a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição da Gávea
(Foto: Acervo Núcleo de Memória da PUC-Rio/Nilo Lima)
Um desses detalhes, a Igreja da Nossa Senhora da Conceição da Gávea, localizada no início da rua Marquês de São Vicente, foi focado pelas lentes do fotógrafo voador a duras penas. Emparedada e ensombreada por edifícios por todos os lados, a igreja some na paisagem sobre a qual se destacava imponente, segundo a iconografia do século XIX e início do XX.
Sobre essa antiga paisagem, de fato rural e distante do que era o núcleo urbano da cidade do Rio de Janeiro até o final dos anos 1800, a Igreja tem muito a nos contar. Pela sua posição fora de esquadro em relação à testada da rua evidencia que esta, antes de ser logradouro de perímetro urbano, era um caminho colonial de sugestivo nome, o da Boa Vista, aberto em terras do Engenho de Nossa Senhora da Conceição da Lagoa para acesso aos limites ocidentais da sesmaria.
Através do nome herdado, a igreja também nos dá pistas valiosas para se conhecer as formas espaciais históricas que marcam, como expressões dos processos sociais, a trajetória de urbanização de uma cidade. A capela foi construída nos anos 1850 para atender à crescente população desta parte longínqua da freguesia de São João Batista da Lagoa. A nova edificação substituía a antiga capela rural erigida por Diogo de Amorim Soares no século XVII e dedicada à Nossa Senhora da Conceição, orago desde então de seu engenho. Em 1873, a capela recém construída foi elevada à igreja matriz e sua padroeira batizou a nova Paróquia de Nossa Senhora da Conceição da Gávea.
A chegada do bonde, nos mesmos anos 1870, a construção de fábricas e de vilas operárias na virada do século, a inauguração do Jockey Club do Rio de Janeiro, nos anos 1920, a instalação do campus da PUC-Rio, iniciada nos anos 1950 e a explosão imobiliária ocorrida a partir dos anos 1970 são alguns exemplos do processo de ocupação urbana acelerado que norteou o crescimento da Gávea e de resto da cidade do Rio de Janeiro durante o ultimo século.
Tão somente por sua permanência como fragmentos de formas espaciais do passado atualizados e reconhecidos por novas funções urbanas e sociais, a igreja matriz, assim como o traçado do antigo caminho, os trilhos do bonde visíveis sob o asfalto gasto da Praça Santos Dumont, os muros grafitados do Jockey ou as palmeiras do arboreto do Jardim Botânico explicitam que o tecido urbano é construção coletiva e histórica. Expressam em sua materialidade cenários vivos e dinâmicos que compõem uma cidade. A seus habitantes, cabe não perder de vista o seu panorama.
Silvia Ilg Byington
Núcleo de Memória da PUC-Rio
Edição 247