Ações incluem desde programas para facilitar a entrada, no ambiente acadêmico, de moradoras da Rocinha, do Parque da Cidade e de Senador Camará até atividades de inclusão social por meio do esporte, como na Vila Olímpica Clara Nunes, em Acari
Vice-Reitor Comunitário, Augusto Sampaio
Desde de a fundação da PUC-Rio, a instituição teve papel atuante nas questões sociais. A Universidade é comunitária, isto é, além de desenvolver pesquisa, ensino e extensão, desenvolve também um trabalho filantrópico. Segundo o Vice-Reitor Comunitário, professor Augusto Sampaio, o carro-chefe dos projetos sociais é a bolsa. Para preparar quem não tem condições financeiras de pagar um curso de ensino superior, a PUC-Rio oferece diferentes tipos de bolsas.
Para o Vice-Reitor, a PUC era vista como a universidade que atendia à elite. Mas, aponta, ao longo da história, os programas de bolsa permitiram que outro público tivesse acesso aos estudos.
– O que abriu a porta para esses jovens foi o Pré-vestibular para Negros e Carentes (PVNC), que começou com o franciscano Frei David. Criado nas comunidades, o projeto chegou à PUC em 1993.
Além das bolsas, o Vice-Reitor Comunitário ressalta outros projetos desenvolvidos na PUC ou em parceria com a Universidade – atualmente, são mais de 30. Eles promovem um papel social importante, desde a entrada do aluno no ambiente acadêmico até atividades como esporte e atendimento psicológico. Dentre eles estão a Unicom, o Nead, a RAE e a Vila Olímpica Clara Nunes.
Os projetos sociais da PUC promovem mudanças nas comunidades, porém, a instituição também recebe retorno.
– Com as bolsas e os projetos, a Universidade justifica o adjetivo de católica. Isso complementa os nossos princípios e valores éticos. A bolsa é o efeito concreto de ajudar os menos favorecidos pela sociedade – ressalta.
De acordo com Sampaio, o sistema de bolsas da PUC serviu como inspiração para o Ministério da Educação criar o Programa Universidade para Todos (Prouni), definido por lei, em 2005. A PUC já instituía as bolsas integrais para o estudante que tivesse renda familiar bruta mensal de até um salário mínimo e meio por pessoa. Para as bolsas parciais de 50%, a renda familiar deve ser de até três salários mínimos por pessoa. Porém, segundo Sampaio, o projeto do MEC apresenta imperfeições, como a obrigatoriedade do estudante de Prouni ter cursado escola pública.
Além disso, muitos alunos bolsistas moravam longe da Universidade e não tinham condições de pagar a passagem. Com isso, foi criado o Fundo Emergencial de Solidariedade (FESP) da PUC-Rio, que oferece transporte e alimentação. O programa foi iniciado por doações de professores e funcionários, e depois financiado pela Companhia de Jesus, até funcionar com verba da PUC. Quase a totalidade da arrecadação com o estacionamento é para manter o FESP.
Larissa Martins
Promover troca de conhecimento entre alunos e moradores de comunidades é o objetivo do projeto UNIversidade-COMunidade (Unicom). O estudante de Engenharia Elétrica da PUC-Rio Eduardo Carvalho, de 22 anos, é professor voluntário de Física desta iniciativa. Ele trabalha no Projeto Parque Vivo, no Parque da Cidade, programa da prefeitura que cede o espaço para o Unicom. Ele entrou no projeto em abril deste ano para realizar o desejo de dar aulas e de fazer trabalho voluntário.
Carvalho relembra de ter dado aula para apenas uma aluna. Ele refletiu sobre o sentido de usar duas horas da semana para ensinar a apenas uma estudante, mas concluiu que não importa o número de alunos, e sim a diferença que ele pode fazer na vida deles. Isso o motivou a continuar como voluntário.
– Acredito que o conhecimento seja uma ferramenta que abre portas para muitos sonhos. No Parque da Cidade, encontrei uma forma de compartilhar experiências e fazer parte das conquistas de pessoas da comunidade.
