– No Dia dos Namorados de 2000, eu saí com a Geísa [Gonçalves, vítima fatal do episódio] para trocar um cheque no banco e, no caminho, o ônibus foi seqüestrado. Foram cinco horas de terror. No começo, a gente achou que todo o mundo ia sair bem, mas conforme o tempo foi passando, ele [Sandro do Nascimento, o seqüestrador] foi ficando mais desesperado. A partir daí, eu comecei a passar mal, contou.
Damiana teve um derrame no ônibus. Ela lembrou que Geísa – com quem tinha um relacionamento de mãe e filha – gritou, desesperadamente, quando viu que Damiana passava mal. "Pelo amor de Deus, não mate a minha mãe", implorava ao seqüestrador. Segundo Damiana, ele escutou o pedido, mas exigiu que Geísa fosse até a janela do ônibus para negociar com os policiais. "Como o que ele queria não foi atendido, começou a aterrorizar todo o mundo. Apesar de todo o desespero, eu jamais esperava que a vítima fosse a minha filha. Ele tinha dito que não mataria ninguém da Rocinha", contou.
Quando Geísa foi morta a tiros, no desfecho da tragédia, Damiana não estava mais no local do seqüestro. Ela havia sido removida do ônibus momentos antes, devido a seu estado de saúde. Só soube da morte da amiga e "filha" no dia seguinte, deitada na cama do hospital. "Se eu estivesse em sã consciência, jamais teria deixado ela ali", enfatizou. "Nunca mais vi a Geísa. O corpo foi levado para o Ceará, e lá ela foi enterrada sem eu poder me despedir", lamentou Damiana. As duas costumavam passar o dia juntas. Eram vizinhas e davam aulas de artesanato para crianças na mesma escola.
Depois da tragédia, Damiana ficou três anos sem andar e quase seis sem falar. Durante esse período, tentou o suicídio:
– Para mim, a vida não existia mais. Eu queria morrer. Mas Deus sabe de todas as coisas, e agora estou aqui.
Quem vê Damiana hoje, não imagina que ela viveu experiências tão traumáticas. Comunica-se perfeitamente e consegue caminhar, ainda que com o auxílio de uma muleta. Trabalhou na Fevuc e pretende participar de todos os bazares promovidos pela PUC, como fazia antes do seqüestro. Anos atrás, Damiana ingressou no projeto Clube do Cidadão, que teve o seu primeiro núcleo criado pelo padre Laércio Dias de Moura, antigo Reitor da Universidade.
Damiana começou a se recuperar a partir do nascimento de sua neta Yasmin, hoje com 5 anos, portadora de deficiência física. "Quando vi como ela lutava para viver, também voltei a lutar para viver", disse Damiana, que vê muitas semelhanças entre Geísa e a neta.
– Ela nasceu com as costas abertas, e a Geísa morreu com tiros nas costas. Achei muita coincidência. Sei que pode parecer maluquice, mas, na minha cabeça, a Yasmin é a Geísa, disse.
Depois da conversa, e da entrevista, e da matéria, fiquei pensando em quantas histórias – tão incríveis e comoventes como a de Damiana – há na vida dos que transitam diariamente pela PUC. E me senti satisfeita por poder tornar público ao menos um relato.
Edição 188