Um grupo de professores da PUC-Rio se uniu com um objetivo nobre: produzir dados que envolvem o impacto causado pelo coronavírus no sistema público de saúde. Engenheiros, economistas e cientistas de dados da Universidade criaram o COVID-19 Analytics. Eles desenvolveram um modelo de previsão no qual projetam o número de pessoas que potencialmente darão entrada nos hospitais em curto prazo, de cinco a 14 dias.
O modelo estatístico divulgado pelos pesquisadores na segunda-feira, 18, indica que, até o dia 30 deste mês, o número de infectados pela Covid-19 ultrapasse a barreira dos 500 mil casos, e a contagem de mortes passe dos 30 mil. Um dos coordenadores do time, professor Marcelo Medeiros, do Departamento de Economia, indica que esses números como um claro agravamento da disseminação da doença.
Inicialmente, o grupo foi criado pelos professores Marcelo Medeiros e Eduardo Zilberman, do Departamento de Economia, Alexandre Street, do Departamento de Engenharia Elétrica, Davi Valladão, do Departamento de Engenharia Industrial, e por Gabriel Vasconcelos, da Universidade da Califórina, em Irvine, e ex-aluno de doutorado da PUC-Rio. Ao todo, são 13 pessoas envolvidas no projeto e, além de professores dos departamentos de Economia, Engenharia Elétrica, Engenharia Industrial e do Centro de Análise de Dados da PUC-Rio (NASDA), há também pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas.
Em uma das publicações feitas há duas semanas, o grupo estimava que a curva se achataria gradualmente, mas o que pôde ser observado foi um aumento dos casos. Na tentativa de capturar com mais exatidão as variações no contágio, o COVID-19 Analytics dividiu a análise dos municípios e os separou em dois grupos: os 20% com maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) e os 80% com menor IDHM. A suposição, explica outro coordenador do grupo, professor Alexandre Street, do Departamento de Engenharia Elétrica, é de que locais com maior IDHM estão em um estágio mais avançado da pandemia, por causa do fluxo de pessoas entre municípios e centros internacionais.
- O vírus começou com as classes mais altas. Até que ele chegou à favela. A dinâmica mudou quando isso aconteceu. São cinco, sete pessoas vivendo juntas. Começamos a olhar pelo IDH e conseguimos perceber que o vírus em municípios de IDH alto começou a ter comportamento semelhante ao dos países europeus. Mas isso explodiu de novo. Esse ponto de inflexão foi justamente depois que o coronavírus chegou à larga escala nos locais de IDH baixo. É difícil mensurar isso até pelo tamanho continental do Brasil, que, se você pensar, é uma Europa em termos de território que não fechou as divisas entre estados.
O professor Marcelo Medeiros ressalta que o diferencial das pesquisas produzidas pelo COVID-19 Analytics reside no fato de que os professores não estimam o total de casos que haverá no país, mas, sim, quantas destas pessoas efetivamente vão precisar de atendimento. Dessa forma, é possível que os gestores da saúde se planejem para construir hospitais de campanha, mover respiradores ou criar mais leitos em determinadas áreas.
- Nossa função é dar insumo para desenvolvimento de políticas de curto prazo. Nosso enfoque é nos casos que pressionam o sistema de saúde, ou seja, os confirmados. A lógica é que os casos confirmados são de pessoas que estão em condições mais graves. Se a pessoa desenvolve os sintomas, mas não fica com falta de ar, ela não precisa de cuidados hospitalares.
A equipe começou o trabalho na metade de março e, logo em abril, colocou o site no ar. O diferencial da ferramenta é a utilização de um modelo estatístico que usa dados de países que estão à frente nas curvas de casos e mortes e servem de base para prever as curvas em locais onde o vírus chegou mais tardiamente. No caso do Brasil, as conjunturas são traçadas com dados oficiais do Ministério da Saúde e da Universidade Johns Hopkins, que são atualizados diariamente.
O professor Alexandre Street detalha que a premissa dos pesquisadores é dar outra visão dos dados a partir das especialidades de cada um. Eles criaram uma previsão de casos alternativa aos modelos epidemiológicos que são usados.
- É um modelo muito positivo no sentido de que ele se adapta muito rápido. Nós temos uma dificuldade, que é a subnotificação, não do total de pessoas, mas dos que dão entrada em hospitais.
Medeiros comenta que o COVID-19 Analytics ainda não estabeleceu colaboração com os órgãos públicos de saúde, mas há uma precisão dos dados da equipe. O professor, no entanto, não vê motivos para alegria nesse êxito, embora quando os resultados se mostram de acordo com as análises há uma sensação de dever cumprido.
- Acho que infelizmente é reconfortante. Eu gostaria de ter errado, gostaria que o número de casos fosse menor do que o tínhamos previsto. Ficamos confiantes de estar acertando o nosso trabalho, mas a verdade é que ninguém está feliz de fazer este trabalho. É uma coisa pesada toda vez que vemos o número de casos e mortos subindo.