Chamado para cuidar da Terra
02/07/2015 16:50
Rocélia Santos

‘Laudato Si’ é um apelo do Papa à conversão ecológica

“O urgente desafio de proteger a nossa casa comum inclui a preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral”. Este é o convite que o Papa Francisco faz a toda a humanidade na Carta Encíclica Laudato Si (Louvado Sejas), lançada no dia 18 de junho no Vaticano. No mesmo dia, a Arquidiocese do Rio de Janeiro organizou uma entrevista para detalhar os principais pontos do documento, o primeiro que aborda o tema da ecologia. A Carta, de 192 páginas, traz um apelo à conversão ecológica, que passa pelo cuidado com a “nossa casa comum”, ou seja, o planeta.


A Encíclica contém várias novidades, entre elas, o fato de ser destinada a todos que habitam esse planeta. Geralmente, um documento oficial do Papa é direcionado aos bispos e aos membros da Igreja Católica. A Laudato Si pode ser considerada um “puxão de orelha” na sociedade, nas grandes empresas e nos governos mundiais para a busca de soluções urgentes para a Terra. O Pontífice adota um tom crítico ao falar da indiferença em relação à crise ambiental. Logo na introdução, ele afirma que “muitos esforços na busca de soluções concretas para a crise ambiental acabam, com frequência, frustrados não só pela recusa dos poderosos, mas também pelo desinteresse dos outros”. Ele critica ainda que as atitudes que dificultam os caminhos de solução, mesmo entre os crentes, “vão da negação do problema à indiferença, à resignação acomodada ou à confiança cega nas soluções técnicas”.


Alguns eixos atravessam a Encíclica, como por exemplo, a relação íntima entre os pobres e a fragilidade do planeta, a convicção de que tudo está interligado no mundo, a crítica do novo paradigma e das formas de poder que derivam da tecnologia. O Papa faz um convite para os homens procurarem outras maneiras de entender a economia e o progresso, o valor próprio de cada criatura, o sentido humano da ecologia, e a necessidade de debates sinceros e honestos. Ele ainda chama a atenção para a responsabilidade da política internacional e local, a cultura do descarte e a proposta de um novo estilo de vida. Francisco afirma na Carta que “toda a pretensão de cuidar e melhorar o mundo requer mudanças profundas nos estilos de vida nos modelos de produção e de consumo, nas estruturas consolidadas de poder, que hoje regem as sociedades”. Monsenhor Joel Portella Amado, professor do Departamento de Teologia da PUC-Rio, fez a apresentação dos principais pontos da Carta Encíclica. Ele disse que o Papa Francisco reconhece não ter seguido nenhuma teoria científica para escrever o documento, e que o Pontífice fez uma leitura do problema à luz da fé cristã, ao olhar a natureza e o ser humano como criação de Deus.
No documento, o bispo de Roma declara ser necessário adotar algumas medidas urgentes, entre elas uma política que não se submeta à economia; acordos internacionais que não fiquem no papel, mas sejam eficazes; o equilíbrio entre a soberania de cada país. Ele ainda assinala a importância de se ter uma transparência nos processos políticos e estudos prévios sobre impactos ambientais.
Para o Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro e Gão-Chanceler da PUC-Rio, Dom Orani João Tempesta, O. Cist., a Carta Encíclica chega em um momento importante, em que se tem discutido soluções para os problemas ambientais do planeta.
– Temos que cuidar bem de onde moramos. O Papa lembra que nós não somos donos do planeta, mas temos uma herança a transmitir. Temos essa responsabilidade, cuidamos do que nos foi entregue para passar às gerações seguintes.
Entre as novidades da Laudato Si, o Reitor da PUC-Rio, padre Josafá Carlos de Siqueira, S.J., destaca o conceito, citado pelo Papa Francisco, de Ecologia Integral. Para ele, um dos grandes problemas no mundo é tratar a questão social separada da ambiental e vice-versa.
– Ele toca em temáticas extremamente importantes e inspiradoras, como quando ele fala da relação entre o espírito humano que deve encantar-se novamente pelo mundo criado, o homem como guardião da criação, aquele que recebe o dom. Muitas vezes esquecemos “O Papa lembra que nós não somos donos do planeta Dom Orani João Tempesta, O. Cist. dessa tarefa. É importante resgatar essa visão mais integradora, a dimensão de mudança de hábito e de costume, o destino universal dos bens, o testemunho concreto da sustentabilidade.
Padre Josafá lembra ainda outro ponto de crítica do Papa Francisco, a “cultura do descarte”, que produz e descarta não apenas lixo, mas também pessoas. A problemática dos pobres, tão presente em quase todos os pronunciamentos oficiais do Pontífice, e a questão da degradação ambiental também foram pontos que chamaram a atenção do Reitor no documento.
– Ele usa questões que eu acho muito originais. Ele diz que a desertificação é uma doença da terra, a extinção de espécies é uma mutilação da obra da criação. Chama também a atenção para as mudanças climáticas que estão acontecendo, e que as vítimas que mais sofrem são os pobres. Ele fala também do desperdício de alimento. O mundo produz muito alimento, mas há uma cultura do desperdício, que é uma afronta à fome no mundo, às milhares de pessoas que não têm o que comer.


Na Laudato Si, o Papa Francisco reconhece a importância da preservação da Amazônia para o futuro da humanidade. Ele se mostra contra a internacionalização da Amazônia que, segundo ele, “só serve aos interesses econômicos das 32 corporações internacionais”.
Encíclica é um documento oficial da igreja com peso magisterial, de ensino, dirigida a todas as pessoas. Laudato Si faz referência a Louvado Sejas, palavras contidas na abertura do Cântico das Criaturas, de São Francisco de Assis. Não é em latim, como costume, mas em italiano antigo. A encíclica está disponível no site do Vaticano: www.vatican.va, em italiano, francês, inglês, alemão, espanhol e português.

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