Vinculado à Coordenação Central de Estágios Serviços Profissionais da Universidade (CCESP), o Unicom existe desde 1978 e atua na Rocinha, em Senador Camará, no Parque da Cidade e em Acari e oferece serviços como aulas de inglês, reforço escolar, alfabetização de adultos, passeios culturais, oficinas de arte e cinema e atendimento psicológico. Assim como outras ações sociais existentes na Universidade, o projeto é uma forma de estender o ensino para fora do campus.
Uma das alunas é a estudante Larissa Martins, de 18 anos. Ela conheceu o Unicom por meio de um anúncio do Projeto Parque Vivo, em 2015. Larissa entrou para o programa com o objetivo de se preparar para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e tinha interesse na área de saúde. Ela conta como a experiência foi positiva.
– Os professores eram maravilhosos, e me passavam uma confiança inacreditável. Consegui ir muito bem no Enem, principalmente nas exatas, que eram as que eu tinha mais dificuldade.
Danúzia Costa
Danúzia Costa veio de Sergipe para o Rio de Janeiro em 2008, aos 19 anos, com o sonho de estudar. Mas, quando terminou o Ensino Médio, não sabia qual carreira seguir. Estudante de escola pública, ela passou para Serviço Social na PUC e na Uerj em 2012 por meio do pré-vestibular comunitário Invest. Optou pela primeira opção, porque já sonhava com a Universidade. Para custear as despesas no Rio, ela também precisou trabalhar em uma casa de família. O interesse pelo curso veio por sugestão da ex-patroa, que era psicóloga. Hoje, Danúzia, de 28 anos, moradora da Rocinha, se diz realizada profissionalmente e afirma que fez a escolha certa.
Pelo Invest, Danúzia conseguiu uma bolsa filantrópica na Universidade. Criado em 1998 por um grupo de ex-alunos do Colégio Santo Inácio, em Botafogo, o projeto é desenvolvido em parceria com a PUC-Rio. Dezoito anos depois, o curso cobre todas as disciplinas de vestibular, psicopedagogia e atividades extraclasse com uma equipe de voluntários. Além disso, Danúzia recebeu apoio do Fundo Emergencial de Solidariedade (FESP) da PUC-Rio, que oferece transporte e alimentação. Já o Núcleo de Orientação e Atendimento Psicopedagógico (NOAP) e o Serviço de Psicologia Aplicada (SPA) da Universidade proporcionaram um suporte psicológico no fim do curso.
A primeira experiência profissional de Danúzia, na área de Serviço Social, foi na Clínica São Vicente e no Hospital Miguel Couto, ambos na Gávea. Na primeira, ela ficou no setor de ouvidoria e desenvolvia pesquisas de qualidade. Já no Miguel Couto, a interação com os pacientes era mais direta: buscas de referência familiar, entrevistas com a família e orientações com relação à documentação. Além disso, ela também ganhou uma bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para desenvolver pesquisa no Hospital.
– Tive a experiência do privado e do público, que são dois mundos muito diferentes – observa.
Danúzia se formou em julho deste ano e, agora, é trainee da ONG Saúde Criança Responder, no Parque Lage. Ela trabalhou lá por um ano e meio como estagiária na área de assistência social. O convite veio da coordenadora do projeto, Cida Paranhos. As crianças atendidas pela ONG são do Instituto de Cardiologia Aloísio de Castro (Iecac) e do Hospital Miguel Couto. Segundo Danúzia, a equipe médica e de serviço social dessas instituições percebem uma vulnerabilidade e encaminham os pacientes para o serviço social da ONG. O programa é uma franquia social: também existe o Saúde Criança Renascer. A organização aceita doações mensais por meio de programa de sócios e campanhas. Danúzia explica a importância do projeto para ela e para as crianças atendidas.
– Eu queria uma experiência fora da área saúde antes de me formar. O projeto é maravilhoso. Desenvolvemos trabalhos com as famílias, voltados para a saúde da criança.
