Há dois anos, sob a coordenação da Secretaria de Estado de Cultura – Fundação Anita Mantuano de Artes do Estado do Rio de Janeiro (Funarj), a escola, que já teve como professores os poetas Olavo Bilac e Cecília Meireles, estava praticamente abandonada. Em agosto do mesmo ano, a então presidente do Grêmio, a aluna de Ciências Sociais da PUC-Rio Aline Franca, atual estagiária do Centro de Memória Luiza Barreto Leite, da Martins Pena, se juntou a outros estudantes, e foram para a frente da Funarj pedir uma solução. “A Martins Pena estava em condições precárias, praticamente iria fechar. Sete professores foram mandados embora, não tinha nem segurança. Consegui chamar a imprensa e trazer atenção para a escola”, relembra Aline.
O fato ocasionou a mudança da administração para a Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec), que começou a tomar algumas providências. A única instituição pública de teatro de nível médio no Brasil mudou a direção, recebeu novos investimentos e garantiu a formação dos alunos. “A
Com a recuperação, veio uma das melhores formas de reconhecimento. Em junho deste ano, a escola ganhou a Medalha Pedro Ernesto, entregue a figuras de destaque da sociedade brasileira.
- Ser reconhecido pelo centenário é o auge de todo um projeto de recuperação da memória da escola, que é importantíssima, devido às pessoas que passaram por aqui, ressalta José Antônio Sepúlveda, coordenador do Centro de Memória.
E foram muitas, algumas delas bem conhecidas do grande público, como a atriz Dira Paes. Mas provar que todas estudaram na escola é um grande desafio, já que os arquivos dos alunos precisam ser reorganizados, e muitos ainda não foram encontrados, principalmente os da época da ditadura militar. Para se ter uma idéia, os documentos ficavam totalmente largados no chão do banheiro. “Tem muito a ser recuperado, tarefa pára vários anos”, admite Sepúlveda.
A dificuldade de encontrar documentos faz com que muitas histórias se perpetuem sem realmente serem comprovadas. As mais famosas contam que o cantor Cazuza e o jornalista Carlos Lacerda estudaram na instituição. Entre as confirmadas, está a de que Procópio Ferreira, de vez em quando, apanhava de um colega de classe, que seria Nilton Sucupira, mais tarde, uma importante figura na ditadura militar. A situação chegou ao ponto de Procópio escrever uma carta para Coelho Neto, na época diretor da escola, reclamando do incidente.
A fama da escola ultrapassa fronteiras. Já passaram por lá pessoas de diversos lugares do país e do mundo, como da Itália, Rússia e principalmente África. Há onze meses no Rio, Wellington Dias veio sozinho do Amapá só para estudar teatro. Atuando desde 2002, ele viu na cidade a oportunidade de aprimorar-se. Como já tinha ouvido falar da Martins Pena, decidiu fazer a prova e passou. “A Martins tem profissionais muito talentosos. Aqui acabamos convivendo como uma família”, destaca o aluno.
Por ser uma instituição pública e de qualidade, a procura por uma vaga é grande. O número de inscritos para realizar o processo seletivo gira em torno de 300 pessoas por semestre. Apesar disso, apenas 40 alunos são aprovados. “A escola dá a oportunidade de realizar um sonho de se tornar ator. Quem não tem dinheiro para pagar, vem para cá e faz um concurso superdisputado”, diz o coordenador Sepúlveda. Para entrar na escola, é necessário passar por uma banca, onde o candidato é julgado por sua interpretação e depois faz uma prova. “A Martins está provando, e sempre provou, que a educação pública pode ter qualidade e ser referência no ensino de arte dramática”, garante o diretor Marcelo Reis.
Muita história
Fundada por Coelho Neto, presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL) em
Apesar de querer inovar na arte da interpretação, a Martins Pena já nasceu em crise. A primeira turma surgiu apenas em 1911. Foi difícil conseguir um lugar para a escola, que, após algum tempo, alojou-se no Teatro Municipal. “Até chegar aqui, em 1950, ela passeou por vários lugares”, conta Sepúlveda. A atual sede é a casa onde nasceu o Barão do Rio Branco. Por conta disso, circula na escola a lenda de que o espírito do Barão ronda o prédio durante a noite.
A escola não possui nenhum livro publicado com sua história. Para deixar registrada e torná-la pública, o Centro de Memória está preparando dois livros em fase de captação de recursos, e um documentário em pré-produção.
Jornal 203