Ideia no papel há cerca de um ano e meio, o Coletivo Madame Satã marcou o início de suas atividades convidando os militantes Aika Cortez, Indianara Siqueira, Shelida Ayana e David Miranda para a mesa Acesso, segurança e permanência para LGBTs: desafios enfrentados em universidades. Com o apoio dos coletivos da Vila e Nuvem Negra, do Departamento de Ciências Sociais e do Programa de Educação Tutorial de Geografia, o grupo buscou propostas para a inclusão, a representação e a segurança de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros (LGBTs) em instituições públicas e privadas de ensino superior. Cerca de 60 espectadores acompanharam o encontro, na terça-feira, dia 27 de outubro, nos Pilotis da PUC-Rio.
O estopim para a criação do Coletivo foi, lembram os idealizadores, o crime de homofobia contra o estudante Diego Vieira Machado, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), encontrado morto no dia 2 de julho de 2016, próximo ao alojamento da universidade, na Ilha do Fundão. Mais de 130 LGBTs foram mortos desde o início de 2016 no país, segundo registros do Disque 100 para Direitos Humanos.
Para o jornalista e militante da causa LGBT David Miranda, é preciso promover mais “visitas de conscientização” nas escolas, “onde o preconceito começa”. Vítima da discriminação ainda no colégio, interrompeu os estudos e só os retomou aos 21 anos. David destacou também a importância do meio universitário para o desenvolvimento da visão crítica e a expansão de horizontes, condições essenciais para dirimir preconceitos. Neste sentido, considera um equívoco a possibilidade de se retirar do currículo escolar disciplinas como sociologia e filosofia, como havia sido recentemente proposto na reforma do Ensino Médio. Pondera ainda:
– Como formar pessoas tolerantes sem um ambiente que possibilita a visão crítica e o questionamento?
Idealizadora do projeto Prepara, Nem, que apoia a preparação de transexuais e travestis para a prova o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), Indianara Siqueira também considera o ambiente escolar muitas vezes opressor perante as minorias. Defende ainda que “professores também devem aprender a receber essas pessoas (da comunidade LGBT) dignamente”.
A estudante de pedagogia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Shelida Ayana, por sua vez, destaca a necessidade de ampliar o acesso do grupo LGBT, “especialmente transexuais”, às universidades. Revelou ainda que entre os 5 mil alunos matriculados na Universidade, apenas nove, além dela própria, são transexuais,
– Quando os LGBTs ingressam em uma universidade, muitas vezes não conseguem completar o curso por falta de saúde mental. A repressão é muito grande, a violência não é apenas física, mas também verbal e psicológica. Se reflete, por exemplo, na proibição do uso dos nomes sociais (diferentes daquele registrado na certidão de nascimento) e ofensas de alunos e professores – completa.
A estudante da Universidade Federal Fluminense (UFF) e rapper Aika Cortez aposta na música e na cultura como instrumentos para combater a discriminação e promover a inclusão:
– A música representa uma visibilidade e um poder muito grandes. É um espaço de transformação. É a minha forma de levar o debate para dentro do hip-hop, um ambiente ainda muito machista e com pouca presença LGBT. É a minha forma de militância, expressão e resistência.
Aika defende ainda que já “estar ocupando o espaço da universidade já é uma forma de resistência”. Avalia também que o banheiro sem gênero é um avanço dentro de sua luta.
Na agenda de debates do Coletivo, prevalecem, além da sexualidade, temas como raça, religião e gênero.