A versão 2020/2021 do Congresso Brasileiro de Geografia Política, Geopolítica e Gestão do Território (CONGEO) foi divido em ciclos e a série mais recente foi realizada em abril. Em formato virtual, o circuito foi divido em quatro encontros semanais durante o mês. As conferências refletiriam sobre os desafios e novos debates da geografia política contemporânea no Brasil. Cada encontro representava uma região diferente do país e trouxe profissionais locais como convidados, no total, nove pesquisadores brasileiros foram selecionados. Os debates foram organizados pelos núcleos de pós-graduação de geografia das universidades, PUC-Rio, UFRJ, UFF e UnB.
A quarta e última mesa de discussão foi no dia 29 de abril e abordou as intersecções da Geografia. O encontro foi mediado pelo diretor executivo da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (FUNDAP) e professor titular do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP), Wanderley Messias da Costa. O debate ficou por conta dos professores Antônio Marcos Roseira, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFABC), e Hélio Caetano Farias, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME).
Durante a introdução da palestra, o professor Messias se mostrou otimista perante o atual momento dos estudos da geopolítica. De acordo com ele, as convergências de ideologias e pensamentos são fundamentais para os avanços intelectuais.
- Acho que estamos em um bom caminho. Aqui no CONGEO há jovens que simpatizam com abordagens que fogem do estado, do conflito internacional e da geopolítica clássica. É uma fase de otimismo diante dos avanços intelectuais que tendem a avançar na medida em que se abrem para as interseções.
Bacharel em Relações Internacionais e Ciências e Humanidades, professor Roseira complementou a teoria do professor Messias ao apresentar o lado bom da popularização da geopolítica. Ele defende que, ao penetrar e invadir outros campos do conhecimento, a ciência passa a despertar interesse em mais pessoas.
- A geopolítica se tornou absolutamente popular. Atualmente, ela está na internet, no YouTube, nas ciências políticas, nas relações internacionais. Ou seja, ela escapou um pouco do âmbito da própria geografia, e isso é bom para os geógrafos, pois as pessoas têm mais disposição para estudar o tema do que tinham antes.
O palestrante ressaltou, no entanto, que a expansão da geopolítica para além da disciplina apresenta reveses. Fruto da frouxidão do debate teórico e metodológico, apontou o professor, o termo aparece comumente associado a generalizações sobre políticas de poder e, se torna “praticamente um slogan”.
O professor Hélio concebeu uma análise geopolítica das ciências militares. Ele afirmou que tencionar diálogo entre a comunidade acadêmica e a defesa é crucial para entender os princípios básicos da geografia, que são o Estado, poder e território.
Geografia política de regiões brasileiras
O primeiro dia de palestras ocorreu no dia 8 de abril, e o principal tema foi a Amazônia. O encontro foi mediado pelo professor e coordenador do Curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), e os convidados foram a doutora em Geografia pela Universidade de São Paulo (USP) e professora Altiva Barbosa, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), o professor Ricardo Gilson, da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), e o professor Aiala Couto, da Universidade Estadual do Pará (UEPA).
Altiva aproveitou o seminário para discutir sobre a fronteira social e a política no contexto atual de Roraima. Ela fez uma retrospectiva geopolítica da ocupação do território desde os anos de 1940 até 2021, citou a abertura de estradas, o programa de integração nacional (PIN) de 1970, a pavimentação da rodovia BR-174, entre outros. O professor Gilson trabalhou com a gestão do território e a escala das disputas territoriais na Amazônia. Ele trouxe conceitos e dados sobre a geopolítica, o agronegócio e o mercado de terras, sobre as áreas protegidas e territórios culturais, e expôs as consequências negativas desta exploração de território, com as queimadas, a pilhagem ambiental e o que ele qualificou como “agrobandidagem”.
Couto conversou sobre a geopolítica do crime organizado na Amazônia. O professor fez uma análise do aumento do narcotráfico na área, principalmente do aumento da participação de organizações criminosas da região Sudeste do Brasil no Norte, além da ligação destes grupos com grilagem de terras, junto a outras atividades ilegais.
A região Nordeste foi o assunto do segundo dia de debates, em 15 de abril. A mesa-redonda foi mediada pelo professor Caio Maciel, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e coordenador do Laboratório de Estudos Sobre o Espaço, Cultura e Política (LEQgeo), e contou com a participação da professora aposentada Tania Bacelar de Araújo, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que é sócia da CEPLAN-Consultoria Econômica e Planejamento, e do professor Alcindo José de Sá, também da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), doutor em Geografia pela Universidade de São Paulo (USP).
A professora Tania falou na palestra sobre o consórcio de governadores do Nordeste e sobre os desafios e perspectivas durante e após a pandemia. Ela relatou a guerra e crise fiscal, a crise econômica que chegou à região após 2015, e ainda comentou sobre a criação do consórcio Nordeste entre governadores no ano de 2019, com o objetivo de construir uma agenda comum macrorregional.
O professor José de Sá aproveitou para discutir sobre necropolítica e necropoder, com aproximações ao contexto atual do Brasil. Ele citou as disparidades econômicas, o aumento de discursos políticos extremistas e excludentes a uma parte da população.
Os professores Elisa Pinheiro de Freitas, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), e Agripino Souza Coelho Neto, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), participaram do terceiro dia de palestras, em 22 de abril , cujo tema foi os trabalhos desenvolvidos por professores da região Centro-Sul do Brasil. A discussão foi mediada pelo professor Marcos Mondardo, da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Mato Grosso do Sul.
A professora Elisa apresentou na palestra o tema dos incêndios no bioma Pantanal e as implicações geopolíticas para o Brasil no contexto internacional. Ela aproveitou para realizar uma retrospectiva dos tópicos com que já trabalhou e a fizeram se interessar especialmente pelo Pantanal, como as regiões de fronteira, a questão agrária, os movimentos socioterritoriais, as políticas voltadas para a educação pública.
Ela também apresentou gráficos e dados sobre a preservação do bioma Pantanal, sobre o aumento de problemas ambientais, a redução de recursos financeiros para instituições fiscalizadoras do meio ambiente, questões que, segundo ela, aumentaram a partir do crescimento do neoliberalismo da extrema direita. Ela destacou as consequências destas ações com a mudança da imagem externa do país, uma ameaça internacional para as grandes potências como os Estados Unidos.
O professor Coelho levou ao encontro a discussão sobre estratégia-rede, políticas de escala e territorialidade: por uma geografia política das ações coletivas. Ele trabalhou com as seguintes ideias: a rede é mais do que uma forma organizacional composta por indivíduos, e é também uma forma de ação; a escala não se restringe a um ponto de análise e pode ser concebida como categoria da prática sociopolítica das ações coletivas. Segundo o professor, a territorialidade pode ser compreendida como estratégia geográfica acionada pelas ações coletivas para viabilizar os projetos políticos, econômicos e sociais. Para desenvolver este raciocínio, o professor fez uma proposição teórica, citou movimentos coletivos, como o movimento sindical, apresentou conceitos, exibiu exemplos de organizações regionais, e dissertou sobre o sertão brasileiro.