Em meio a previsão alarmante do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA) de que o número de novos casos de câncer no país ultrapasse 500 mil só neste ano, uma descoberta aponta novas possiblidades para o meio científico. Duas moléculas sintéticas, desenvolvidas por alunos de mestrado em Química da PUC- -Rio, mostraram-se capazes de inibir o crescimento de células cancerosas.
As moléculas sintetizadas são denominadas isoflavonas modificadas e foram concebidas a partir de uma outra molécula chamada LQB-223, fruto da tese de doutorado da professora Camilla Buarque, do Departamento de Química, orientadora das investigações.
Uma das frentes de pesquisa é do aluno Jhony Maurício Cifuentes e apresentou bons resultados no tratamento de leucemia. O outro trabalho é da aluna Joseane Alves Mendes e revelou-se eficiente no combate ao câncer de mama.
Camilla explica que o processo de síntese dos compostos usa como base um produto natural. Segundo ela, conhecer o mecanismo de ação celular é fundamental.
– Nós pegamos uma substância que já existe na natureza. Essa substância é isolada em pequenas quantidades para fazer o que chamamos de caracterizar, mostrar quem ela é. Também identificamos anéis, carbonos, e testamos minimamente a biologia em uma célula. Feita a identificação, e com base nessa estrutura conhecida, o engenheiro molecular pode então sintetizá-la. O que nós fazemos aqui é sintetizar a molécula com aquele esqueleto, colocando diversos penduricalhos, e testar se esses outros penduricalhos melhoram a ação.
A origem das células cancerosas está associada a mutações no DNA, que podem ser passadas para os filhos (câncer infantil genético) ou acumuladas ao longo da vida (câncer esporádico). As pesquisas foram realizadas no Laboratório de Síntese Orgânica da PUC-Rio, em parceria com o Instituto de Pesquisas de Produtos Naturais da UFRJ, e com o apoio do INCA. Em testes biológicos feitos na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), os compostos demonstraram serem capazes de interromper o ciclo celular na fase G2/M e induzir à morte da célula por fragmentação do DNA.
As moléculas também superaram o chamado Mecanismo de Resistência a Múltiplas Drogas (MDR), uma combinação de diversos artifícios diferentes de resistência. Ainda não há um consenso entre os cientistas de como ou se as células desenvolvem resistência. Alguns defendem que as mais fracas morrem primeiro e são selecionadas as mais fortes. E as mais fortes de todas são as multirresistentes, que possivelmente funcionam como células-tronco do tumor. Os estudos referentes aos mecanismos de resistência à quimioterapia, que focam no ataque às células MDR, tentam eliminar essa população de células-tronco tumorais.
Segundo a professora, os compostos, quando testados em células de câncer e sadias, apresentaram alto índice terapêutico. Camilla explica que a dose deve ser suficiente para eliminar a célula doente, mas não pode matar a sadia.
– Se para matar a célula cancerosa é preciso uma dose cavalar, e esta vai matar a célula sadia, não adianta. É preciso a menor concentração possível do fármaco para matar a célula de câncer e que não mate a célula sadia. E quanto menor a concentração do fármaco, melhor. Quanto maior o índice terapêutico, mais eficaz é o fármaco.
De acordo com a orientadora, o próximo passo será avaliar os compostos com outros testes. Para isto, a equipe de pesquisadores aguarda a liberação de recursos financeiros pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).
– Precisamos dos órgãos de fomento. Os testes já estão inscritos em projetos, já foram aprovados, mas dependem do dinheiro, por isso não há previsão para começar.