Um país que possui uma das mais ricas biodiversidades do planeta deveria não apenas se orgulhar-se deste privilégio, mas fortalecer-se progressivamente na política e na ciência. Mas, paradoxalmente parece que caminhamos bem do lado da ciência, e retrocedemos na abordagem política. Nos últimos anos, a ciência brasileira cresceu enormemente na produção e na divulgação das questões ambientais do país, com grande impacto no processo de conscientização da sociedade. As ações ministeriais passadas, o estabelecimento de algumas políticas públicas, os esforços das Universidades e Institutos de pesquisas, os projetos ligados às organizações não governamentais etc, foram responsáveis por este sucesso na área do meio ambiente. Tudo isso contribuiu para que as questões socioambientais, ocupassem um lugar de relevância na vida das pessoas, nas instituições, e na sociedade como um todo.
No entanto, hoje percebemos sinais que a política partidária brasileira vem empobrecendo no enfoque relacionado com o meio ambiente, criando uma dicotomia entre o parlamento e o caminhar da ciência e da sociedade. Sucessivos erros têm sido cometidos nos últimos anos, tanto por partidos que carregam a bandeira ambiental, como de outros que se opõem ao discurso ambientalista, por considerá-lo um empecilho para o desenvolvimento de alguns setores do país. Infelizmente esta tensão tem sido acompanhada de extremismos, por falta de uma visão mais sistêmica e por omissões sucessivas. Aquilo que deveria ser objeto de consenso entre temáticas relacionadas com a expansão do agronegócio e a preservação do meio ambiente, passou a ser motivo de disputas e dissensos entre bancadas no parlamento. Como a lógica economicista tem força maior, pois o dinheiro permite a manutenção do poder político, é natural que ela se sobreponha à lógica ambiental, onde outros valores são considerados. A falta de uma visão mais sistêmica do meio ambiente, onde as questões ambientais estão imbricadas com as sociais, ainda continua sendo um gargalo na mente de muitos daqueles que são eleitos para nos representar. Basta observarmos os discursos de alguns políticos para percebermos que a visão fragmentada continua a imperar no parlamento, e em determinados setores do poder executivo, exceto no Ministério do Meio Ambiente, que muitas vezes encontra-se em posição constrangedora e delicada. Por vezes, as omissões são também responsáveis por este empobrecimento, sobretudo de partidos que têm a bandeira ambiental como eixo norteador. É espantoso perceber que parlamentares que no passado e no presente, filiados a estes partidos, não conseguem explicitar de maneira articulada o discurso socioambiental, manifestando mais uma vez a dicotomia entre algo que deveria ser tratado conjuntamente. Infelizmente não percebem a íntima relação entre justiça social e justiça criacional, conforme nos orienta a Encíclica Laudato Sí do Papa Francisco.
O paradoxo nos leva a perguntar até quando vamos manter esta dicotomia, pois se de um lado nos projetamos nacional e internacionalmente, como um país cuja riqueza da biodiversidade nos orgulha e nos diferencia, por outro, corremos o perigo de apequenar e empobrecer politicamente nesta questão tão importante para a ciência e a sociedade?
Que este paradoxo possa servir de reflexão para as escolhas que teremos que fazer neste ano eleitoral, que certamente exigirá de todos nós muito discernimento e bom senso, evitando no futuro o retrocesso em questões planetariamente relevantes.
Padre Josafá Carlos de Siqueira S.J. – Reitor da PUC-Rio