Alvarenga, desembargador Luis Gustavo Grandinetti e Leise Taveira
Um estudante volta para casa às 2h e justifica o atraso por ter ficado na casa de um colega estudando. Será que ele realmente ficou estudando até altas horas? A maioria diria que não, pois o ser humano tende a condenar as outras pessoas, de acordo com os especialistas presentes na palestra Julgar – Uma Tarefa Difícil para a Justiça, a Psicologia e a Mídia, realizada no dia 14 de setembro. Ou pelo menos, de imediato, a tendência é declarar culpado alguém envolvido numa experiência fora da rotina de quem julga. Mas os estudiosos reconheceram que é muito difícil julgar, porque se trata da atividade de se aproximar da verdade a partir de testemunhos parciais.
Os professores de Comunicação, de Direito e de Psicologia afirmaram que não existe imparcialidade, mas que é possível fazer um julgamento neutro, mesmo sendo a favor ou contra de algo. A questão é buscar uma visão total de um acontecimento, já que mesmo o modo como os fatos são narrados induz a um determinado juízo. É preciso ter como princípio a presunção de inocência, segundo a qual a pessoa não é culpada até que haja prova do contrário, e dar ao acusado o direito do contraditório, isto é, a chance de se manifestar sobre as acusações. E ter em mente que as testemunhas são parciais, inclusive os especialistas e as autoridades públicas. A professora Victoria Sulocki, do Departamento de Direito, afirmou que devemos considerar a pessoa em julgamento um ser dotado de direitos, afetos e desejos.
– Precisamos ver outro como um ser humano. A pessoa que é julgada não pode ser encarada como objeto de prova, de notícia e tampouco de estudo. É preciso ter empatia – disse Victoria, que também é advogada.
O desembargador Luis Gustavo Grandinetti, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, afirmou que estamos julgando o tempo inteiro e que a maioria dos julgamentos ocorre no plano do inconsciente – é automático. Para ele, o problema é quando o julgamento interfere na vida de outros cidadãos. O desembargador afirmou que é preciso investigar o próprio inconsciente e cultivar o hábito de duvidar. Ele disse que buscamos na acusação uma forma de ficar em paz com nós mesmos.
– Deixe o povo julgar que ele agirá conforme o criminoso – disse Grandinetti, em referência aos atos de vingança e irrefletidos da maioria da população.
A professora Lidia de Alvarenga, do Departamento de Psicologia, destacou que as testemunhas podem dar depoimentos imprecisos. Segunda ela, isso ocorre devido às falhas da memória, ou seja, não são intencionais. Lidia afirmou que um depoimento pode mudar ao longo do tempo por causa de lembranças distorcidas. Além disso, a verdade psíquica faz com que a memória bloqueie experiências traumáticas.
– Interpretamos os fatos a partir do que somos e sentimos, mas podemos julgar com justiça se não nos deixarmos influenciar – disse Lidia de Alvarenga.
A professora Leise Taveira, do Departamento de Comunicação, disse que o jornalista busca ouvir as autoridades públicas, mas destacou que elas podem estar empenhadas em defender uma tese. Uma das organizadoras da palestra, Leise destacou que o jornalismo é uma atividade muito exposta aos erros devido à pressão do tempo de publicação e da concorrência. Por isso, os profissionais da imprensa devem estar bem preparados. Leise e Leonel de Aguiar, coordenador de graduação do Departamento de Comunicação, defenderam a exigência do diploma de jornalismo para o exercício da profissão. Leonel lembrou uma das teorias do jornalismo, segundo a qual ele é uma forma de conhecimento da nossa realidade. De acordo com essa teoria, o jornalista deve produzir um relato verdadeiro sobre o mundo – então precisa julgar bem.
Edição 261