Anos 90: uma década conectada
15/05/2008 16:52
Sarah Lemos

Brasil Tetracampeão, Chaves, Google, Cavaleiros do Zodíaco, Caras Pintadas, ovelha Dolly, Central do Brasil e É o Tchan. Teve de tudo na última década do Século XX, relembrada no Almanaque Anos 90, do jornalista Silvio Essinger, ex-aluno da PUC. O desencanto com a política e a revolução tecnológica do período criaram as raízes para a geração dos anos 2000.

No tempo em que a novela Malhação era na academia, o cabelo armado era moda, o Tamagoshi fazia a cabeça das crianças, Lula ainda era oposição e É o Amor, de Zezé de Camargo e Luciano, embalava os romances. Assim foram os anos 90, que mal passaram e todo mundo já começou a sentir saudade. Inspirado nessa nostalgia e nos livros de 80 e 70, o jornalista e ex-aluno da PUC Silvio Essinger lançou o Almanaque Anos 90, pela Editora Ediouro, que reúne curiosidades e lembranças do período.

 

Primeira década totalmente democrática, depois de vinte anos de Ditadura Militar, os anos 90 derrubaram principalmente o autoritarismo estético. Na música, o cenário foi democrático. Todos tiveram vez: axé music, pagode romântico, sertanejo, lambada, boy bands, grunge, funk melody e até figuras inusitadas como Tiririca e Mamonas Assassinas.

 

– Deixou-se de marginalizar certos estilos, todos tiveram o mesmo destaque. O Nirvana é símbolo disso, trouxe o subterrâneo dos anos 80 e colocou para o primeiro plano. Ao mesmo tempo, surgiam tipos diversos de tribos com que o jovem poderia se identificar. Nos anos 70 você podia ser hippie, militante de esquerda ou careta. Nos 90, abriu-se essa cartela de grupos urbanos, conta Essinger.

 

A cantora Fernanda Abreu, carioca sangue bom e destaque da geração pela junção de samba e funk, conta que nessa época surgiram as misturas mais criativas.

 

– Foi uma década privilegiada em termos de novos talentos musicais, revelando artistas incríveis. A fusão da linguagem pop internacional com os ritmos brasileiros deu o tom. Marcelo D2 misturou samba com hip-hop, Carlinhos Brown mesclou MPB, samba e reggae, já Chico Science e Nação Zumbi juntaram rock e música eletrônica com ritmos regionais, como maracatu e coco-de-roda, diz Fernanda.

 

O acesso à informação trouxe a possibilidade de se recombinar o que já existia. “Com a tecnologia, passou-se a ter acesso a obras do passado, podendo ver, rever e misturar referências. A melhor coisa do período foi a reciclagem de outras décadas. Teve de tudo, mas nada de novo”, afirma Essinger. Mas há os que vêm desvantagens na tecnologia. Lucas Issa, dono da comunidade Brinquedos Anos 80 e 90, do site de relacionamentos Orkut, prefere os desenhos de antigamente, como Caverna do Dragão e He-Man. “Os de hoje têm muita produtividade visual e pouco conteúdo. Os dos anos 90 eram mais simples, porém mais gostosos de assistir”.

 

Na era da tecnologia, as ideologias são deixadas de lado, já que, com a queda do Muro de Berlim, caíram por terra os conceitos de esquerda e direita, que marcavam as identidades dos jovens, de 16 a 24 anos, até então. “Houve um certo desencanto com a política. Os partidos se fecham para novas idéias e o que passa a ser mais importante é a imagem do candidato, definida pelo marketeiro, desde a cor da gravata ao abraço em um popular”, afirma o diretor do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio, professor Ricardo Ismael.

 

O jovem de qualquer época se motiva a se envolver nas questões públicas pela possibilidade de transformação. Na última década do século XX, a juventude percebeu que, ao não influenciar nas decisões dos partidos, a saída era se engajar em movimentos culturais e sociais, como o Greenpeace.

 

– Nos anos 80, achava-se que com a vitória de um presidente eleito pelo povo tudo iria mudar, mas com a vitória de Fernando Collor de Mello, veio a frustração. A campanha de impeachment, em 1992, trouxe jovens para a cena política, mas a partir dali não houve grande participação política, diz Ismael.

 

O individualismo torna-se uma característica da sociedade, marcada pela realização dos interesses particulares, em detrimento da causa pública. Para Ismael, a ex-senadora Heloisa Helena é um ícone da política dos anos 90, porque não se conformou com a conquista do poder e se arriscou a fundar um partido novo.

 

– Ainda existem jovens hoje que se movem pela tentativa de um ideal que ultrapassa o mero interesse privado e individual. Recentemente, Barack Obama atraiu um grande eleitorado de jovens para a política norte-americana, acentua Ismael.

 

O cientista político acredita que é preciso haver um certo distanciamento para analisar um momento da História, uma vez que há mais envolvimento emocional com os fatos recentes. “Tendo ocorrido há mais tempo, existem mais documentos e uma melhor compreensão dos acontecimentos”, assinala Ismael.

 

 

Acontecimentos da década:

 

•A novela Pantanal, transmitida pela Rede Manchete, é sucesso de audiência
•Morre o cantor Cazuza
•Libertação de Nelson Mandela depois de 27 anos na prisão

•A MTV chega ao Brasil
•Fernando Collor de Mello assume a Presidência da República
•Criado do Sistema Único de Saúde (SUS)
•Lançamento do video game Super Nintendo
•Criado no Brasil o Estatuto da Criança e do Adolescente

 

•Segunda edição do festival de música Rock in Rio
•Guerra do Golfo
•Fim da União Soviética (URSS)

 

 

 

 

•Manifestação dos Caras Pintadas; •Fernando Collor de Mello é cassado da presidência
•Estréia no Brasil o seriado Família Dinossauro
•Massacre no Carandiru
•Organização Mundial da Saúde (OMS) deixa de considerar a homossexualidade como doença.

 

 

•Chacina da Candelária e de Vigário Geral
•Plebiscito decide que o Brasil continuará a ser uma República Presidencialista

 

 

 

 

•Morrem Kurt Cobain, Ayrton Senna e Tom Jobim
•Brasil ganha a Copa do Mundo
•Nelson Mandela torna-se o 1º presidente negro da África do Sul.
•Estréia a novela A Viagem, maior audiência da década
•Início do Plano Real

 

 

•Posse de Fernando Henrique Cardoso na Presidência da República

 

 

 

 

 

•Suposta aparição de extraterrestres em Varginha, MG.
•Morrem os integrantes dos Mamonas Assassinas, Paulo César Farias e de Renato Russo
•Nasce o primeiro animal clonado, a ovelha Dolly

O Quatrilho, de Fábio Barreto, é indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

 

 

•Cinco jovens de classe média de Brasília ateiam fogo e matam o cacique pataxó Galdino Jesus dos Santos
•Publicado o primeiro livro da série Harry Potter.
•Lançado o álbum mais vendido da década de 90, Let’s Talk About Love, de Celine Dion

•Morrem a princesa Diana, Madre Teresa de Calcutá e Chico Science

 

 

•Desabamento do Palace 2
•Escândalo entre o presidente Bill Clinton e a estagiária Mônica Lewinsky
•Morrem Tim Maia, e Leandro, da dupla Leandro e Leonardo
•Viagra é aprovado nos EUA
•Nasce o Google

 

 

 

•Fim da Rede Manchete e Início da transmissão da Rede TV
•Guerra do Kosovo
•Indepedência do Timor Leste
Central do Brasil, de Walter Salles, concorre ao Oscar de melhor filme estrangeiro

 

 

Edição 199

 

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