"O luto e a luta de mães em busca por justiça contra a violência estatal” foi o tema da Aula Inaugural do Departamento de História, no dia 27 de março. Ana Paula Oliveira, mãe de Johnatha Oliveira Lima — morto durante operação policial na favela de Manguinhos, Zona Norte do Rio de Janeiro, aos 19 anos —, protagonizou um encontro repleto de emoção e inspiração. Ela é co-fundadora e coordenadora do Movimento Mães de Manguinhos, que reúne mulheres pobres, por meio de uma dor comum: o assassinato dos filhos.
A palestra foi mediada pela coordenadora de graduação, professora Larissa Corrêa, que apresentou para as pessoas presentes o novo diretor do departamento, professor Henrique Estrada. Para os docentes, a aula reafirma o compromisso com a extensão. Larissa enfatizou a importância da presença de Ana Paula, pela trajetória inspiradora e repleta de ensinamentos que ela carrega.
— A partir de uma experiência de extensão sobre cidadania, movimentos sociais e lutas por direito que eu participo, com professoras de outros departamentos, tive o privilégio de conhecer a Ana Paula. A figura dela mexe com a gente, em toda força e potência das mães que esta mulher representa. E foi no espírito da PUC-Rio de se abrir cada vez mais à comunidade que trouxemos a Ana para este momento de aprendizado e acolhida.
Presente e passado se alternavam no centro da discussão. Foi preciso conhecer o processo de transformação ao qual aquela mãe foi submetida, a partir da morte do filho, para entender o poder das memórias que ela compartilha. O bom combate de Ana Paula é um convite a mais pessoas se unirem ao movimento e partilharem da causa. Para ela, o engajamento coletivo representa a construção de um país mais digno e justo.
A coordenadora do Mães de Manguinhos confia que romper o ciclo de violência é a melhor forma de reparar os danos causados pelos excessos do Estado. Ressignificar a dor não é uma questão de escolha para estas mães, mas sim de necessidade.
— A violência do Estado não parou no meu filho. Não temos direito ao luto, temos que ser investigadoras, advogadas. Na luta encontrei uma forma de continuar exercendo minha maternidade. Meu filho transformou minha vida tanto na chegada, quanto na partida. Eu só queria gritar o quanto estava doendo, mostrar o que fizeram com o meu filho, e encontrei o porquê nas ruas, ouvindo outras mães e lutando, acima de tudo, pela vida.
Ana Paula estabeleceu a urgência de inverter o caminho natural e apontou: o Estado e as universidades devem ir ao encontro às favelas, não o contrário. Ainda de acordo com a mãe de Johnatha, enxergar as comunidades como um lugar que produz conhecimento é mais uma mudança necessária.
O jovem foi morto com um tiro nas costas na rua onde fica a casa da família, por volta das 16h30 do dia 14 de maio de 2014, ano em que o Brasil sediou a Copa do Mundo. Com os olhos da comunidade internacional para o país, as investidas da polícia nas comunidades se intensificaram.
— As festas nos estádios de futebol não valem as lágrimas das favelas. Por isso é importante fazer uma formação política no seio das famílias. Não acredito no sistema judiciário, mas no movimento que eu faço parte. A luta vai levar ao fim da impunidade e um dia nossos direitos serão respeitados.
Ao longo da aula, Ana criticou ainda a abordagem das mídias tradicionais. Segundo ela, os veículos costumam repercutir apenas as versões policiais e acabam por "desumanizar para legitimar a barbárie”. Durante o bate-papo, foi exibido um trecho de um documentário produzido pelo jornalista Patrick Granja, do jornal independente Nova Democracia, sobre a operação policial que vitimou o filho da palestrante e o início da luta dela por justiça. O ato “Mães de Maio”, em 2015, também figurou na produção do repórter em meio aos exemplos de resistência e militância.