É impossível falar de economia sem falar de política. Foi assim que o Decano do Centro Ciências Sociais (CCS), professor Luiz Roberto Cunha, iniciou a palestra sobre as perspectivas para a economia brasileira em 2019, na segunda-feira, 18, no Instituto Gênesis. Durante a exposição, ele traçou um panorama da realidade do país nos anos 2000 e identificou os principais desafios que o governo do presidente Jair Bolsonaro enfrenta. A reforma da Previdência e a baixa qualidade dos serviços públicos básicos foram temas centrais do encontro.
O Decano ressaltou a questão do desequilíbrio fiscal. Segundo ele, ao comparar as receitas líquidas e despesas totais do Brasil a partir de 2015, pode-se constatar a formação de um fenômeno que é conhecido na economia como "boca de jacaré", quando gráficos apontam um distanciamento entre dois fatores. Na aula, o economista apontou que isso ocorre quando as despesas passam a ser maiores do que as receitas, o que pode quebrar o país a longo prazo.
- O principal desafio é enfrentar a chamada tragédia fiscal. Números mostram que a dívida pública é crescente. Essa dívida vai se acumulando até se tornar insolvente, e então as opções seriam retomar a hiperinflação, que no passado ajustava as contas públicas, ou aumentar a carga tributária, o que foi feito nos últimos anos, e que a população não aceita mais. Para contornar esta situação, a reforma da Previdência é fundamental.
O economista explicou como funcionava a alta inflação dos preços no Brasil no fim dos anos 1980 e início da década de 1990. Cunha ressaltou que, quando atuou no governo do Estado, após 'rolar' a dívida e pagar em dia os salários e aposentadorias, as prioridades, com o que sobrava no caixa, eram "a merenda das crianças, a gasolina da polícia e a comida dos presos". Com base em um artigo que ele escreveu para o jornal O Globo em 2017, o Decano expôs o lado negativo da indexação. Segundo ele, a "mágica" favorecia apenas o governo enquanto a inflação "comia" os salários, aposentadorias e pensões.
Em relação aos atuais gastos do Brasil com a Previdência Social, o professor do Departamento de Economia ressaltou que se assemelham aos de países cuja idade média da população é avançada. Ao considerar que o Brasil ainda tem uma população apontada como relativamente jovem, a questão da Previdência se agrava. Caso a reforma não ocorra, observou o professor, o sistema pode se tornar insustentável nas próximas décadas.
- Nós gastamos hoje tanto em Previdência quanto gastam países como Japão, França e Alemanha em termos percentuais do PIB. A diferença é que somos um país onde ainda existe mais gente jovem para sustentar o sistema do que gente mais velha, mas estamos envelhecendo. Nós vamos ter um gasto cada vez maior com a Previdência se não houver uma mudança. As pessoas estão vivendo mais, e os sistemas de Previdência agora têm que estar preparados para sustentar cada vez mais pessoas, e por muito mais tempo. É um problema demográfico.
O economista explicou que, como os gastos com Previdência são elevados, não há dinheiro em caixa para investir no oferecimento de serviços básicos à população. Cunha mostrou um relatório do Instituto Fiscal Independente, vinculado ao Senado, sobre o orçamento público federal, o qual apontou, em 2017, que o Brasil direcionou 9,9% do seu PIB para a Previdência, enquanto saúde e educação, cada, receberam 1,7%. O professor analisou um tema bastante discutido na campanha de Bolsonaro, a segurança pública, que demanda altos recursos.
- Um país, que não tem dinheiro para investir em saúde e educação, e que, infelizmente, está gastando muito mais do que deveria na Previdência, ainda terá que buscar recursos para atender a segurança.
Segundo Cunha, dados do Banco Mundial atestam como o Brasil gasta um percentual, em relação ao PIB, muito menor em saúde, educação, segurança e infraestrutura comparado a países como México, Chile, Estados Unidos, Índia e China. O economista ainda afirmou que, por outro lado, o país está no topo da lista em termos de gastos gerais do governo em relação ao PIB. Ou seja, comentou o economista, gastamos muito, mas não no que a população precisa.
O professor também traçou um histórico do Brasil desde o Plano Real, com foco nos governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Cunha ressaltou que, durante esses períodos, o país passou por mudanças econômico-sociais significativas, mas não houve mudanças na política de forma significativa.