A geolocalização é um recurso já usado pela maioria dos aplicativos, independente das diferentes categorias. Até os games, que antigamente eram jogados de forma individual, agora contam com serviços de localização para integrar os usuários. Essa mudança, para o professor Christian Licoppe, da Télécom ParisTech, na França, alterou a forma como os membros de uma sociedade se relacionam.
O professor explica que, antes da popularidade da localização, as outras pessoas eram “estranhos” que cruzavam os nossos caminhos. Porém, hoje em dia, com um grande número de usuários conectados na internet, Licoppe acredita que o conceito de estranhos deu lugar aos “pseudoestranhos”, ou seja, pessoas que nunca se viram pessoalmente, mas já se conhecem, mesmo que de forma muito superficial.
Essa teoria foi baseada em um estudo realizado pelo próprio professor em Paris, inspirado pelo livro An Attempt at Exhausting a Place in Paris, de Georges Perec. A obra relata o que o autor vê durante três dias sentado em uma cafeteria na praça Saint-Sulpice, também na capital francesa: as pessoas, os símbolos, as construções e a rotina do local. Licoppe sentou-se no mesmo lugar pelo mesmo período de tempo, porém, ao invés de apenas observar o que ocorria no seu campo de visão, utilizou o Foursquare, um aplicativo de recomendações onde os usuários dão dicas sobre as experiências vividas em um determinado espaço, como restaurantes ou igrejas.
A partir desse experimento, o professor percebeu que as pessoas passaram a ser estranhos familiares, não são apenas anônimos que se cruzam na rua. Elas agora são indivíduos que já sabem o básico sobre o outro, como o nome, idade, localização e gostos pessoais. Segundo Licoppe, as dicas dadas nesse aplicativo também ajudam a revelar as preferências de cada um e como é o comportamento delas baseado nas experiências relatadas. Contudo, conforme o professor, a localização muitas vezes é transmitida a outros usuários de forma instantânea, o que possibilita o rastreamento da conta e pode levar a um caso de sequestro, por exemplo.
- A superexposição também trouxe problemas para a segurança pessoal. Com um maior compartilhamento de informações, se tornou mais fácil acompanhar a rotina de outra pessoa, o que pode ser usado para fins negativos. O stalker, como são chamadas essas pessoas que procuram de forma exagerada sobre a vida de outra, agora tem mais embasamento para a observação – explica o professor.
Licoppe afirma que os aplicativos de relacionamento impulsionam essa familiarização de anônimos. Ele explica que, nesses perfis, fica visível a qualquer usuário informações que antes só eram conhecidas se houvesse um contato físico, como nome, idade e gostos pessoais. O professor define a sociedade moderna como “The Urban Metropolis” (A Metrópole Urbana, em tradução livre), onde todo mundo é pseudo-estranho, e não mais apenas desconhecidos.
Christian Licoppe esteve na Universidade no dia 6 de outubro, em palestra para organizada pelo Departamento de Comunicação Social. Ele é sociólogo, pesquisador de Tecnologias da Informação e Comunicação e diretor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Télécom ParisTech. Licoppe é especialista no tema da Interação Humano-Máquina e estuda sobre mobilidade urbana e vigilância digital.