Saldanha: 'Tem que estudar muito'
31/08/2006 16:06
Clarice Tenório / Foto de Felipe Fittipaldi

Estudantes lotaram o auditório do RDC para receber Carlos Saldanha, co-produtor de A Era do Gelo (2002) e Robôs (2004) e diretor de A Era do Gelo 2 (2005), que conversou por mais de três horas com os alunos, na noite de 8 de agosto. A palestra tratou do crescimento do mercado, do desenvolvimento e futuro das técnicas e da sua trajetória como animador. O JORNAL DA PUC entrevistou Saldanha e procurou responder dúvidas e curiosidades sobre a estrela brasileira da animação

O mercado de animação, o processo de produção dos filmes, as perspectivas do ramo e as técnicas usadas foram as questões abordadas por Carlos Saldanha na palestra. Momentos antes da apresentação, o JORNAL DA PUC conversou com o diretor da Blue Sky.

Jornal da PUC – Você é formado em quê? Que cursos considera necessários para que seja possível trabalhar com animação?

Carlos Saldanha – Depende de cada um. No meu caso, comecei com Informática e depois fui para a animação, mas sempre tive um lado artístico muito grande. Entrei para a parte técnica porque eu gostava de computador, mas adorava artes. Juntei as duas coisas. Acho que ter uma base artística é muito importante. Não importa qual, se através de mestrado ou de faculdade ou por natureza. O talento vem de diferentes formas. Existem várias áreas de computação gráfica e animação em que você consegue aproveitar pessoas de vários backgrounds, de formações distintas. Tem pessoas que vêm de pintura, de escultura e, hoje, já existem faculdades em que você se forma em animação.

JP – Qual a importância do roteiro na hora da animação? E qual a influência que você exerce na hora de materializá-lo?

Saldanha – Sem o roteiro você não tem o filme. É o esqueleto do filme. Ou seja, um bom roteiro quer dizer um bom filme. Se as falas forem boas, os personagens vão ser interessantes. A maior dificuldade da animação é você montar um roteiro, uma equipe de roteiristas, de criação, de idéias, de storyboard. E a minha influência é diária. Diariamente eu leio o roteiro, faço mudanças, peço sugestões e cenas novas.

JP – O que você recomendaria para quem está ingressando no mercado? Além da criatividade, o que de fato deve ser feito? Quem procurar, por onde começar?

Saldanha – A fórmula é simples, mas não é tão simples assim. É muito individual. O que posso dar pela minha experiência: você tem que estudar muito, correr atrás do que quer fazer. Tem que ter um objetivo. Você tem que gostar muito do que faz, porque sem esta paixão não consegue ter forças para suportar os desafios. Você também não pode nunca parar de aprender: eu estou constante-mente pesquisando e estudando. E outra coisa é ter um pouco de talento para o que está fazendo. Não adianta querer pegar uma pessoa que não sabe fazer nada com relação à arte - não tem a visão artística, não tem a visão de animação, de movimento - e tentar transformá-la em um animador. Estas são as regras básicas.

JP – Você acha que a animação tradicional tende a desaparecer?

Saldanha – Eu acredito que não. Existe mercado para todos os tipos, massinha, boneco, tradicional... Animação é tudo aquilo em que você consegue criar movimento, indepen-dentemente da técnica. No momento, o que está dando maior retorno financeiro é a computação gráfica. Os filmes de computação gráfica têm tido bons roteiros. Eu espero que as outras técnicas não morram, porque o interessante no ramo é, justamente, a diversidade de técnicas e visuais. No Japão, a animação em 2D ainda é firme e forte.

JP – Como você vê a animação brasileira?

Saldanha – Na época em que eu saí daqui, em 1991, girava em torno de alguns artistas, que até hoje estão no ramo, e o pessoal da PUC está incluído neste grupo. Havia artistas excepcionais, mas que não tinham quem lhes apoiasse. De uns quinze anos para cá, a animação já tem outro patamar. Já existem várias companhias fazendo trabalhos excelentes. Já temos um festival, e qualquer país que queira ter um mercado de animação tem que ter um bom festival. O Anima Mundi é uma coisa fantástica. Não é possível comparar os Estados Unidos com lugar nenhum do mundo. Cada país tem a sua peculiaridade e o Brasil tem que aproveitar a dele.

JP – Você tem vontade de voltar?

Saldanha – A gente sempre pensa, né? Minha família está aqui, eu sou daqui. Curto ficar aqui. Gostaria muito de poder ajudar no desenvolvimento do ramo no país, mas eu acho que mesmo lá fora eu consigo fazer isso. Meu filme fez muito sucesso, já criou um burburinho positivo e as pessoas pelo menos têm a consciência de que é possível fazer animação.

JP – Com as novas tecnologias, que ao longo do tempo foram se aprimorando, a tendência não seria diminuir o tempo de produção de animações, que duram até quatro anos?

Saldanha – A verdade é a seguinte: a tecnologia cada vez melhora. A diferença é que quanto mais tecnologia você tem, mais idéias e ambição você tem. Já que fazemos mais rápido, vamos fazer mais coisas e melhor. Fazemos mais filmes e também o que queríamos e não podíamos fazer, como um bom efeito com água e pelo. Na verdade, você não reduz o tempo, melhora o filme.

Pós em Animação: de olho no mercado profissional

Conversa animada com Carlos Saldanha

Edição 174