A preocupação com o bem-estar dos animais e com o processo de fabricação dos produtos conquista cada vez mais adeptos ao vegetarianismo ou ao veganismo. As práticas que defendem a exclusão da carne e de produtos de origem animal da dieta já migraram do setor alimentício para outro negócio, o de cosméticos. De acordo com relatório da consultoria americana Grand View Research, o mercado global de produtos orgânicos para cuidados pessoais deverá atingir mais de US$25 bilhões até 2025. Apesar do setor ser ainda restrito no Brasil, os investidores de cosméticos veganos acreditam no potencial de crescimento da área no país nos próximos anos.
Entre os produtos desenvolvidos especialmente para a beleza estão os cosméticos naturais, orgânicos e veganos. Os produtos naturais não sofrem modificações químicas e não contêm parabenos ou derivados de petróleo, e são produzidos com predominância de óleos, extratos e manteigas vegetais. Já os cosméticos orgânicos, além de serem naturais, utilizam nas fórmulas elementos biodegradáveis e livres de agrotóxicos e organismos geneticamente modificados.
Para ser considerado como vegano, o cosmético não pode conter nenhum tipo de ingrediente de origem animal ou derivados na fórmula, como mel, cera de abelha, colágeno e gelatina, e não pode ser testado em animais. Segundo a Assistente de Comunicação e Marketing da Lola Cosmetics, Camilla Menezes, a marca, que só trabalha com produtos de beleza veganos, realiza pesquisas para substituir matérias-primas convencionais de origem animal e, muitas vezes, trabalha com associações de diferentes matérias-primas veganas para alcançar o resultado esperado.
– Ao não utilizar produtos de origem animal, a indústria cosmética contribui para não desequilibrar o eco sistema. A Lola entende que o meio ambiente é primordial para nossa qualidade de vida e, pensando nisso, devemos pensar também nos seres que nele habitam. Quando você opta por utilizar esse tipo de cosméticos, você deixa de contribuir indiretamente para a criação de animais que são destinados a viver como cobaias em testes extremamente nocivos.
Os cosméticos verdes, como também são conhecidos, não precisam, necessariamente, serem naturais ou orgânicos. Idealizada na Alemanha por uma publicitária brasileira, a linha de maquiagem BAIMS trabalha com produtos orgânicos e veganos, e a principal matéria-prima das embalagens é o bambu. Para a Relações Públicas da marca, Fabiana Kherlakian, uma das dificuldades do setor no país é assegurar a veracidade dos procedimentos de produção dos produtos.
– O desafio não está somente no fato de a marca ser de beleza vegana, mas principalmente por ser 100% natural e orgânica certificada. Essas classificações ainda causam questionamentos pela falta de conhecimento em relação a este tipo de produto. Infelizmente, o governo brasileiro ainda não reconhece os cosméticos orgânicos como tal produto, o que contribui para que muitas marcas se aproveitem disso, vendendo o “falso natural” e enganando o consumidor.
O cuidado com a embalagem dos produtos e com o descarte ganham atenção especial nesse setor. A assistente de operações Rubia Lopes é vegetariana há sete anos e descobriu os cosméticos verdes pelas redes sociais. Para ela, a maior motivação para consumir esses produtos é a ausência da exploração animal e o fato de serem produzidos de forma natural, cuja qualidade é percebida no uso contínuo.
– Por mais que os produtos veganos sejam um pouco caros, as embalagens não são tão luxuosas. Isso se dá ao fato do comprometimento com todo o processo, desde a confecção até o produto final, que é produzido da forma mais natural e reciclável possível. A qualidade desses cosméticos é impressionante, e a pele fica visivelmente bem menos agredida.
A secretária Bianca Thondorf é vegana há cinco meses e, entre os cosméticos verdes, compra de creme dental a xampu. Ela diz que, apesar de ser mais caro, o consumo desses cosméticos contribui para não incentivar uma indústria que afeta negativamente o meio ambiente – produtos voltados para cabelos, por exemplo, custam em torno de R$ 30, enquanto os cremes de tratamento podem chegar a R$ 40.
– O que me motivou a consumir esses produtos é o fato de não terem exploração animal, que é algo que faz sentido para mim. O que não faz sentido é eu tirar o consumo de carne e derivados de animais da minha alimentação que, teoricamente, seria algo necessário, e utilizar esses derivados para a cosmética, que é algo mais “fútil”.
Criada em 2017 por duas jornalistas de moda e meio ambiente, a linha de batons Face It surgiu com o propósito de fortalecer a conscientização vegana e a não utilização de testes em animais. De acordo com a fundadora Elza Barroso, foi comprovado que esses testes são irrelevantes para cosméticos e existem outros métodos mais úteis, como in vitro e de voluntários. Para Elza, os benefícios do mercado de cosméticos verdes vão além do fator comercial.
– Nós enxergamos o mercado vegano como filosofia e não como um movimento passageiro. Quem se conscientiza não volta atrás e luta pela causa. No Brasil, o aumento é de 40% ao ano, e a Face It teve um crescimento de 154% no faturamento no último ano. Nós trabalhamos em prol da não toxidade, e os benefícios são imensuráveis para conseguirmos um futuro limpo para o planeta e para a continuação de uma civilização saudável.
Embora não seja vegano, o estudante Bruno Oliveira procura contribuir com a causa ao escolher alguns produtos que não tenham origem animal. Adepto do vegetarianismo há um ano e sete meses, ele afirma que o veganismo é o melhor caminho para os consumidores e para a indústria diminuir os impactos gerados no meio ambiente, seja no preparo ou no descarte das embalagens dos produtos.
– A indústria da exploração animal é uma das que mais gera impactos no meio ambiente, em consumo de água, desmatamento, erosão do solo, emissão de gás carbônico e gás metano, entre outros. Além disso, muitos produtos veganos acompanham as embalagens mais sustentáveis, como o shampoo e condicionador em barra. Muitas empresas também fazem o uso da economia circular para reaproveitar ou dar um melhor destino a esses produtos, como a reciclagem.
Vegetariana estrita há três anos, Julia Gélio não utiliza nenhum produto de origem animal na alimentação. Apesar de não consumir só cosméticos veganos, ela afirma que a qualidade dos produtos verdes é equivalente ou melhor que os demais cosméticos. Julia acredita que a popularização desse setor, com mais produtos no mercado a um preço acessível, levará a uma maior adesão, até mesmo de pessoas que não são vegetarianas ou veganas.
– Hoje existe uma comunidade muito grande não só de veganos, mas de pessoas que simpatizam com o veganismo e com a defesa dos animais. Muita gente é contra o teste em laboratórios com animais, principalmente na parte de cosméticos. É muito importante continuar divulgando essa causa, já que não tem por que testar esses produtos dessa forma.