A Liberdade de Imprensa é um direito garantido aos jornalistas na Constituição de 1988. Segundo ela, a imprensa é livre para informar o que seja de interesse público sem risco de censura. Entretanto, ainda há casos de jornalistas e empresas jornalísticas que sofrem repressões no exercício das funções da profissão. De acordo com a Organização Independente Repórteres Sem Fronteiras (RSF), o Brasil ocupa o 102° lugar na Classificação Mundial da Liberdade de Imprensa de 2018.
O coordenador de Graduação do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, professor Leonel Aguiar, explica que a liberdade de imprensa hoje também é vista como o direito da sociedade de receber informações jornalísticas produzidas com qualidade, de acordo com os parâmetros historicamente construídos. Por isso, afirma Aguiar, a liberdade de imprensa não é apenas a garantia que os jornalistas e as empresas jornalísticas têm de trabalhar livremente, mas também de as pessoas receberem informações de qualidade.
A professora Leise Taveira, do Departamento de Comunicação Social, questiona o que é liberdade. Ela diz que existe uma mídia corporativa que se auto intitula livre, mas que o conteúdo é único e com apenas uma voz. Por outro lado, segundo ela, as redes sociais e a tecnologia possibilitam as outras vozes de existir. Leise afirma que muitos artigos que dizem respeito a comunicação ainda não foram regulamentados na Constituição.
— É muito complicado ter efetivamente a liberdade de imprensa, porque liberdade implica em autonomia e, para isso, é preciso ter posição e, com isso, é necessário conhecimento. Esse conhecimento você obtém na família, na escola e na sociedade. Entendo até que a mídia poderia ser uma grande aliada na construção dessa liberdade, mas existem outras questões que a envolvem e permeiam. A primeira delas é uma grande concentração dessa mídia corporativa nas mãos de poucos.
Aguiar destaca que o papel dos jornalistas, historicamente atribuído de mediador social na busca de uma informação com credibilidade, tem sido questionado. Segundo ele, a produção da informação jornalística com parâmetros de qualidade não tem conseguido, atualmente, realizar esse processo de mediação como a sociedade acha que deve ser realizado, com equilíbrio e ouvindo os dois lados.
Leise afirma que as tensões fazem parte da democracia, e é justamente nos conflitos que a liberdade de imprensa é garantida, porque isso significa dar o direito à fala e o respeito a todas as vozes. Aguiar destaca os casos de jornalistas expulsos das manifestações. Para ele, os integrantes dos protestos precisam entender que os repórteres não representam as expressões políticas e ideológicas da empresa jornalística em que trabalham. De acordo com Aguiar, organizações como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) precisam desenvolver um papel educativo em relação aos novos ativistas.
–– Acho que o trabalho da conversa é fundamental, porque nele você demonstra aos manifestantes que os repórteres são trabalhadores que devem ser protegidos e não expulsos de tais manifestações ou muito menos espancados sobre qualquer processo de liberdade de imprensa. Eu acho que, nesse sentido, isso é uma questão que ameaça à liberdade de imprensa.
No início de abril, em protestos por todo o país contra a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, jornalistas de diferentes veículos foram agredidos ou hostilizados. Segundo a Abraji, foram pelo menos dez ataques, durante os dias 6 e 7 de abril, e, no dia 5 de abril equipes de jornal, TV e fotógrafos foram afrontados por militantes. No mundo, de acordo com o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), apenas em 2018, 32 profissionais da comunicação já foram mortos. No dia 30 de abril mais dez jornalistas foram mortos no Afeganistão.
As redes sociais, de acordo com Aguiar, mudaram a forma de leitura das pessoas. Ele explica que a mediação algorítmica direciona o processo de produção jornalística, ou seja, fragmenta a leitura. As postagens que aparecem na timeline e as respostas dos mecanismos de busca mostram as informações de acordo com as preferências do usuário, para que ele não seja incomodado. O professor afirma que essa relação entre consumo de notícias e mediação algorítmica pode colocar em risco a liberdade de imprensa, porque impede o contato com a diversidade de opiniões e pontos de vista.
Leise acredita que as redes sociais não mudaram a concepção de liberdade de imprensa. Mas ela detecta no ambiente digital um grande potencial para o bem ou para o mal, porque dá a possibilidade de outras vozes existirem. Por outro lado, a professora questiona qual a efetividade das redes hoje e o que a sociedade busca com elas, já que não é possível ver uma melhora concreta.
–– A Primavera Árabe, em que você via as pessoas sendo massacradas, apanhando, as mulheres sendo jogadas na rua, mudou na realidade? Bom, eu vi, e aí? Virou um espetáculo, como tudo. Eu acho que essa é a próxima etapa, o próximo questionamento a ser feito. As redes são sim um grande potencial, elas dão a possibilidade de outras vozes, o que eu acho superinteressante. Entretanto, eu questiono, qual a efetividade hoje disso? E o que nós, sociedade, queremos com isso? É um trabalhão, nada vem pronto.
A Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e o Instituto Prensa y Sociedad (IPYS) lançaram a série investigativa Histórias de crimes contra jornalistas, que busca divulgar a violência contra jornalistas na América Latina e Caribe. Segundo a Unesco, entre 2012 e 2016, 125 profissionais foram mortos e, destes crimes, apenas 15% foram resolvidos, o que mostra o predomínio da impunidade.
Leise afirma que o limite da liberdade de imprensa é o respeito. Segundo ela, ao invadir a liberdade do próximo, a pessoa coloca sob ameaça a própria liberdade. Por isso é necessário ter uma certa solidariedade de se colocar no lugar do outro, aponta a professora e, partir daí, ter ética. Aguiar completa ao dizer que cada país tem seus parâmetros ditados pela Constituição e pelos Direitos Humanos.
–– A liberdade de imprensa significa que você não pode ter uma imprensa racista, homofóbica, com preconceitos de classe social, que seja misógina, que não respeite os direitos das comunidades indígenas, os direitos das pessoas idosas, das crianças e dos adolescentes. Ou seja, o limite da liberdade da imprensa é dado pela grandeza e pela defesa dos Direitos Humanos.