Marcelo Luciano
O professor do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio Marcelo Luciano Vieira, 41 anos, vivenciou o ambiente acadêmico de vários ângulos: ele passou pela Universidade como aluno, ex-aluno e professor. A trajetória profissional dele começou pela luta política. Antes de entrar para a Universidade, ele participava do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), um projeto nacional de combate à doença.
A partir do envolvimento com a saúde pública, Vieira participou do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), na Baixada Fluminense. A Vice-Reitoria Comunitária fez contato com o Conselho para que alunos da PUC fizessem parte da iniciativa. Isso estava vinculada ao Departamento de Serviço Social da Universidade. Foi assim que ele teve contato com o curso.
A busca pelo ensino superior surgiu para melhorar a remuneração. Em 2003, ele ingressou no curso de Serviço Social. Ao longo da graduação, porém, o professor descobriu um espaço de conhecimento na Universidade, que não estava só na sala de aula: ele começou a militar no movimento estudantil e, nos intervalos das aulas, promovia debates com os colegas de curso.
– O Serviço Social é interdisciplinar. Ele bebe da história, da sociologia, da política e, até mesmo, da economia. O conhecimento é uno. Antigamente, o matemático era também um filósofo.
Ainda no início da graduação, ele parou de trabalhar para se dedicar aos estudos e recebeu uma bolsa de ação social. Na época, morava em Belford Roxo.
Vieira terminou o curso em 2006 e, logo depois, ingressou no mestrado na PUC-Rio, para estudar a relação da hanseníase com as baixas condições de vida dos doentes. O professor explica como o mestrado foi importante para a formação acadêmica dele.
– Fiz o mestrado com orientação do professor Ricardo Ismael. Ele trouxe a ideia de discutir teoria. Eu era um militante muito forte, que trazia o mundo real para a Universidade. Mas meus argumentos eram esvaziados de teoria.
Ao entrar para o Tribunal de Justiça como assistente social, Vieira trabalhou diretamente com a questão da violência doméstica. Com a experiência, ele ganhou consciência da importância da igualdade de gênero para o mundo. Em seguida, no doutorado, na Fiocruz, ele também se deu conta do movimento negro.
Em 2011, surgiu uma oportunidade de dar aula na PUC-Rio, na disciplina Seminário de Saúde Pública, no Departamento de Serviço Social, e também de atuar na coordenação de estágio do curso. Neste ano, ingressou no pós-doutorado, na Uerj, sobre Engajamento Público para Saúde na América Latina.
Luciana Barreto
Ela retoca a maquiagem e o cabelo, desce para gravar uma chamada do telejornal no estúdio, edita o texto de uma reportagem em seguida e finaliza o espelho (ordem das matérias do jornal) antes de ele ir ao ar. Por fim, ela entra ao vivo. Esse é um pouco da rotina de Luciana Barreto, de 39 anos, apresentadora e editora executiva do Repórter Brasil Tarde, da TV Brasil. Segundo ela, um bom profissional deve saber fazer tudo, ou seja, colocar um telejornal no ar. Uma visão que foi construída ao longo dos anos de trajetória no jornalismo, que começou com uma bolsa de estudos na PUC-Rio em 1997.
Desde criança, Luciana sonhava em ser jornalista. Achava que a profissão tinha um poder de denúncia e de mostrar a realidade ao dar voz a quem não tem. A graduação, no entanto, ainda era um plano distante. Luciana estudava em escola pública, o pai era motorista de ônibus e a mãe, ativista de movimentos sociais e educadora. Ela conta que a oportunidade de entrar para a Universidade surgiu por meio do Pré-Vestibular para Negros e Carentes (PVNC), que fez uma parceria com a PUC.
– As pessoas falam muito em meritocracia, mas a largada não é a mesma para todos. Minha família nunca teve um universitário, em nenhuma geração. Fui a primeira – ressalta.
