O professor Jan Werner-Müller, da Universidade de Princeton (EUA), ministrou palestra no campus da PUC-Rio na quinta-feira, dia 14. Com o tema What is populism and how does it affect liberal democracy, a apresentação, seguida de debate, abordou o atual cenário político internacional e as possíveis similaridades entre governos populistas. Müller apontou fatores como a falta do pluralismo, a ideia de representar uma parte da sociedade que não tem voz e a promessa de combate à corrupção como fatores que permeiam este tipo de governo.
O professor afirmou que não concorda com a imagem frequentemente relacionada ao populismo, a da onda. Na opinião dele, associar o movimento político ao fenômeno natural é ignorar fatores externos essenciais para o sucesso destes governos, como o apoio da elite, e também coloca a população em um papel de refém deste modelo governamental.
- A onda sugere um fenômeno natural e imparável, onde nós somos as vítimas, sem poder resisti-lo. Minha visão é que, até hoje, nenhum país da América do Norte ou na Europa teve um governo populista de direita que assumiu o poder sem a colaboração de partidos conservadores bem-estabelecidos e da elite. Se levarmos em consideração apenas a ideia da onda, não vemos a importância da ajuda destes fatores sobre a vitória dos populistas, não vemos que o fenômeno não é exatamente independente e autônomo.
Outra definição atual que, de acordo com o professor, aparenta ser muito simplista, é a de um representante que critica a elite. Müller afirmou que a característica que define um governante populista está mais atrelada a dele sempre se colocar em uma posição de ser o único capaz de defender uma parcela da população que o apoia. Para isso, comentou, estes governantes estão dispostos a atacar a vida pessoal e a moral dos concorrentes para tentar provar uma inadequação.
- É verdade que quando os populistas ocupam um papel de oposição, eles criticam o governo que está no poder, além de todos os outros partidos. Mas, acima de tudo, eles querem implementar o pensamento de que eles, e apenas eles, representam uma parcela da população que eles gostam de chamar de pessoas reais, ou maioria silenciosa.
O antipluralismo também foi categorizado como elemento essencial em governos populistas pelo professor. Ele ressaltou que a unificação prometida por estes governantes é sempre feita de acordo com os padrões deles próprios. No caso de uma derrota, disse, o populista a justifica como uma consequência dos cidadãos que não puderam se expressar. Neste caso, a população não seria mais silenciosa, e sim, silenciada.
- Com uma frequência relativamente alta, os governantes reagem à derrota de forma específica. Eles sugerem que, por definição, se a maioria silenciosa pudesse realmente se expressar, o seu governo já estaria no poder. Assim, não estamos mais falando de uma maioria silenciosa, mas sim de uma maioria silenciada. Isto sugere que há algum fator por debaixo dos panos, talvez a elite, que manipula os resultados de tal forma que a população não pode se expressar de forma sincera, o que basicamente questiona a legitimidade da eleição em si e, às vezes, de todo o sistema eleitoral.
Müller comentou que, quando um governo populista assume o poder, há o perigo de se perder o pluralismo na mídia. De acordo com ele, é a partir da imprensa que a população se informa sobre as medidas implementadas do governo. Ao não ter acesso a essas informações, a população perde a capacidade de cobrança, pois não tem uma ideia real do que está acontecendo, disse o professor.
- A possibilidade de se separar o joio do trigo na política, a qualquer momento em que isso se torne necessário, é uma ideia a qual os teóricos democratas se agarram e ela é perdida em uma democracia na qual não é possível traçar um perfil real do governo. Essa situação se torna uma realidade em lugares em que o pluralismo da mídia é reduzido de forma radical, fazendo com que seja muito mais fácil demonizar a oposição, negar sua legitimidade e também esconder a corrupção, entre outras formas ilegítimas de se governar.
Segundo o professor, uma destas maneiras ilícitas é o clientelismo. Muitos governantes prometem vantagens aos seus apoiadores e não tentam esconder que isto está ocorrendo porque, como apenas uma parcela da população é vista como pessoas reais desde o início, este é o curso natural dos fatos, ressaltou. Müller comentou ainda como a corrupção praticada por estes governos não é normalmente categorizada como um crime pela comunidade.
- Muitos populistas no poder acabam se engajando em alguma forma de clientelismo de massa. Isso é uma forma chique de dizer que o governo irá valorizar quem o apoia e que o resto da população receberá o mínimo de vantagens possível. Uma explicação possível para a falta de revolta da população nestes casos é o fato de que os seguidores destes regimes não enxergam estas práticas como crimes, dizendo que os governantes estão fazendo de tudo pelo povo, porém não há tanto problema se eles estão lucrando um pouco pelos lados.
O professor explicou que muitos teóricos têm uma noção equivocada de que não há padrão entre os governos populistas. Apesar de reforçar que cada país é único e que uma homogeneização comparativa entre eles seria negativa, Müller acredita que alguns padrões se repetem. Isso provaria que governos mais autoritários podem aprender uns com os outros, de forma a evoluírem e não cometerem os mesmos erros.
- Acho que existe algo que podemos chamar perversamente de uma arte populista de governar, que envolve, por exemplo, a redução do pluralismo da mídia, o clientelismo, a menosprezação da sociedade civil com a declaração de que esse setor não é formado por cidadãos comuns protestando, e sim pessoas pagas por forças exteriores. Estes são alguns dos fatores presentes no pacote das técnicas governamentais, o que também significa que eles podem ser copiados por diferentes atores, em diferentes lugares. Isto destrói nossa ilusão de que governos mais autoritários não têm a capacidade de aprender uns com os outros, e de corrigir erros prévios.
O próximo encontro do ciclo de palestras sobre populismo e democracia será no dia 26 de abril, às 11h, no auditório do RDC. O convidado será o professor Yascha Mounk, da Universidade de Harvard, que abordará o tema The people vs democracy: why freedon is in danger and how to save it.