Nascidos e criados na comunidade do Vidigal, os boxeadores olímpicos da Seleção Brasileira Michel Borges, 25 anos, e Patrick Lourenço, 23 anos, são exemplos de superação de jovens que hoje representam o Brasil ao redor do mundo. Conheceram o esporte olímpico no Instituto Todos na Luta, do mestre Raff Giglio, no Vidigal. Depois de participar de várias competições mundialmente reconhecidas, realizaram o sonho de competir na Olimpíada Rio 2016. Não conquistaram medalhas, mas a participação gerou muita credibilidade.
Assim como muitos adolescentes de famílias humildes, Michel e Patrick trabalharam como boleiros de tênis no Clube dos Caiçaras, na Lagoa, durante a infância. Com uma rotina agitada de estudar e trabalhar para ajudar na renda mensal, os atletas acreditam que tudo que viveram foi essencial para chegar onde estão atualmente.
Filho de paraibanos, Michel é dono de três medalhas de ouro, uma do Pan-Americano 2013, outra da Copa do Pacífico 2012 e a terceira do Campeonato Sul-Americano de Boxe, também em 2012. Ele conta que se sentiu lisonjeado em poder representar o Vidigal na Olimpíada.
- Depois de poder representá-los na Olimpíada, aumentou muito o público que me apoia aqui. O percurso que eu faço para chegar até em casa dura cerca de dez minutos, mas agora levo uma ou duas horas, porque tenho que falar com muita gente, tirar foto, conversar, tudo é muito gratificante.
Já fazem quatro anos que Michel e Patrick foram convocados para a Seleção Brasileira. Após a mudança para a sede, em São Paulo, os pugilistas admitem que a maior dificuldade é viver longe da família.
- Quando entramos na academia do Raff, éramos só amigos de treino. Assim que a gente se mudou para São Paulo a amizade se fortaleceu muito. Um ajudou o outro porque foi a fase mais difícil para nós - diz Patrick.
Terceiro sargento do Exército, Patrick Lourenço relata que viveu dias ruins antes da luta na Olímpiada e, por isso, acabou perdendo o foco, o que pode ter sido um dos motivos da eliminação na disputa das preliminares da categoria mosca ligeiro até 49 kg.
- Eu recebi a notícia de que tinha perdido minha avó um dia antes da luta. Minha mãe não queria me contar, mas eu acabei descobrindo. Fiquei sem saber o que fazer. Decidi que ia continuar porque é meu sonho, e se eu tivesse que sofrer, seria depois. Mas eu não consegui dormir à noite, meu corpo não conseguiu se recuperar para luta e, infelizmente, não avancei na competição.
Patrick teve o pai assassinado quando tinha apenas três anos de idade e desde criança sonhava em ser atleta olímpico, porém, ainda não tinha descoberto a verdadeira vocação no esporte. Foi aos 13 anos que ele começou a praticar boxe.
- Eu sempre estive no meio do esporte. Já joguei tênis, futebol, e sempre quis ser atleta, só não tinha ideia de qual iria seguir. Eu conheci o projeto por meio de um vizinho aqui do Vidigal. Acabei indo por curiosidade, me apaixonei, daí em diante eu larguei o tênis e o futebol e não conseguia mais viver sem o boxe.
Já Michel Borges, que disputou a categoria peso meio pesado até 81 Kg, chegou bem próximo da medalha de bronze, mas perdeu para o cubano Júlio César La Cruz nas quartas de final. Ele reconhece as falhas que o afastaram do pódio.
- Não estou acostumado com o estilo de luta do meu adversário, que é mais estratégico, diferente do meu. Mas eu preciso fortalecer essa parte e tenho total chances de vencê-lo, apesar dele ser tricampeão mundial, eu sou capaz de ganhar porque se eu cheguei até aqui, quer dizer que tenho potencial para isso. Minha meta é trabalhar muito nesse tipo de treinamento.
A rotina dos dois atletas é intensa. De segunda a sexta-feira, pela manhã, eles fazem a preparação física e, à tarde, treino tático, de contato, o famoso sparing, com simulação de lutas. Sábado é o único dia que treinam somente no período da manhã.
A equipe de Seleção Brasileira oferece nutricionista, preparador físico, cinco técnicos, fisioterapeuta e todo tipo de atendimento que um atleta de alto rendimento necessita. A alimentação é balanceada para manter o peso da categoria. O preparo físico tem muita corrida para conseguir ganhar mais resistência, com práticas de circuitos de velocidade e agilidade.
Michel conta que sempre foi incentivado pelo pai a nunca desistir de ser um atleta campeão. Ele relembra que só passou a ganhar dinheiro com o bolsa atleta depois de oito anos de muito treino. Com esse auxílio, conseguiu ajudar financeiramente.
- Desde que eu era criança meu pai falava sobre boxe. Ele dizia que o sonho dele era ser atleta, mas nunca teve oportunidade. Entrei no projeto porque queria praticar e conhecer a arte e, no fim do mês, eles forneciam uma cesta básica que eu pegava com o maior orgulho, pois fazia muita diferença na minha casa.
Os pugilistas sonham em, no futuro, poder contribuir com o Instituto Todos na Luta e, até mesmo, montar a própria academia com um projeto de boxe que dê oportunidade para várias crianças. Eles contam que, apesar de ainda não terem condições de ajudar financeiramente, sempre que podem, doam luvas, uniformes e sapatilhas para o Instituto.
- Mesmo não sendo muita coisa, é uma forma de incentivar essas crianças que estão aqui. É muito complicado, moradores de comunidades sofrem muita falta de incentivo e passam por dificuldades, sabemos o que é isso – afirma Patrick.