Enchentes, dificuldade de locomoção de cadeirantes, perigo no deslocamento de ciclistas. Problemas que cariocas enfrentam constantemente, mas que podem ser resolvidos com soluções criativas, eficientes e baratas. Chegar a essas soluções é o objetivo de um grupo de 12 estudantes do Reino Unido e do Brasil que participaram do projeto Creative Campus. Parceria da PUC-Rio com a Middlesex University, de Londres, e a escola Spectaculu, da Gamboa, o workshop reuniu alunos de Design por duas semanas para criar instrumentos inteligentes para a melhoria do Rio.
Os estudantes desenvolveram quatro projetos na Biblioteca Parque Estadual, no Centro. Mas apenas dois foram escolhidos para prototipagem nos laboratórios do Departamento de Design da Universidade: Samba Rampa, uma rampa que também funciona como um filtro para bueiros; e Linhas Cariocas, uma linguagem para facilitar a sinalização de ciclovias. Durante a elaboração, os alunos receberam visitas de designers e de apoiadores como o embaixador do Reino Unido no Brasil, Alex Ellis. O diplomata aplaudiu a iniciativa como uma boa mistura de países que, apesar de raramente trabalharem juntos no último século, sempre produziram bons resultados.
- A criatividade entre os dois países é excelente. Pense no Caetano Veloso, que escreveu grandes músicas quando estava em Londres. Pense no carro que Ayrton Senna dirigia, desenhado por um inglês. O grande Gilberto Silva, que era meio de campo no meu time, o Arsenal. Você tem que desrespeitar fronteiras e juntar pessoas. O futuro pertence a quem junta cabeças diferentes, junta mentalidades diferentes. O futuro é do Brasil e do Reino Unido.
As ideias foram desenvolvidas de olho no legado deixado à cidade por eventos de grande porte como as Olimpíadas e a Copa do Mundo. Com foco na solução de problemas, os alunos tiveram como guia um estudo do movimento Rio Como Vamos sobre os desafios da cidade. Entre eles, a drenagem de água e acessibilidade de deficientes físicos, necessidades que o projeto Samba Rampa pretende abarcar. Em formato de concha, a rampa é embutida com um filtro para impedir que folhas, lixo e sujeira entupam os bueiros da cidade.
As estampas que colorem essas estruturas foram pensadas para ter uma alma carioca, a fim de inspirar o cuidado dos cidadãos. O material sugerido é plástico reciclado, barato e muito resistente, características que diminuem a chance de furtos. O designer britânico Huw Owen, co-fundador do Centro de Tecnologia Gordon Murray do Brasil, assessorou a escolha dos materiais. Segundo ele, a produção em massa do projeto demandaria pouco investimento.
- Encorajamos os estudantes a usarem materiais alternativos, como garrafas PET, na produção dos projetos. Nas rampas, podem ser utilizadas fibras sustentáveis, como a de cana-de-açúcar ou de mandioca. Se produzirmos 1.000 Samba Rampas para o Rio, teremos um custo de menos de R$200 por unidade.
De aplicação menos imediata, mas de objetivo igualmente ambicioso, o Linhas Cariocas pretende mapear vias do Rio de Janeiro em uma linguagem que indique a ciclistas quais são os melhores lugares para pedalar. Três cores, combinadas a formatos geométricos e texturas, informam sobre a condição das ruas. O verde, com linhas mais suaves, significa que a pista é boa para percorrer. O amarelo, com traços mais quadrados, avisa que é preciso atenção. E o vermelho, combinado a formas triangulares e pontiagudas, indica perigo.
O projeto também sugere lançar um aplicativo similar ao Waze para mostrar no mapa os melhores trajetos para ciclistas. A comunicação visual continua em roupas e mochilas, cujas cores diferenciam um ciclista iniciante de um experiente.
Para lidar com um grupo de origens tão heterogêneas, os tutores Graeme Brooker e Phil Nutley montaram times móveis para que cada membro trabalhasse com pessoas e projetos diferentes. Um dos idealizadores do Creative Campus, Brooker, que é diretor do Departamento de Moda e Design de Interiores de Middlesex, considera o trabalho em equipe um fator de importância na fermentação de boas soluções.
- Você tem que ser capaz de trabalhar em grupo, senão não irá muito longe na carreira. Ser sociável é tão importante quanto ser um bom designer. Tentamos desenvolver isso aqui. Acostumamos eles a não falarem “eu”, mas sim “nós”. Eles acabam vendo um pouquinho de si mesmos em todos os projetos, o que é muito legal.
O método de trabalho resultou em uma convivência amigável entre britânicos e brasileiros. Para Tori Rodway, estudante de Design da Universidade de Middlesex, a primeira vez no Rio não poderia ter sido melhor.
- Acordávamos sempre às seis da manhã para ir à praia antes dos encontros. Chegávamos às reuniões muito animados, e os brasileiros ainda estavam acordando. Esse contraste do jeito de ser é muito legal, pois enquanto estávamos a mil por hora, os brasileiros estavam relaxados. Foi ótimo trabalhar com gente assim. Espero que o projeto final seja implementado no Rio.
Agora, para ver os projetos do Creative Campus nas ruas cariocas, o próximo passo é consolidar as especificações técnicas para apresentar as propostas ao poder público. Segundo Laudemar Aguiar, coordenador de Relações Internacionais da Prefeitura, há patrocinadores interessados em levar o trabalho adiante.
- Queremos uma cidade mais cosmopolita, um turismo mais cosmopolita. Teremos mais bicicletas, mais trilhas, mais museus. O turismo cultural está crescendo no Rio de Janeiro. Esses projetos têm tudo a ver com esse momento da cidade e com a participação da população.