A noção de viver uma experiência está impregnada na sociedade contemporânea, principalmente na área do entretenimento. Quando se trata de música, os shows prometem proporcionar momentos únicos ao público para compensar o grande investimento nos ingressos. Essa experimentação é cada vez mais valorizada não só pelas bandas conceituadas do show business, mas também pelos grupos que fazem covers e prestam tributos pelo país. Inspirados no espírito dos conjuntos originais e com a habilidade de alcançar as mesmas notas dos ídolos, esses músicos fazem homenagens e contagiam, inclusive, quem não é fã de carteirinha das atrações reverenciadas.
Caracterizadas por priorizar a fidelidade em relação à essência da banda homenageada, os grupos covers procuram se aproximar ao máximo nas apresentações, de forma a usar figurinos parecidos, ter número igual de integrantes, tocar no mesmo tom da versão original e até representar os músicos no palco. Já as bandas que prestam tributo não buscam necessariamente parecer com o conjunto oficial e podem diferir no número de componentes. Em alguns grupos, os integrantes costumam personalizar os arranjos iniciais, com um toque pessoal na execução das composições.
Com 20 anos de estrada, a banda Mais do Mesmo, cover do Legião Urbana, se baseia na formação do grupo original na última turnê, antes da morte do vocalista Renato Russo. Os músicos costumam intercalar os clássicos da banda, como Será, Tempo Perdido e Quase Sem Querer, com a projeção da história da Legião por meio de imagens e entrevistas. Composta por seis integrantes fixos, a Mais do Mesmo conta com Pedro Erthal no vocal, Márcio Newton na guitarra, Felipe Moura no baixo, Pedro Mussi no violão e guitarra, Claudio Fonseca no teclado e Marcelo Paz na bateria. De acordo com Erthal, as apresentações podem incluir convidados para executar versões feitas pela própria banda, com a missão de proporcionar uma “experiência Mais do Mesmo”.
– O grande desafio é montar um trabalho consistente. Você precisa ser, acima de qualquer coisa, verdadeiro com o que está fazendo. O retorno do público é incrível, e são pessoas de todas as idades que conheceram a Legião, e outros que nunca viram a banda tocar. Quando todos cantam juntos, do início ao fim dos shows, vejo como o Renato Russo era realmente genial com suas letras completamente atuais.
A apresentação de Let There Be Rock, pelo AC/DC, em 1979, foi o ponto de partida para a formação do AC/DCover, em 2007. Atualmente, o grupo é formado pelo vocalista Aristeu Pessanha, os guitarristas Paulinho de Castro e Fabrício de Castro, o baixista Augusto Mattoso e o baterista Alex Porto. Os shows do quinteto são repletos de clássicos como Highway To Hell e Back In Black, além de contar com a performance no estilo da banda australiana. Segundo Paulinho, que interpreta o guitarrista Angus Young, é importante estudar a essência do grupo original para realizar um bom trabalho no palco.
– É preciso fazer uma apresentação mais próxima da banda porque o fã quer curtir da mesma maneira que nos shows dos ídolos. É necessário executar bem as músicas, ter um visual parecido, timbrar os instrumentos e ter uma boa performance. Tocar rock n’ roll num palco é algo indescritível. Ensinar outras pessoas, compor e gravar uma composição também são gratificantes. O que seria da vida sem música? Então poder expressar essa magia ao mundo é único.
Embalados pelos sucessos dos grupos reverenciados, os shows conseguem resgatar a memória de quem já viu a banda original ao vivo ou simular esse sentimento pela primeira vez. É o que ocorre nas apresentações da banda Animals, que faz tributo ao grupo norte-americano Maroon 5. O vocalista Leandro Carvalho conta que a receptividade das pessoas que nunca foram a um show do grupo original é diferente e, muitas vezes, parece que eles são o próprio Maroon 5. Criada em 2016, a banda tem o hábito de tocar os singles que mais fizeram sucesso, como This Love, Payphone e Sugar. Apesar de ser uma banda tributo, a Animals desenvolve materiais próprios, como clipes e lives. Para Carvalho, o volume de trabalho desenvolvido requer esforço e dedicação.
– É muito investimento de tempo, financeiro, físico e de relações pessoais para dar certo. Quando dá vontade de desistir, sempre tem algo que me puxa de volta. Quando subo no palco e vejo aquelas pessoas, lembro o porquê de fazer isso. Por algumas horas, esquecemos das dificuldades que passamos para chegar naquele momento. Sempre que aparece um produtor que reconhece o nosso trabalho ou alguém que elogia o show, dá fôlego para continuar.
Além da Animals, o vocalista, o tecladista André Spinillo e o guitarrista Mauricio Loureiro também desenvolvem um trabalho na banda Rockstreet Boys, que surgiu este ano com a proposta de tocar os sucessos dos anos 1990, década marcada pelas boys e girls bands, em versão rock. As apresentações não podem deixar de fora os clássicos de Backstreet Boys, *NSYNC e Spice Girls, além de cantores que fizeram sucesso posteriormente como Ricky Martin e Britney Spears.
A partir de uma reunião de amigos para tocar violão, surgiu a banda Mary Jane Rock Show em Itajubá, Minas Gerais. Fundado em 1998, o grupo faz tributos para bandas como Charlie Brown Jr. e O Rappa, mas também já lançou o CD autoral Siga Em Frente. O quarteto, formado por Luisinho no vocal e guitarra base, Edu Grilo na guitarra principal, Lauro Mohallem no baixo e Dudu Pamplona na bateria, ainda conta com a participação especial do guitarrista do CBJR, Marcão Britto, em algumas apresentações em homenagem à banda que era liderada por Chorão. De acordo com Luisinho, tocar com Marcão é uma oportunidade única, inclusive nos shows na Cidade Maravilhosa, que ocupa um lugar especial no coração do grupo.
– Depois que o Chorão e o Champignon morreram, o Marcão teve a ideia de eternizar o nome do Charlie Brown Jr. fazendo intercâmbio com algumas bandas pelo Brasil. Nós somos a que mais faz shows especiais do CBJR com ele. Atualmente, o Rio de Janeiro é a cidade que mais nos valoriza.
Zóio de Lula, Tamo Aí na Atividade e Papo Reto são alguns dos hits do CBJR que sempre estão presentes nas apresentações da Mary Jane. Para Mohallem, os músicos independentes passam por dificuldades até conseguir se estabelecer no cenário da música – o que nem sempre acontece. Além disso, esses artistas também atuam como técnicos de som, produtores, roadies e motoristas para cumprir a agenda. O baixista reconhece que é difícil definir o que é ser músico, mas afirma que é algo que transcende o conhecimento técnico.
– O tio que toca Legião Urbana durante o churrasco de família é músico, uma calopsita é musicista. Não é a carteirinha da OMB ou saber ler uma partitura que te faz músico. Existem instrumentistas que tocam mil notas por segundo, mas não despertam nenhuma emoção da plateia. Por outro lado, há pessoas que com três notas conseguem apertar o coração e arrancar lágrimas dos ouvintes. Para mim, ser músico é transmitir emoções através de timbres, melodias, harmonias e ritmos. É retratar a vida usando notas musicais e conectar pessoas por meio de instrumentos.