Engenharia e um Projeto de Nação – O exemplo da Coreia do Sul
24/11/2009 15:40
Luiz Scavarda e Marcos Formiga

Artigo

O século XXI está se caracterizando como época na qual o conhecimento, mais do que nunca, define valores e riqueza. Em particular, o conhecimento tecnológico agrega valor aos produtos e serviços que, hoje, ganham escala global e surge como resultado de um constante esforço de educação básica que gera uma plataforma de cidadania, oportunidades de trabalho e renda, e prepara contingentes de pessoas para a educação superior. Dessa onda surgem profissionais empreendedores com visão não apenas de mercado e de suas oportunidades individuais, mas também com visão de desenvolvimento sustentável, em seus aspectos sociais e ambientais.

Tomemos como referência para reflexão, o caso da Coreia do Sul que, em 1953, saiu de uma guerra com a Coreia do Norte, resultado dos novos arranjos de poder mundial que se seguiram à Segunda Guerra Mundial e à vigência da Guerra Fria e que, menos desenvolvida que a Coreia do Norte, onde se concentrava a indústria, foi por essa quase completamente destruída. Nos últimos 55 anos a Coreia do Sul revolucionou seu processo de aprendizagem da Educação Básica até a Universidade. No campo da Educação Superior, investiu pesadamente em cursos de Engenharia e, ao longo dos anos 70 e 80, mudou o patamar de formação de 8 para 80 mil engenheiros por ano. Em conjunto com forte investimento em sua infraestrutura industrial e urbana, o esforço educacional foi o grande investimento estratégico na preparação para o século XXI. Engenheiros, aliados a técnicos e tecnólogos de qualidade e a um agressivo programa de competitividade no mercado mundial, permitiram que a Coreia do Sul atingisse uma renda per capita de US$ 25 mil por ano, 35ª posição mundial na listagem do FMI. Além disso, alcançou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,928 (25ª posição mundial). Para referência, estes números são, para o Brasil, respectivamente, US$ 10,3 mil (77ª posição) e 0,807 (70ª posição). A estratégia de seu desenvolvimento econômico teve nas exportações o seu eixo dinâmico o que ocasionou uma transformação radical em sua economia: seu PIB de US$ 2,3 bilhões, em 1962, alcançou US$ 970 bilhões em 2007. Seu crescimento acelerado foi abastecido pela alta capacidade de poupança que garantiu vultosos investimentos e uma forte ênfase em educação. Com tais atributos, a Coreia detém a maior indústria de construção naval do mundo, a terceira em semicondutores e a quarta em eletrônica digital. A cada década, a indústria coreana mudou o seu perfil, iniciada com a química pesada; reestruturou-se nos anos 80 para promover as pequenas e médias empresas (PMES); e preparou-se para a abertura dos mercados e sua liberação nos anos 90. Desde 2000, a inovação está no topo da agenda nacional, sustentada por uma política facilitadora de negócios com forte cooperação entre as grandes empresas e as PMEs. Com o histórico de ser uma das economias que mais crescem no mundo, o grande desafio da Coreia do Sul para o século XXI é tornar-se um ponto focal de um poderoso bloco econômico da Ásia. Existe um crescente interesse por parte dos investidores em P&D e centros de logística que asseguram à Coreia uma posição entre os 10 primeiros grandes captadores deste segmento. Em 2006, a Coreia ocupou a 4ª colocação global em termos de pedidos de patentes internacionais na Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI).

A crise econômica iniciada ameaçou as conquistas realizadas. Para enfrentá-la, fez reformas cambiais, fiscais e trabalhistas, negociou e reestruturou a dívida externa com os bancos credores. Ocupa hoje a posição de 13ª economia do mundo, com volume de comércio externo de US$ 728 bilhões; sendo a 11ª indústria mundial, e a quarta maior reserva cambial. Para revigorar a opção pela tecnologia de ponta, recentemente foi criado o inédito Ministério da Economia e do Conhecimento, que, por meio do Instituto Coreano para o Avanço Tecnológico (KIAT), tem a responsabilidade da pesquisa aplicada, da inovação e do empreendedorismo.

O exemplo da Coreia do Sul não pode e nem deve ser copiado, mas é uma lição de estratégia e sucesso que pode servir de inspiração para os países em desenvolvimento, ainda relutantes em definir sua prontidão para o futuro de modo compatível com suas necessidades, potencialidades e vocação. O Brasil possui vantagens competitivas, se consideradas a imensa riqueza natural que possui e a intrínseca criatividade de seu povo. Ainda que ao longo do século XX tenha havido um forte crescimento econômico baseado em recursos naturais, para desenvolver a competência necessária e explorar as vantagens alternativas a seu dispor, o próximo passo é um projeto de Nação para o século XXI baseado na riqueza emergente advinda do conhecimento.

 

Luiz Scavarda
Vice-Reitor PUC-Rio
Marcos Formiga
Assessor Especial da CNI/SENAI-DN e Professor da UnB

 

Edição 224

 

Mais Recentes
Entre a ação e a cooperação: a Associação dos Funcionários da PUC-Rio
Antônio Albuquerque e Eduardo Gonçalves, do Núcleo de Memória da PUC-Rio, abordam as mudanças na forma de organização dos funcionários das instituições de ensino superior após a Reforma Universitária, e refletem sobre a criação da AFPUC
A História é mestra da vida
O Conselheiro da Associação dos Antigos Alunos da PUC-Rio, Paulo Eugênio de Niemeyer, aborda a influência do passado na vida humana e os novos comportamentos nos ambientes sociais
Educar para a Justiça: um olhar sobre a Pedagogia Inaciana
A pedagogia inaciana é tema de artigo da professora Alessandra Cruz, do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio