Olimpíada multiplica horizontes na matemática
04/05/2017 19:26
Paula Strecht

Para professor Nicolau Saldanha, ouro na Olimpíada da área há 35 anos, competições ajudam na abertura de rumos profissionais.

Professor Nicolau Saldanha em seu escritório na PUC-Rio. Foto: Isabella Lacerda

Circula diariamente no campus, à margem dos holofotes e da fama, um ouro olímpico brasileiro. Longe de ginásios, piscinas, quadras, a performance dourada veio dos livros, cadernos, salas de aula. Veio, sobretudo, de um fôlego de maratonista para processar equações, fórmulas, números. Há 35 anos esta vitalidade cognitiva fez do jovem Nicolau Saldanha o primeiro medalhista de ouro do Brasil na Olimpíada Internacional de Matemática. Uma inspiração às novas gerações de talentos a caminho da Olimpíada Brasileira de Matemática, entre setembro e novembro, com categorias que reúnem estudantes dos Ensinos Fundamental (a partir do 6º ano), Médio e Universitário de instituições públicas e privadas do país.

Aos 52 anos, quase 30 dedicados à vida acadêmica na PUC-Rio, ele conserva o tônus intelectual e a paixão pela matemática decisivos naquele desempenho histórico. Seguem decisivos para cultivar novos caminhos, novos olhares na área. O ouro olímpico, conta Saldanha, lhe deu a confiança necessária para seguir a carreira científica. Doutor pela Universidade de Princetin – um das quatro mais antigas dos Estados Unidos, na qual o físico alemão Albert Einstein lecionou nos anos 1950 –, o ex-campeão acredita que, "com um pouco mais de incentivo", a matemática seja vista como "algo bonito e divertido".

Diversão provavelmente não faltou ao atleta da matemática nas três olimpíadas das quais participou. Saldanha disputou a primeira e a segunda OBM’s (Olimpíada Brasileira de Matemática), em 1979 e 1980, respectivamente, e a IMO (Olimpíada Internacional de Matemática), na qual foi premiado com medalha de ouro. A precocidade se repetiu no meio acadêmico: antes dos 20, já lecionava. Graduado e mestre em Matemática pela PUC-Rio, ele lembra que "sempre teve aptidão e facilidade para a disciplina":

– Sempre gostei de matemática, e só isso já bastou. Mas tudo à minha volta conspirou para que eu trilhasse o meu caminho. Sempre tive facilidade com o tema e o apoio das pessoas ao meu redor.

Entusiasta de olimpíadas do gênero, ele se empenha em mostrar aos participantes que "a matemática não é uma disciplina mecânica". Diferentemente de provas rotineiras de colégio, esclarece o atleta dos números, as questões dessas maratonas olímpicas estão vinculadas à criatividade. "Ou seja, devem exigir que o aluno pense e não apenas reproduza", ressalta.

Saldanha hoje empresta o talento e a experiência de craque olímpico, dourados em três dêcadas de carreira universitária, para atuar também como um embaixador das novas fronteiras da matemática. Pois a maioria dos jovens do Ensino Médio, argumenta ele, ainda "não sabe que existe a possibilidade de se seguir uma carreira na matemática". A Olimpíada, segundo o professor, "ajuda a abrir os olhos em relação a isso":

– Um dos benefícios dessas olimpíadas é mostrar que há outras alternativas além da Engenharia, por exemplo. A Olimpíada serve também para descobrirmos talentos. Entendo que, além de gostar da profissão, é necessário um dom para exercê-la. Com a medalha, pude perceber que eu fazia aquilo bem.

Segundo também o professor de Matemática da PUC-Rio Carlos Tomei, que há 25 anos trabalha lado a lado com Saldanha, as principais características do amigo podem se resumir em três palavras: generosidade, modéstia e diversão. 

– O Nicolau é brilhante, e tem um coração enorme. É a pessoa com a maior integridade intelectual que conheço. Tem uma sobriedade admirável. Sem dizer que é extremamente discreto. Mesmo tendo lecionado a primeira aula aos 19 anos, jamais enche a boca para falar dele próprio.

As palavras do colega de PUC ecoam na modéstia com que Saldanha recorda o ouro pioneiro e nos sonhos com voos mais altos na matemática no Brasil. Gostaria que os pais, alunos e até professores a vissem de uma forma "mais positiva". Neste sentido, ele confia que as olimpíadas da área "levem as pessoas a compreender a matemática como uma arte bonita, não como algo chato e difícil". A mudança deve ser cultural, diz o professor, "deve começar na mente das pessoas":

 – Eu gostaria que a matemática fosse vista não só como algo importante, mas como algo que pode ser bonito. Como um esporte belo, uma arte também bonita e divertida.

Nicolau Saldanha aos 17 anos. Foto: acervo pessoal

Com a reconhecida modéstia, Saldanha reitera que a medalha lhe deu confiança, não fama. O atleta da matemática alerta: ser medalhista olímpico não garante vaga no mercado. Para Saldanha, o propósito principal dos competidores não deve ser a recompensa financeira, tampouco um emprego imediato, mas o desenvolvimento de competências na área. 

– Quando ganhei a medalha, exercia a matemática como um esporte. Jamais pensei em seguir carreira ou ficar famoso de alguma forma. Ter ganhado medalha de ouro me deu, sim, motivação e confiança – destaca. 

Nicolau Saldanha acrescenta: a matemática é bem mais do que uma medalha. Representa a própria vida:

– Não quero ser reconhecido apenas como aquela pessoa que, aos 17 anos, ganhou uma medalha. Quero ser mais do que isso.

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