Vencedor do Prêmio Margarida de Prata da CNBB de 2001, o filme Bicho de Sete Cabeças, de Laís Bodansky, é uma ficção inspirada no livro autobiográfico de Austregésilo Carrano, Canto dos Malditos. O drama conta a história do jovem Neto, que é internado em um hospital psiquiátrico quando o pai descobre um cigarro de maconha em seu casaco. No terceiro dia do Muticom, a obra de Laís Bodansky foi alvo de diferentes análises e interpretações em debate, no auditório do RDC.
Para Bruna Brasil, representante do grupo de pesquisa Sagrado Cinema da PUC-Rio, o longa é uma denúncia de como é tratada a questão manicomial no Brasil e problematiza a comunicação entre pais e filhos. A professora do Departamento de Comunicação Social Cássia Chaffin também integrou a mesa e comentou sobre a experiência pessoal, como psicóloga e jornalista, na equipe da TV Pinel, projeto realizado no Instituto Phillipe Pinel, no Rio de Janeiro. “Esse período mudou completamente a minha vida, foi então que comecei a pensar no ser humano”, contou.
A professora propôs uma reflexão sobre o modo como as diversas possibilidades de interpretação determinam certa realidade. Segundo ela, a partir do momento em que se colocam palavras, recorta-se uma representação do real. “A diretora Laís optou por se inspirar numa história, ou seja, ela construiu um retrato da realidade, a sua própria interpretação do real”, disse. Cássia Chaffin destacou a relação simplista exposta no filme, do pai como algoz e o filho no papel da vítima. “Essa relação é muito mais complexa do que somente culpar o pai. Além disso, vê-se negar a psicose como se ela fosse só produzida pelo processo de internação e não pelo próprio indivíduo”, afirmou. A professora adaptou a visão da psicanálise ao contexto de Bicho de Sete Cabeças e citou Freud como um rico autor capaz de teorizar as questões em família.
As palestrantes lembraram as recentes manifestações em defesa da livre expressão, no Rio de Janeiro, e relacionaram o dilema da liberdade com a vida do personagem Neto. “A liberdade pura é destrutiva. O lugar da figura do pai é a de dar limites e isso provoca ódio”, explicou a professora Cássia Chaffin, “Eu vejo, hoje, muitos jovens indo às ruas pela defesa da liberdade, da liberação da maconha. O que as pessoas querem é satisfação. A droga proporciona essa satisfação, um prazer imediato. Eu penso: por que não ir às ruas pedir aulas de música para crianças na escola? A música também proporciona satisfação. Mas o prazer com as drogas é mais fácil, mais rápido”, completou.
Plantão - Edição 244 - Especial Muticom