Estudantes discutem 'Tropa' com Padilha e Pimentel
05/11/2007 16:30
Thomas Freund / Arte: Diogo Maduell

Debate abordou temas como tortura, pirataria, direitos humanos e ideologia

O debate mal havia iniciado e José Padilha, diretor de Tropa de Elite, estava com as mãos entrelaçadas. Seus dois dedos indicadores apontavam para o nariz, naquilo que lembrava a imagem de uma arma voltada para si. Com fisionomia preocupada, talvez estivesse antecipando as contradições, dúvidas, contestações e críticas que iria passar pelas próximas três horas. Em companhia de Rodrigo Pimentel, ex-capitão do Bope, de André Batista, capitão da Polícia Militar que inspirou o personagem Matias no filme, e de Marcelo Freixo, deputado estadual do PSol, ele discutiu temas como tortura, pirataria, direitos humanos e ideologia com os estudantes. O encontro foi no dia 19 de outubro, no auditório B6, no 6º andar da Ala Frings.

A maioria dos estudantes presentes era do curso de Direito, que antes do debate assistiram à exibição do documentário Ônibus 174, também dirigido por Padilha. Formado em Administração de Empresas pela PUC, o diretor fez questão de explicar que cinema não é etnografia e não pretende, portanto, esgotar um assunto. Esclareceu que as idéias de um personagem não são necessariamente as do diretor e rechaçou qualquer discussão ideológica em Tropa de Elite.

– Já fui acusado de ser radical, de esquerda e de direita. Primeiro por fazer um documentário sob a ótica de um criminoso (Ônibus 174) e, depois, sob o ponto de vista de um policial (Tropa de Elite). Há uma discussão se o filme é de esquerda ou de direita, mas ele não tem questão ideológica nenhuma. Não defendo tortura nem o massacre de traficantes, assim como não acho a platéia fascista. Deixo claro no filme, através da síndrome de pânico do Capitão Nascimento, que a violência não se sustenta. Não vejo, enfim, a glorificação da tortura no filme, disse.

Opinião diferente tem Marcelo Freixo, deputado estadual do PSol. Afirmou que, em termos pedagógicos, a população perde muito com Tropa de Elite. Para ele, sociedade segura não seria a que tem execução, tortura e Bope. "Se for assim, nosso futuro é que vai ser osso duro de roer", disse. Freixo ressaltou ainda o momento dramático, de genocídio e massacre em nossa cidade, lembrando que a polícia do Rio de Janeiro é a que mais mata no mundo inteiro. O deputado falou ainda sobre o direcionamento da violência.

– O genocídio vai para jovens negros, sem família e sem dinheiro. Atinge essas pessoas. A impunidade está no Senado, não na favela. A justiça tem classe. Há um posicionamento político de manutenção da ordem. Transformamos vítima em algoz porque a sociedade se sente mais segura assim. O verdadeiro fascista é o governador Sérgio Cabral. Afinal, o que mudou depois da operação no Morro do Alemão, onde dezenove pessoas foram executadas? Isso é ineficaz, afirmou.

Rodrigo Pimentel, ex-capitão do Bope e roteirista de Tropa de Elite, denominou o curso feito para a entrada de novos policiais na corporação como de iniciação e de passagem. Ele manifestou seu orgulho pela dignidade do Bope e causou polêmica ao afirmar que os policiais são meros executores do Estado.

André Batista, que também compunha a mesa no debate, foi membro do Bope entre 1996 e 2001 e é formado em Direito pela PUC. Foi ele quem inspirou José Padilha a criar o personagem André Matias no filme. Mais descontraído, Batista também falou com seriedade. "Do jeito que as coisas estão, não dá para ficar. Se tiver que morrer mais pessoas do lado de lá (nos morros), então que seja. A situação está crítica. Se estiver voltando para casa, for abordado por um criminoso e ele descobrir na minha carteira que sou policial, estou morto", disse.

O debate continuava, e cada vez mais quente. Os convidados expunham seus mais variados ângulos de visão, e a platéia de estudantes ficava cada vez mais inquieta. Uns defendiam a tortura, a invasão nos morros cariocas e a ação do Bope. Outros tinham um discurso mais ameno e de repulsa à violência excessiva nas favelas. Um estudante mais exaltado acusou Padilha de denegrir a imagem da PUC e logo ouviu a resposta do diretor: "A PUC é uma faculdade qualquer que serve como locação. Em nenhum momento usei o nome da Universidade no filme. E, olha só, meu diploma é daqui e com muito orgulho."

 

Edição 193