tem e que deve ser preservado.

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