Carioca da Gema
05/03/2015 00:00
Diego Roman/ Ilustrações: Diogo Maduell

Descontração e irreverência: características presentes no cotidiano dos que moram no Rio

O carioca não é apenas aquele que nasce no Rio de Janeiro, mas também é aquele que, de alguma forma, se identifi ca com certos aspectos que compõem a identidade construída da cidade. O futebol, a praia e o Carnaval são algumas das marcas características do Rio e que acompanham a irreverência no vestir e falar do carioca. Jogar bola, ir à praia e pular Carnaval, por exemplo, são costumes que formam um ritual e infl uenciam construção da identidade chamada carioca.

Não é tão simples dizer quais são os respectivos aspectos de uma identidade. O carioca é uma construção das características que o formam. A professora do Departamento de Ciências Sociais da PUC-Rio Sônia Maria Giacomini explica que existem tipos diferentes de cariocas.

— Existe o carioca do estereótipo, que é aquele carioca que se contrapõe ao paulista, ao gaúcho, ao nordestino. E tem o carioca de carne e osso que mora aqui em qualquer lugar da cidade.

Carioca da gema é a expressão dada para aquele que nasce e mora no Rio de Janeiro. Mas para ser carioca, não é necessário ter nascido na cidade. Existem pessoas que vêm de fora para morar ou trabalhar, mas que acabam criando raízes na cidade e vínculos com a identidade carioca. Entre as características que formam a identidade carioca está, na análise de Sônia Giacomini, a constante alegria que o nativo do Rio demonstra.

— Essa alegria de viver ultrapassa as classes sociais e se assemelha, de certa forma, com a musicalidade e a corporeidade. A questão não é só ser, mas gostar de ser assim. É tipo um charme e sentir orgulho desse charme.

Costumes culturais também estão presentes na hora de formar uma identidade carioca. Apesar da diversidade geográfi - ca, o Carnaval, o futebol e a praia marcam presença no cotidiano do morador da cidade. O jornalista dos canais ESPN Lúcio de Castro diz que os esportes, entre eles o futebol, têm uma relação expressa com o processo de desenvolvimento da cidade.

 — O esporte acompanha a história da cidade, desde o remo, que foi mudando de lugar com a expansão do Rio, saindo da Praia do Flamengo para Botafogo e depois para a Lagoa, na mesma direção que a cidade crescia. O futebol também, assim como os esportes de praia e as peladas do Aterro, que fazem parte da paisagem. Provavelmente, não existe nenhuma cidade que vive o futebol como o Rio. Isso tem infl uência direta na vida da cidade, desde o início do século passado, como conta e canta Noel Rosa. Assim, o futebol dá vida para a cidade e vice- versa. Nos bares, praias, ruas, trem, ônibus, sempre tem alguém falando de futebol no Rio.

Sambar e pular no Carnaval representam uma parte da identidade do carioca, mesmo que não tenha nascido com o samba no pé. A euforia carnavalesca e o contagiante gingado do samba são sentimentos marcantes na vida de quem carrega o Rio de Janeiro na história. O coordenador do centro de projeto do Carnaval da UERJ, Felipe Ferreira, ressalta que há uma forte identifi - cação do carioca com o Carnaval, o samba, o futebol e a praia, e que esses conceitos fazem parte da construção da identidade carioca.

— Quando se fala em Rio de Janeiro, esses aspectos com certeza estarão presentes. Se alguém aqui não gosta de Carnaval no Rio, isso cria uma questão. A presença do Carnaval vai ultrapassar o próprio gosto. Mesmo quando a pessoa não gosta, cria-se uma questão de dizer “como você não gosta?”. Ao se falar em Rio de Janeiro, o Carnaval estará sempre presente. E mesmo quem não gosta da brincadeira, pode acabar fazendo parte sem mesmo querer.

Por ter sido capital do Brasil, a cidade do Rio de Janeiro foi a primeira a ser palco de uma manifestação do Carnaval no país. O samba tocado na festa serviu de inspiração para outros estados, e assim, cada região do Brasil desenvolveu o próprio estilo de fazer Carnaval com respectivos sambas. O professor Felipe Ferreira explica que o Carnaval começa a se tornar um elemento de identidade do Rio entre os anos de 1840 e 1850, e que, mesmo tendo sido importado da Europa, o Carnaval mescla a tradição européia com a brasileira.

O samba surge nos morros que fi cam ao redor do Centro da cidade do Rio. O estilo musical chamou a atenção dos intelectuais e criou uma relação entre os pensadores cariocas e a música que surge das periferias da cidade. Dessa forma, o estilo musical não era marginalizado.

— Ocorre no Rio uma mistura da sofi sticação do Carnaval francês com os blocos de rua. Toda a questão popular e a essência negra, juntas, vão povoar o Rio no fi m do século XIX, e do século XX em diante. Nos anos de 1920, começou a surgir o samba batucado, o samba de morro, que deu origem às escolas de samba que tomam a frente do Carnaval nos anos 1950.

O Rio de Janeiro também é conhecido por ser um lugar com qualquer hora do dia, em qualquer dia da semana, ao sair mais cedo do trabalho, ou cedinho, antes do trabalho, nem que seja por meia- -hora, é uma forte característica do morador do Rio. Não importa qual praia seja, ela é um fator importante na construção da identidade do carioca. A cineasta Flavia de Lins e Silva, diretora do documentário Faixa de Areia, explica que a praia é um lugar em que certos hábitos e costumes são deixados de lado na areia.

— A praia é como se fosse o quintal da casa de todo mundo. Ao sair das calçadas e descer para as areias, as regras mudam. Há um encontro entre diferentes classes sociais, por vezes, ditado pela mobilidade e pelo preço de comida e bebida. Coisa que não acontece nas escolas e na sociedade, onde tudo está muito segregado. A praia ainda tem esse encontro.

O fato de o Rio ser uma cidade que cresceu voltada para o porto ajuda a mostrar que a cidade esteve sempre voltada para o mar, e sempre esteve interessada com o que vinha do mar, mesmo em épocas mais antigas, quando a praia era pouco habitada. Até os que não curtem praia acabam se identifi cando com ela. Segundo Flavia, os cariocas optam em ir à praia não só para entrar na água ou caminhar na areia, mas também por uma questão de comportamento social.

— Tem gente que não gosta de praia, mas que vai para caminhar na orla, andar de bicicleta e pegar o ar fresco. Muita gente marca encontro na praia para depois resolver o que vai fazer. Antigamente, um posto era o point que reunia a galera para depois sair — lembra.

A praia também ajuda a ditar uma moda mais informal na cidade. É muito comum encontrar mulheres com sandálias chamadas de rasteirinhas e short jeans curto, ou homens com camisa regata e bermuda tactel, com sandálias Havaianas nas ruas do Rio. Assim como também é comum entrar no shopping de chinelo e depois pegar um ônibus para ir para praia. Para o carioca, tanto faz. É um jeito carioca de ser.

Mais de que compor a alma da identidade carioca, o Carnaval, a praia e o futebol são conectados. Durante a festa do Rei Momo, não é raro os cariocas frequentarem blocos na praia, e aproveitarem para dar um mergulho no mar, e eventualmente, jogar futebol nas areias. Não importa onde o carioca esteja, ele sempre será lembrado e se identifi cará como aquele que vai à praia, que gosta de sambar e que sabe dominar uma bola. lindas belezas naturais, da combinação da vegetação das montanhas com rios e praias, presença fi el no cotidiano do carioca. Ir à praia a

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