- É viver na frente do tempo, sempre a espera de algo, sem saber o que. É tentar fazer tarefas e não conseguir por não saber por onde começar. É planejar toda a vida antes de ter certeza e sofrer por insegurança de não acontecer o planejado. É um trem em alta velocidade, a vida passa correndo e você sente que está sendo levado sem poder fazer nada.
É dessa forma que a estudante Manuella Morais, de 20 anos, descreve a ansiedade. Diagnosticada em 2016 com o transtorno, a jovem começou a notar dificuldade em realizar tarefas cotidianas sem ser interrompida por preocupações, que levam à procrastinação. A vestibulanda de Medicina relata também uma convivência diária com a autocobrança e o medo de se sabotar.
Segundo uma pesquisa feita, em 2014, pelo Instituto de Pesquisa e Orientação da Mente, com 1.300 jovens, entre 16 e 25 anos, 67% afirmaram que sentem um nervosismo fora do controle às vésperas das provas. A psicóloga Manuela de Almeida, do Serviço de Psicologia Aplicada (SPA) da PUC-Rio, afirma que a questão da ansiedade precisa ser desmitificada e tratada como uma emoção e que lado ruim surge com a perda do controle sobre a mesma.
- A ansiedade existe, é um estado de humor extremamente necessário. Ela nos move, mas pode vir em momentos de desconforto e frustação como em momentos de alegria. A questão é quando ela vem para te paralisar, que é a patológica. Nesse momento ela te prejudica.
Com o avanço da tecnologia e da internet, a geração Z (jovens que nasceram na década de 1990) vive em um mundo onde a velocidade é a principal característica. Dessa forma, a demanda por resultados rápidos é típica, o aqui e o agora é considerado normal. Para a psicóloga e psicopedagoga Renata Fraga, do Serviço de Orientação ao Universitário (SOU) da PUC - Rio, esses jovens que resolvem tudo com um clique tendem a ser ansiosos.
- Nessa geração, conseguimos ver a questão da prontidão, do imediatismo. E isso não acontece no dia a dia, as respostas não são imediatas, o que pode gerar certa frustração porque não é assim no mundo real.
Além do imediatismo, fatores externos como a cobrança do mercado de trabalho, que exige cada vez mais dos profissionais, como cursos, línguas estrangeiras e intercâmbio, contribuem para o aumento da ansiedade. Segundo Manuela, diversas questões podem levar a um quadro preocupante de ansiedade, como por exemplo, permanecer no curso quando há empecilhos como a distância, a residência em locais de risco, a pressão familiar, manter uma bolsa e até a conciliação com um estágio ou trabalho. Ela chama atenção também para o processo de transição da escola para a faculdade, que pode mexer com o aluno.
- Existe a questão da adaptação ao meio acadêmico. A exigência muda, a responsabilidade muda de uma hora para outra. Tiram você do ambiente onde a pressão é menor e colocam no mundo adulto. A pessoa vai ter que aguentar, dar conta. E, às vezes, esse processo demora.
Renata explica que os sinais de ansiedade extrema variam para cada pessoa, entretanto, há alguns típicos sintomas quem podem ajudar na identificação. Ela aponta vários indícios que o corpo e a mente apresentam, por exemplo, a falta de concentração, o batimento cardíaco acelerado, a insônia, até o isolamento e a procrastinação. A psicóloga alerta também que é possível desenvolver outras doenças e, quando se trata de um alto grau de ansiedade, pode desencadear problemas gástricos, síndrome do pânico, depressão e cefaléia.
Para a psicóloga e psicopedagoga Deborah Sanches, do SOU-CTC, os tratamentos são longos porque buscam a eficiência e o autocontrole. Terapia, meditação, yoga e atividades físicas são algumas formas sugeridas por ela para regular a ansiedade. Porém, Deborah ressalta que questões como o autoconhecimento e a organização do tempo são essenciais para dominar a si próprio.
- Tentamos trabalhar o entendimento do que está acontecendo dentro de cada um, no ambiente, no momento, no corpo, para justamente, reconhecer os gatilhos, as causas e aprender sobre si mesmo. Muitos alunos falam de uma vida antes da faculdade, na qual eles faziam uma atividade física e agora não conseguem mais, pararam tudo e se sentem culpados por não estudarem no fim de semana. Tentamos passar que existe uma vida fora da universidade e essa vida vai beneficiar a vida acadêmica deles também. Não adianta cuidar do seu lado acadêmico e esquecer do relacional, do social.
Manuella admite que a ansiedade oferece uma fuga para não enfrentar os problemas e obrigações do dia, mas, ao mesmo tempo, há uma cobrança interna constante, durante todo o tempo, por resultados. Porém, a pedagoga e psicopedagoga Helen de Oliveira, do Núcleo de Orientação e Atendimento Psicopedagógico (NOAP), alerta para a questão da organização do tempo do aluno, afim de que haja progresso. Conforme ela, é preciso delimitar a hora de estudar, o período de sono, o momento da atividade física, pois todas essas atividades estão ligadas ao rendimento acadêmico.
Segundo Deborah, mesmo com todas essas formas de tratamento, o processo é lento e exige força de vontade. Ela explica que o ansioso sente um grande medo quando se depara com mudanças ou com situações as quais não sabe lidar, e desencadea um processo infinito e cíclico.
- O aluno avança, mas depois volta, e é necessário alertá-lo novamente, mostrar as prioridades. É uma zona de conforto desconfortável, por mais que queiram mudar, é difícil. Incentivamos pequenos passos, porque andando se vai longe e correndo, se cansa.
Ao observar essa demanda, principalmente por parte dos alunos do CTC, a Rede de Apoio ao Estudante (RAE) organizou uma Oficina de Ansiedade, que está no terceiro semestre e promove encontros para ensinar e ajudar o aluno a lidar com esse transtorno. Debora explica que o projeto tem o objetivo de trabalhar questões como relacionamento com a família e a organização do tempo.
- A oficina é psicoeducativa, mas trabalhamos o autoconhecimento, explicamos os sintomas, pensamentos, como entender o meio, passamos técnicas de relaxamento e desmitificamos a ansiedade. Possibilitamos a troca entre eles, a identificação para mostrar que eles não estão sozinhos. Fazemos uma avaliação no início e no final da oficina, de forma com que possamos acompanhar os alunos e que eles mesmos possam ver mudanças.