Durante a graduação, a jornalista passou por algumas dificuldades. Ela morava em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, e tinha que acordar às 3h30 para estar na sala de aula às 7h. O valor da passagem era quase metade do salário dos pais dela. Por isso, ela trabalhava para ajudar nos custos. Durante uma época, ela chegou a cursar, ao mesmo tempo, História na UFRJ e Jornalismo na PUC.
Luciana é militante da questão étnico-racial no Brasil e de Direitos Humanos. Ela era ligada à Igreja Católica e já tinha um descontentamento em relação às questões sociais. Mas o ativismo só veio com a profissão. Ao trabalhar como repórter pela primeira vez, no GNT, ela conta que começou a ter noções dos padrões que a TV e a sociedade impõem.
– Eu tinha uma resistência em aparecer, relacionada à autoestima. Foi quando descobri que nós carregávamos estigmas, problemas gravíssimos da nossa formação, decorrente da TV brasileira. Ela entra nas nossas casas e impõe um padrão, que destrói a identidade da criança negra.
O caminho para a televisão não foi planejado: o sonho de Luciana era trabalhar com jornalismo impresso, mas as oportunidades que surgiram foram para telejornalismo. Ela começou a carreira no Canal Futura, como estagiária. Depois do GNT, ela foi chamada pela Band News para cobrir a Guerra do Iraque. Também passou pela TV Bandeirantes até chegar à TV Brasil, onde está há mais de dez anos.
Davison Coutinho
Davison Coutinho, de 26 anos, é autor do livro Um olhar sobre a produção cultural na Rocinha, que reúne 12 iniciativas culturais da favela. Incomodado com o estigma que a comunidade onde mora ainda sofria, Coutinho lançou a publicação como trabalho final dele no curso de Desenho Industrial na PUC-Rio em 2013. O projeto teve apoio da Universidade e do Jornal do Brasil. Para chegar a este trabalho, Coutinho percorreu um longo caminho, iniciado aos 12 anos, no Núcleo de Estudo e Ação Sobre o Menor (Neam).
Em 2002, ele fez um curso de informática na PUC-Rio que propiciou, depois, a entrada no projeto, a convite da diretora, Marina Lemette Moreira. Hoje, ele é funcionário do Neam, professor de um curso de extensão de Adobe InDesign e de Photoshop na PUC-Rio e colunista do Jornal do Brasil.
– Comecei a participar de um conjunto de atividades para adolescentes de comunidades. Nesses cursos, me interessei pela parte de informática e comecei a cuidar da parte técnica do Neam, ainda como aluno.
Ao fazer 18 anos, ele passou para o vestibular da PUC-Rio. Inicialmente, ganhou bolsa filantrópica, mas, como foi chamado para trabalhar no Neam, passou para a bolsa de funcionário.
Durante a graduação, foi professor do curso de informática que o fez conhecer o Neam. Também ministrou aulas em que repassava técnicas que adquiria no curso de Design. Ao terminar a graduação e lançar o livro, Coutinho passou para o mestrado em Artes&Design em 2014 e foi chamado para trabalhar no Jornal do Brasil, na coluna Comunidade em Pauta.
– Comecei a refletir mais sobre a questão da comunidade. Com isso, assumi uma comissão de moradores em que articulo junto à prefeitura e ao governo, e, hoje, tenho ação de liderança comunitária na Rocinha.
Após concluir o mestrado, Coutinho entrou em um projeto com artesãs no Museu de Favela do Cantagalo (MUF), em que desenvolve produtos que representem a comunidade, na exposição Mulheres Guerreiras. Segundo ele, é uma troca da realidade das mulheres na favela e dos conceitos de Design adquiridos por ele.
Sobre o Neam, Coutinho afirma que a experiência é de capacitação do jovem. Depois dos cursos, alguns alunos são chamados para participar do projeto Jovem Aprendiz, em que são encaminhados para trabalhar em algum departamento da PUC. O principal desta experiência é o contato com a Universidade.
– O maior aprendizado da PUC é a própria universidade. Se o Neam não fosse na PUC, ele não teria o mesmo resultado. Nosso maior prazer é poder dar oportunidade. É muito bom gerar independência para os jovens.