Territórios e Territorialidades
16/11/2023 16:50
Angelo Ye

Professor do Departamento de Arquitetura & Urbanismo ministra aula sobre quilombo mineiro

Professor Amaro destaca a diferença entre território e territorialidades. Foto: Kathleen Chelles.

O Departamento de Letras realizou, no dia 9 de novembro, às 13h, uma aula aberta da disciplina “Representações das Africanidades”, que é lecionada pela professora Aza Njeri. O encontro foi ministrado pelo professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU) da Universidade, professor Amaro Marques e teve como tema central as narrativas, produção do território e territorialidades quilombolas.

A aula foi baseada na experiência que o professor teve como pesquisador no quilombo Bom Jardim do Prata, localizado na zona rural do município de São Francisco, norte de Minas Gerais. Com 3.400 habitantes, o lugar fica entre os rios Acari e Pardo, e foi usado durante o período da colonização como um ponto de refúgio e resistência ao sistema escravocrata vigente na época.

Para evitar más interpretações e ter um entendimento integral do tema, Amaro Marques ressaltou a importância de diferenciar “território” e “territorialidade”, termos-chave na pesquisa etnográfica do professor.

— Na arquitetura, é entendido como “território” alguma coisa com limite, como lote, quarteirão etc. Contudo, o termo é mais abrangente, pois o território também é o lugar de manifestação de relações de poder em determinada área física. Já as territorialidades seriam as manifestações desses atores sociais naquele determinado território. No caso da comunidade quilombola, o giro da Folia de Reis, que é percorrer o território visitando as casas, cantando, dançando, tem a ver com territorialidade. Ou seja, a territorialidade inclui manifestações culturais, artísticas, religiosas e culturais.

O pesquisador relatou algumas características do tempo em que teve de se mudar para o quilombo para concluir sua pesquisa. Ele já tinha estado no lugar algumas vezes, mas apenas por um período curto de tempo. Dessa vez, ele conseguiu ficar alguns meses no espaço e ter um conhecimento mais apurado daquele povo e região. Isso o ajudou a ganhar a confiança dos moradores. Segundo ele, a organização do quilombo tem a solidariedade como principal característica, algo herdado das raízes africanas. 

O professor Amaro ficou na casa da liderança quilombola. Lá, ele descobriu que havia disputas internas na comunidade, pois quem se torna líder, manda naquele território. O pesquisador descreveu as características do quilombo que fica a 200km de Montes Claros, principal centro urbano do norte de Minas. Não há estrada, energia elétrica, água tratada, esgotamento sanitário, pavimentação de vias e apenas uma escola. 

Alunos de pós-graduação assistem à palestra de Amaro Marques. Foto: Kathleen Chelles.

Os desafios

Amaro Marques conta que um dos desafios que encontrou foi a inexistência de arquivos ou documentos escritos que contassem a história do quilombo. A falta de registros dá margem para que posseiros e fazendeiros reclamem a posse daquele território e expulsem os quilombolas de terras que pertenceram aos seus antepassados. Para contornar a situação, muito da pesquisa que Amaro fez foi baseada em relatos de testemunhas primárias ou secundárias, característicos da história oral. Segundo ele, dados oficiais que deveriam ser providenciados pela prefeitura do município em que o quilombo está localizado eram bem dispersos. 

Além do estado precário que esses territórios se encontram, o docente também mostrou preocupação com o esvaziamento deste e outros quilombos. Isso  representa um apagamento de parte da história de povos de origem africana e, consequentemente, de parte da história do Brasil. 

— Lá, funciona o regime de trabalho sazonal, em que em determinado período do ano eles plantam e, após a colheita, eles saem para trabalhar nas zonas urbanas próximas ou em estados como Goiás e São Paulo. Lá, eles trabalham na construção civil ou no plantio de alho, laranja e outras commodities. Essas saídas são geralmente feitas durante dois períodos do ano. Muitos desses trabalhadores, compostos majoritariamente por homens, acabam não retornando para a comunidade.

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